Massacre de Goldstein, há 20 anos, transformou Hebron em símbolo do conflito

  • Por Agencia EFE
  • 25/02/2014 15h23

Por Javier Martín.

Hebron (Cisjordânia), 25 fev (EFE).- Vestido com seu uniforme do exército israelense, o médico ultraortodoxo Baruch Goldstein entrou na manhã de 25 de fevereiro de 1994 no “Túmulo dos Patriarcas” de Hebron, e sem falar uma palavra, massacrou a tiros 29 palestinos antes de morrer linchado pelos sobreviventes.

Sexta-feira do Ramadã para os muçulmanos e festa de Purim para os judeus, aquele dia há exatos 20 anos mudou para sempre a política do governo israelense na cidade, transformada desde então em um símbolo de um conflito enraizado.

“O massacre de Goldstein é o fato mais relevante da história recente de Hebron, o mais importante para entender uma cidade fantasma”, explica à Agência Efe Yehuda Shaul, membro da associação de ex-soldados israelenses “Breaking the Silence”.

“Fantasma por três razões: a primeira e essencial, pela política de segregação imposta pelo exército israelense. Isto é o que Goldstein conseguiu, por isso é tão importante. Nasceu e se desenvolveu após o massacre”, afirma.

“Segundo, pelas táticas e conduta do exército. E terceiro, pela violência dos colonos”, acrescenta.

Situada a 40 quilômetros ao sul de Jerusalém, Hebron é um lugar santo para as três principais religiões monoteístas, já que nela se ergue o “Túmulo dos Patriarcas”, última morada de Abraão, segundo a tradição.

Local de ancestral convivência, sua história sangrenta remonta a 1929, ano no qual pogroms árabes expulsaram a histórica comunidade judaica da cidade, sob controle jordaniano até a Guerra dos Seis Dias (1967).

Consolidada a vitória israelense, um grupo de estudantes judeus pediu permissão para rezar no túmulo, mas uma vez lá dentro se negaram a sair, criando assim uma colônia ocupada sob proteção do exército.

“Aí começa a atual situação. Não faz diferença quem governa: direita, centro ou esquerda, todos se rendem às exigências dos colonos”. Em 1970, em mais um capítulo da história, começou a ser construído nas redondezas do local o assentamento de Kiryat Arba, um das mais radicais de Israel, ressalta Shaul.

Nove anos mais tarde e incomodados por um acordo de paz com o Egito, que rejeitavam, homens, mulheres e crianças procedentes desta colônia entraram de noite no centro de Hebron e ocuparam o antigo instituto Beit Hasada.

Protegidos, ergueram no local a primeira colônia no coração da cidade, sem nenhum impedimento apesar dos protestos árabes perante a justiça israelense.

Meses depois, um estudante judeu se transformou no primeiro colono assassinado nos territórios ocupados. E em maio de 1980, seis colonos foram baleados quando iam rezar.

“O ano crucial é 1997. Dentro dos Acordos de Oslo, se assina um tratado especial que divide Hebron em duas zonas”, explica Shaul.

“Segundo o tratado, 80% palestina -com cerca de 120 mil habitantes-, e 20% sob controle total de Israel, com 35 mil palestinos, 800 colonos, o túmulo e o subúrbio de Kasba”, acrescenta.

E a partir daí começa o que a “Breaking the Silence” e outras organizações israelenses defensora dos direitos humanos denunciam como uma política sistemática de esterilização.

Primeiro, com um toque de recolher de dois meses para os palestinos, que após o massacre de Goldstein procuravam evitar um ato de vingança.

Depois, com o fechamento da rua Shuhada, a mais importante de Hebron, para a passagem dos palestinos, e a transformação de antigos mercados de carne e frutas em zonas desocupadas onde não podem sequer se aproximar.

E desde o início da segunda Intifada (setembro de 2000), dividendo a região por cores: nas zonas roxas, os palestinos não podem dirigir veículos; nas laranjas, não podem abrir lojas nem dirigir; e nas vermelhas, não podem nem ao menos caminhar.

Hajj Mufid Sharabati, um comerciante de 48 anos, foi um dos milhares de palestinos afetados pelo crime de Goldstein.

Sua casa e seu estabelecimento estão na rua maldita, onde ainda resiste, preso atrás de grades, apesar dos ataques dos colonos, que segundo ele o exército não evita e o deixaram prostrado na cama.

“Os palestinos fomos massacrados e ao mesmo tempo sofremos as consequências. A rua foi blindada, tive que fechar a loja e ficamos sem meios de subsistência. Agora só podemos caminhar em uma direção”, explica Sharabati, cuja família vive de ajudas e da solidariedade dos vizinhos.

Este caso não é o único, segundo a ONG israelense Betselem. Desde 1994, cerca de 42% das famílias que habitavam a área controlada por Israel tiveram que emigrar.

Além disso, aproximadamente 77% dos comércios palestinos na área medieval tiveram que fechar, transformando o centro em um labirinto de becos espectrais.

“Na dinâmica de Hebron dá no mesmo quem instiga ou inicia a violência, só uma das partes paga o preço, e sempre são os palestinos”, conclui Shaul. EFE

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