Morte de 12 mulheres escancara problemas em planejamento familiar na Índia
Jaime Leon.
Nova Délhi, 12 nov (EFE).- O número de mulheres mortas após serem submetidas a esterilização na Índia subiu para 12 nesta quarta-feira, em um caso de má prática médica que revelou graves irregularidades na campanha de planejamento familiar do segundo país mais povoado do mundo.
Pelo menos 83 mulheres foram esterilizadas por um médico e seu auxiliar por laparoscopia, com apenas um só instrumento, no sábado, na área de Pendari do distrito de Bilaspur, no centro do país, quebrando vários protocolos médicos, contou à Agência Efe o porta-voz do governo local, Rajat Kumar.
“É um caso de negligência médica em que os protocolos governamentais não foram seguidos”, afirmou Kumar, que confirmou o aumento do número de mortas nas últimas horas.
O porta-voz disse que o médico que praticou as intervenções, o doutor K. Gupta, ultrapassou o limite de 30 operações deste tipo com um laparoscópio, não esterilizou os instrumentos e não medicou corretamente as pacientes para evitar possíveis infecções.
Além disso, as 83 operações foram realizadas em apenas quatro horas, contou a Efe um porta-voz da delegacia de polícia da área do hospital onde o processo foi realizado, S. N. Shukla.
Uma rapidez que, segundo um dos auxiliares médicos suspenso pelas autoridades por este caso, R. K. Bhamge, se deveu à necessidade de cumprir as cotas estabelecidas pelo governo local.
“Existem cotas anuais. As operações são feitas de acordo com isso”, disse Bhamge à televisão local “NDTV”.
Pouco depois das cirurgias, algumas das pacientes começaram a sentir dores abdominais e ter vômitos. As primeiras mortes aconteceram na manhã de segunda-feira, e hoje houve quatro novas vítimas.
70 mulheres estão hospitalizadas, três delas em estado crítico, informou à Efe o diretor adjunto do Departamento de Saúde e Bem-estar Familiar Estadual, Amar Singh Thakur.
Thakur afirmou que a causa das mortes ainda é desconhecida, mas eles suspeitam terem sido por choque séptico, provocado pelo uso de instrumentos médicos infectados, o que somente as autópsias poderão confirmar.
O governo denunciou o médico, que foi agraciado ano passado pelas autoridades locais por alcançar a marca de 50 mil esterilizações de mulheres em sua carreira.
Um comitê de investigação foi criado, outros três funcionários de saúde foram suspensos e o governo anunciou indenizações no valor de 200 mil rúpias (cerca de R$ 8.300) para as famílias das vítimas e 50 mil rúpias (R$ 2.080) para as que estão em estado crítico.
A esterilização em massa em Bilaspur faz parte das frequentes campanhas voluntárias, mas remuneradas, de planejamento familiar realizadas na Índia em áreas de baixos recursos para conter o crescimento demográfico.
Em 2013 foram realizadas 4,6 milhões de esterilizações na Índia, 72% delas em mulheres diante da recusa dos homens de se submeter a uma vasectomia, “baseada na crença de que ela afetaria a virilidade”, apontou a diretora adjunta da ONG Fundação para a População da Índia, Sona Sharma.
As mortes de mulheres em campanhas de esterilização não são novas no gigante asiático. De acordo com dados do parlamento publicados pelo jornal “Hindustan Times”, 1.434 mulheres morreram entre 2003 e 2012 após se submeterem a cirurgias deste tipo.
“Não se seguem os protocolos médicos nem de segurança. Os instrumentos médicos não são esterilizados, nem é feito o acompanhamento das pacientes”, afirmou Sharma.
“A isso é preciso acrescentar a pressão para alcançar as cotas estabelecidas pelos governos locais”, acrescentou o especialista.
As mulheres recebem indenizações por se submeterem à cirurgia – 1.400 rúpias (R$ 58) no caso de Bilaspur – para pagar o transporte ou como retribuição por um dia de trabalho perdido.
“Mas isto se transformou em uma espécie de coerção. Há mulheres pobres que se esterilizam só pelo dinheiro”, denunciou Sharma.
Em alguns casos, os governos locais oferecem sorteios de carros ou eletrodomésticos em troca das esterilizações.
A Índia é o segundo país mais povoado do mundo, com 1,25 bilhão de habitantes. A ONU estima que em 2028 o país superará a China e se tornará a nação mais populosa do mundo. EFE
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