O amor em tempos de Estado Islâmico

  • Por Agencia EFE
  • 14/02/2015 19h50

Yasser Yunis.

Arbil (Iraque), 14 fev (EFE).- As flores e os presentes típicos do Dia de São Valentim desapareceram de Mossul, cidade iraquiana tomada pelo grupo jihadista Estado Islâmico (EI) que este ano substituiu as demonstrações de afeto pelo sangue do conflito e o terrorismo.

A data é vivida na segunda maior cidade do Iraque com amargura, às escondidas dos que impuseram um califado pelas armas e mediante uma interpretação radical do islã.

O EI considera que essa festa é uma tradição do Ocidente e, portanto, um “pecado”. Para eles, celebrá-la seria como “cometer abertamente o mal”, explica Salem al Musuli, um comerciante do centro de Mossul.

Em uma conversa por telefone com a Agência Efe, este dono de uma loja do centro da cidade que normalmente vendia presentes de São Valentim diz que o EI os proibiu de celebrar a data “ou qualquer outra que se pareça”.

Como consequência, as ruas da cidade hoje estão sem qualquer enfeite ou decoração, já que todos os produtos que costumavam encher as vitrines nesta data foram retirados.

“O EI ameaçou com duros castigos os que não obedecerem a essa ordem, tanto os que vendem quanto os que compram”, explica Al Musuli, que acrescenta que também não há muitos produtos por conta do atual cerco que o governo central iraquiano impôs a Mossul, e que impede a entrada de qualquer tipo de mercadoria.

As forças iraquianas estão se preparando para libertar a cidade nos próximos meses. Ela é a capital da província de Ninawa e está nas mãos dos jihadistas desde junho do ano passado.

A comemoração do Dia de São Valentim está proibida nas regiões controladas pelo EI, mas a situação é diferente nas aéreas que permanecem livres.

Na cidade de Arbil, capital do Curdistão iraquiano, a luta constante contra o EI fora das fronteiras dessa região autônoma não impediu os moradores de passarem o dia de hoje com um pouco de festa.

Os mercados e lojas fizeram decorações em vermelho. Presentes e balões de gás estavam expostos em vários bairros de Arbil, sobretudo nos de maioria cristã.

Por lá, os comércios estavam abarrotados de pessoas que faziam compras de última hora para o Dia dos Apaixonados, entre elas jovens de Mossul que se viram obrigados a ir ao Curdistão fugindo da violência.

Aus Hasu, da cidade de Al-Hamdaniya, de onde os moradores cristãos fugiram perante a ameaça dos jihadistas, confessa à Efe que economizou dinheiro para comprar um presente para sua namorada, embora agora estejam separados.

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“Apesar de a guerra ter nos separado, decidi comemorar São Valentim com ela mesmo a distância, já que a guerra não impede o amor”, afirma o jovem, que costumava celebrar todos os anos em grande estilo.

Ele acredita que algum dia voltará a encontrá-la e lembrarão “todo o sofrimento, mas também a realização de um dia como o de hoje”.

O sentimento de alegria se choca com a tristeza que experimentam os deslocados, que tentam superar seus problemas e aproveitar como podem.

A iraquiana Um Seif al Tai, de 35 anos e deslocada de Mossul, prefere trocar juras de amor com seu marido este ano sem que haja presente envolvido “por conta da tristeza e das condições de vida” que levam. Para ela, São Valentim tem agora um “sabor diferente”.

“Estamos longe de nossa querida Mossul, onde está nossa gente, nossa família, nossos amigos e todas nossas lembranças”, sustenta.

Ela se solidariza com os compatriotas que vivem sob o “governo criminoso do Estado Islâmico” e sob os bombardeios aéreos da coalizão internacional, que, em sua opinião, “já não diferença civis e de jihadistas”.

O conflito também deixou casais separados para sempre. Shaima Mohammed perdeu nos combates seu namorado, um oficial das forças armadas iraquianas.

“O amor é vida. Foi o amor à nação que nos trouxe até aqui e o mesmo que levou o meu amor”, diz a jovem, que tem esperanças de que o Dia dos Apaixonados também passe uma “mensagem de paz, perdão e harmonia para o mundo”. EFE

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