Conflitos territoriais podem se acentuar com a invasão de Putin à Ucrânia; entenda
Especialistas ouvidos pela Jovem Pan afirmam que a disputa entre China e Taiwan deve ser a próxima a preocupar a comunidade internacional; só na América Latina, existem nove confrontos
Disputa de poder, aumento da área de influência, questões históricas mal resolvidas e custo-benefício são os principais motivos que marcam um conflito territorial entre países. A invasão da Rússia à Ucrânia, que acontece desde o dia 24 de fevereiro, pode colocar em perigo Estados que conseguiram sua soberania ou que brigam por algum território específico, porque há chance de que outros líderes se mobilizem e tenham uma atitude parecida. “A agressão de países a outros sempre esteve presente na história. A guerra é uma constante nas relações entre países”, explica Leandro Consentino, especialista em Relações Internacionais. Apesar de ser um cenário frequente, ele relata que nos “últimos tempos a gente vinha tendo uma disciplina no sentido da preservação da soberania, sobretudo desde o fim da Segunda Guerra Mundial, com algumas exceções cirúrgicas”. Em sua avaliação, porém, a atitude dos russos é bastante “perigosa para o equilíbrio internacional”.
Atualmente, há vários conflitos em curso mundo afora. Uns são mais quentes, como é o caso da China, que busca uma reunificação com Taiwan, além de tomar o controle de Tibete por causa da sua localização estratégica; e da disputa entre Sudão, Egito e Etiópia pela gestão do rio Nilo. Já outros são mais frios, como a disputa pelas Malvinas entre Argentina e Reino Unido. O analista de inteligência da FGV, Leonardo Paz, afirma que a intensidade do conflito tem a ver com o custo-benefício. “O conflito fica congelado até surgir uma oportunidade. Quando as partes envolvidas identificam ganho, elas atacam. Caso haja incerteza de vitória, elas não começam um conflito”, explicou em conversa com a reportagem da Jovem Pan. Paz diz ter certeza de que “a qualquer momento, nos próximos anos, veremos um conflito entre China e Taiwan”. Consentino elenca outras razões para o início de um conflito. “[O estopim] Está ligado ao significado daquele território. A grande questão está ligada, por vezes, à posse de recursos”, resume.
Muitos dos conflitos atuais tem 90 anos ou mais. Só na América Latina, existem nove – um deles, inclusive, envolve o Brasil e o Uruguai. Os dois países disputam a região de Ilha Brasileira, que fica na fronteira. Para Consentino, os brasileiros não enfrentam problemas territoriais há algum tempo porque o país teve questões bem resolvidas do ponto de vista de suas divisas. “O Barão do Rio Branco foi um dos responsáveis por consolidar pacificamente a maioria das nossas fronteiras”, explica. Outros conflitos que acontecem na América são:
- Essequibo – região disputada por Guiana e Venezuela há 180 anos;
- Rio Sibún – disputado por Belize e Guatemala há 160 anos;
- Arquipélago de San Andrés, Providência e Santa Catalina – o embate entre Colômbia e Nicarágua ocorre há décadas;
- Rio Silala – Chile e Bolívia brigam pelo direito às águas desde 1990;
- Golfo de Fonseca – Honduras, El Salvador e Nicarágua batalham pelo poder sobre a região;
- Passagem de Drake – região disputada por Argentina e Chile;
- Ilha de Navass – a disputa dessa região acontece desde 1859 entre Haiti e Estados Unidos;
- Saída para o mar – conflito que acontece desde 1904 entre Bolívia e Chile
Como se vê, são muitos os conflitos que ocorrem na América. Apesar disso, as disputas não repercutem ou entram na ordem do dia – a não ser que os Estados Unidos estejam envolvidos. Para Consentino há dois motivos para que isso aconteça. O primeiro tem relação com um nacionalismo mais antigo, mais exacerbado e entranhado no cidadão. “Aqui [na América] nós temos uma questão mais bem resolvida do ponto de vista do nacionalismo”, diz. O especialista explica que a visibilidade é maior quando envolvem a Europa e o país atualmente comandado por Joe Biden porque estas nações estão “no coração do mundo ocidental, muito mais do que aqui na periferia das Américas”. Paz cita o caso dos refugiados, um problema crônico que está no horizonte da comunidade internacional há anos – a situação envolvendo a guerra civil na Síria é emblemática –, mas que ganhou notoriedade nas últimas semanas em razão da invasão do território ucraniano. “Agora virou a crise dos refugiados, antes não se falava”, aponta.
Os conflitos territoriais não envolvem apenas duas nações soberanas. Eles também acontecem dentro dos próprios países, como foi o caso das regiões separatistas de Donestky e Luhansky, territórios ucranianos pró-Rússia. Situação semelhante ocorre na Espanha, onde líderes do país enfrentam o pleito da Catalunha para se separar dos espanhóis. As razões que fazem com que uma cidade ou Estados queiram se desvincular de um país estão “normalmente ligadas ao fato das maiorias étnicas serem bastante diversas das outras pessoas que estão naquela região”, segundo Consentino. No Brasil, também houve um caso parecido. O Sul do país já especulou se desligar do Brasil. É um cenário histórico que remonta aos tempos da Revolução Farroupilha.
Mesmo com o Brasil tendo seus territórios bem definidos, na sexta, 18, durante um evento no Ceará, uma fala do Ministro da Economia, Paulo Guedes, criou um pequeno atrito entre os dois países. “O Paraguai virou praticamente um Estado brasileiro com imposto zero, cresceu, ficou rico porque se beneficia da escala brasileira exportando para o Brasil”, disse. Em resposta ao auxiliar do presidente Jair Bolsonaro, o Ministério de Relações Exteriores do Paraguai se posicionou por meio do Twitter e disse que “lamenta as expressões infelizes de um alto funcionário do governo brasileiro”, acrescentando que “o Paraguai é e será sempre uma nação livre, soberana e independente, e em homenagem a quem a defendeu heroicamente ao longo de sua história, não pode deixar passar por alto essas lamentáveis expressões”.
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