‘Fechamento da fronteira significa o fracasso da diplomacia brasileira’, diz professora da USP

  • Por Jovem Pan
  • 23/02/2019 10h18 - Atualizado em 23/02/2019 20h04
Reprodução/Intagram Segundo a advogada internacional Maristela Basso, da USP, o Brasil não usou 'toda sabedoria' das estratégias internacionais

A decisão do ditador Nicolás Maduro de fechar a fronteira da Venezuela com o Brasil significa “o fracaso da diplomacia brasileira”, de acordo com a advogada internacional e professora da USP Maristela Basso. Segundo ela, isso ocorreu porque não “usamos de toda sabedoria” das estratégias internacionais.

Basso explica que o Brasil não deveria ter apoiado o líder oposicionista Juan Guaidó, que se autoproclamou presidente interino do país há um mês. “À medida em que o presidente, o ministro das relações exteriores e o vice-presidente se colocam ao lado de Guaidó, chamam Maduro de genecida, eles tornam a negociação com Maduro muito difícil, se não impossível”, disse ela em entrevista ao Jornal da Manhã da Jovem Pan, neste sábado (23).

“A situação de tensão [atual] é decorrente da falta de experiência internacional do Brasil de conduzir a relação diplomática [com a Venezuela]”, continuou a especialista.

A advogada admite que Guaidó é um “expoente da oposição”, mas criticou sua decisão de se autoproclamar presidente interino do país. “Se tivesse que tecnicamente avaliar a conduta dele, diria que não é a mais promissora, não é a que vai apresentar maior chance de solução aos problemas da Venezuela“.

Maristela Basso afirma que, ao invés do que fez, Guaidó deveria ter montado um governo paralelo “na sombra”. “Isso acontece muito no Reino Unido”, disse ela.

“Um primeiro-ministro quando não é escolhido, eles mantém um governo na sombra, fazendo uma oposição efetiva. Eles conversam com a comunidade internacional, visitam pessoas, recebem outras pessoas”, explicou ela. “Eles fazem tudo dentro das regras constitucionais e dentro da melhor política do que se pode fazer quando se é um candidato que não foi escolhido.”

Segundo a especialista, Maduro pode sair vitorioso dessa queda de braço entre ele e Guaidó pelo fato de que quem está ao lado do ditador está “alimentado”. “O povo que está ao lado de Maduro está alimentado, dormiu bem essa noite, tem acesso a medicamentos. Além disso, Maduro conta com [o apoio da] cúpula do Exército, ele promoveu mais de 1200 soldados a generais. Isso signifca triplicar os salários, ter melhores condições de vida. Eles são leais a Maduro como seriam a qualquer outro que os colocasse nessa siutação”.

Guaidó, por outro lado, está com a popualação faminta, sem medicamentos e que não tem segurança. “Se houver uma guerra, Guaidó provavelmente sairá perdendo, porque quem está ao lado está desnutrido e não têm armamentos do mesmo potencial quanto quem está com Maduro”, disse Maristela.

Além de ter sido um equívoco, o Brasil desrespeitou a Constituição brasileira ao apoiar o líder da oposição venezuelana, segundo a advogada. Ela explica que a a Carta Constitucional brasileira não permite a intervenção em assuntos internos de outro país e reconhece a autodeterminação de questões internas de outra nação. “Nós violamos os dois”, disse.

Ajuda humanitária

A advogada internacional Maristela Basso considera improvável que o Brasil consiga entregar as 200 toneladas de mantimentos e medicamentos que estão na fronteira do estado de Roraima com a Venezuela. Segundo ela, já era sabido que Maduro não permitiria a entrada desses produtos, prevista para acontecer neste sábado (23).

“O Brasil fez uma propaganda disso e está olhando a curto prazo. Era preciso ter feito isso de forma mais discreta, sem fazer associação com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que a gente sabe que é o inimigo número um de Maduro”, explicou.

“Se a nossa intenção fosse ajudar os irmãos venezuelanos, esse acordo com os Estados Unidos, de entrada de mantimentos norte-americanos via Brasil não poderia ter sido tão clara. “Os mantimentos vindos dos Estados Unidos poderiam ter chegado ao Brasil e terem se misturado à ajuda brasileira, para chegar de forma pacífica e pragmática.”

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