Desaparecimento de mulher que impulsionou #MeToo aumenta preocupação com segurança de ativistas chineses
Sophia Huang Xueqin ganhou bolsa de estudo na Universidade de Sussex, no Reino Unido, mas nunca apareceu; ela e o ativista Wang Jianbing sumiram a caminho do aeroporto em setembro de 2021
Há oito meses, ninguém tem notícias da jornalista Sophia Huang Xueqin – feminista que impulsionou #MeToo na China – e do ativista dos direitos trabalhistas Wang Jianbing, que desapareceram a caminho do aeroporto da cidade de Guangzhou. Uma investigação realizada pela BBC News, acendeu um debate global sobre a responsabilidade das instituições estrangeiras de proteger os estudantes da China, que representam mais de 20% das matrículas internacionais na Universidade de Sussex, onde Huang recebeu a bolsa de estudos Chevening, financiada pelo governo do Reino Unido, mas nunca chegou para desfrutar.
“O caso de Sophia desencadeou uma discussão global atrasada sobre o papel das instituições globais em proteger os acadêmicos chineses em risco de perseguição”, diz à BBC Joanna Chiu, autora do livro China Unbound e ex-correspondente em Pequim. “Como Huang recebeu uma bolsa de estudos financiada pelo governo do Reino Unido para estudar na Universidade de Sussex, essas instituições têm a responsabilidade de lutar pela sua libertação”. Apoiadores acusam a universidade e o programa de bolsas Chevening de não se manifestarem por medo de antagonizar o governo chinês.
Quando o desaparecimento de Huang foi relatado pela primeira vez, a Universidade de Sussex e o Chevening divulgaram a seguinte declaração: “Estamos preocupados com a segurança e o paradeiro de nossa aluna. Nossa equipe está em contato com Chevening para buscar mais detalhes”. Mas desde então, nenhum dos dois fez mais declarações públicas. Estima-se que a jornalista e o ativista estejam detidos em seu próprio país, o que fez, nos últimos meses, apoiadores chineses de Huang realizarem protestos de solidariedade em Londres, Taipei e Hong Kong, lançando uma campanha chamada #FreeXueBing, pedindo aos apoiadores que enviem cartões postais ao centro de detenção de Guangzhou pedindo sua libertação.
No Reino Unido, os apoiadores também estão pedindo às instituições britânicas que assumam uma postura mais forte no caso. “Estamos fazendo isso para mostrar que não seremos silenciados”, disse à BBC um chinês que mora em Londres e pediu para permanecer anônimo devido a preocupações como segurança. “Pedimos à universidade, ao programa Chevening e ao governo britânico que tomem mais atitudes”.
Em um e-mail interno vazado para a BBC, alunos e funcionários foram avisados para não discutir a situação de Huang após um pedido de comentário sobre o caso. A universidade disse que este é um assunto delicado e as solicitações da mídia devem ser tratadas pela assessoria de imprensa, citando preocupações com a proteção de dados. Kris, uma amiga de Huang e uma feminista chinesa no Reino Unido que falou à BBC sob um pseudônimo por medo de represálias do Estado chinês, disse estar indignada ao saber da “censura” da universidade ao seu caso. “[A universidade] afirma nutrir futuros ativistas e líderes do feminismo [mas] instruiu os alunos a não discutirem esse assunto”, disse Kris. “É como se você estivesse na China.”
A universidade se pronunciou sobre o caso. De acordo com um porta-voz, eles continuam “profundamente preocupados com a segurança e o paradeiro de sua futura aluna” e está em “contato regular” com o programa Chevening e o FCDO, órgão do governo britânico responsável pela bolsa. O porta-voz acrescentou que a universidade seguiu o conselho da FCDO, que disse à BBC que estava “acompanhando o assunto de perto”.
Em dezembro, mais de 100 alunos contemplados com a bolsa assinaram uma carta pedindo à equipe de liderança do Chevening que pedisse a libertação da dupla e que o FCDO iniciasse um diálogo com o governo chinês sobre seus casos. Membros da União de Universidades e Faculdades do Reino Unido também divulgaram uma declaração defendendo Huang e Wang. O Chevening não respondeu aos pedidos de comentários da BBC.
Na época do desaparecimento, a IFJ (Federação Internacional de Jornalistas), suspeitava que o alvo seria Wang, porque ele estava realizando reuniões que poderiam ser entendidas como “incitação para subverter o poder do Estado” – uma alegação séria que pode levar a anos de prisão -, e como Huang estava junto, acabou sendo levada. Agora, depois de mais de sete meses de detenção, espera-se que eles sejam julgados. Enquanto os casos de Huang e Wang estão sendo entregues a promotores na China, Kris e outros apoiadores estrangeiros planejam continuar aumentando a conscientização sobre sua situação. “Estar dentro ou fora da China é como estar dentro ou fora de uma fortaleza. Mas estar do lado de fora não significa que você é livre”, disse Kris. “E somente quando eles forem libertados que todos nós podemos ser verdadeiramente livres.”
*Com informações da BBC News
Comentários
Conteúdo para assinantes. Assine JP Premium.