Myanmar consolida sua democracia, mas continua excluindo minorias
Apesar de representarem uma grande vitória para a democracia, as mais recentes eleições no país colocam no poder uma líder criticada por ter sido conivente com o genocídio da minoria rohingya
Conforme informações divulgadas oficialmente nesta sexta-feira, 13, a Liga Nacional pela Democracia conseguiu conquistar mais uma vez a maioria dos assentos no Parlamento do Myanmar, enquanto os militares ficaram com apenas 25% deles. As novas eleições serviram para consolidar a democracia no país asiático, mas também trouxeram de volta a atenção para os conflitos sangrentos que existem entre as etnias do nação. Observadores denunciaram que mais de 1,5 milhão de pessoas foram impedidas de votar por pertencerem a uma das muitas minorias que compõem as regiões fronteiriças do Myanmar. Vencedora do Prêmio Nobel da Paz de 1991 pela sua luta contra a ditadura, a atual líder do país, Aung San Suu Kyi, está sendo mais uma vez acusada de não ter feito nada para solucionar o problema étnico durante o seu primeiro mandato. Outros ganhadores do título, como Dalai Lama, Desmond Tutu e Malala Yousafzai chegaram a pedir que Suu Kyi fizesse algo para conter a violência, mas não tiveram sucesso.
Desde que conquistou a sua independência do Reino Unido em 1948, o Myanmar vivencia um caos político e social. A súbita ausência de um poder centralizado levou a um golpe militar em 1962, que dá fim à constituição existente até então e inicia um processo de socialização da economia. O regime só começará a de fato dar lugar à democracia em 2011, de forma que o país asiático viveu quase 50 anos de perseguição política e outros abusos de poder, que incluíram assassinatos, torturas, escravidão, trabalho infantil e tráfico humano. O governo também era conhecido por utilizar a violência sexual como forma de controlar a população. Foi nesse contexto de violações dos direitos humanos que a ativista Aung San Suu Kyi despontou como a principal líder da oposição e fundou a Liga Nacional pela Democracia, que em 2016 teve a sua primeira vitória reconhecida em uma eleição contra o Partido da Solidariedade e do Desenvolvimento da União, que representa os militares.
Assim, os democratas passaram a ocupar a maioria absoluta dos assentos do Parlamento e Htin Kyaw foi eleito o primeiro presidente do país desde o golpe militar. Na prática, porém, a pessoa mais poderosa do Myanmar passou a ser Suu Kyi, que se tornou Conselheira do Estado, um cargo similar a de um primeiro-ministro. O problema é que a imagem da ativista piorou significativamente desde sua ascensão ao poder. As pequenas etnias que ocupam as regiões fronteiriças do Myanmar possuem línguas, costumes e religiões diferentes da maioria birmanesa budista, que as perseguem desde que o país se tornou independente do Reino Unido. A própria ONU chegou a dizer, em 2017, que estava acontecendo uma “limpeza étnica” no país, com vilarejos inteiros sendo queimados pelos budistas. A etnia muçulmana Rohingya é um exemplo representativo do problema: em momentos de maior hostilidade, cerca de 400 mil integrantes do grupo fugiram para Bangladesh. Apesar de viverem no país há gerações, eles são tratados como imigrantes ilegais, sem direito à cidadania e, portanto, não participaram das últimas eleições.
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