O obscuro mundo da caça “legal” no Zimbábue
Ryan Tuscott.
Harare, 8 ago (EFE).- O assassinato do leão Cecil cometido pelo dentista americano Walter Palmer, que pagou US$ 545 mil (R$ 1.930) para supostamente poder caçar o animal de forma “legal”, pôs o foco sobre o obscuro mundo da caça no Zimbábue, prática iniciada no século XIX, quando os primeiros colonos chegaram.
Caçadores profissionais chegam ao país vindos de todo o mundo para participar de expedições caras, como a que oferece a companhia americana Georgia Safaris: US$ 25.110 (R$ 88.830) por uma caçada de 14 dias cujo único objetivo é encontrar e abater um leopardo.
Nesse valor não estão incluídos a taxa de abate (valor pago quando se fere ou se mata o animal designado), os impostos do governo zimbabuano nem o custo de preparar e embalar a presa para levá-la aos Estados Unidos, o que faz subir consideravelmente o montante final da “brincadeira”.
Em comparação, a caça do leopardo na vizinha África do Sul custa US$ 447 (R$ 1.580) a mais, além dos outros US$ 13.700 (R$ 14.950) de abate, segundo a oferta da operadora local African Sky Hunting.
No entanto, a caça não é um entretenimento só para os estrangeiros. Zimbabuanos ricos e com bons contatos também participam da atividade, inclusive usando arco e flecha, como a que matou Cecil.
No Save Valley Conservancy, uma área particular no sudeste do Zimbábue, caçar um impala é mais barato. O antílope típico de planície custa em média US$ 147 (R$ 520).
As autoridades do Zimbábue estabelecem todos os anos cotas e taxas para cada tipo de animal, calculadas com base na população existente, em uma tentativa de controlar a caça e, ao mesmo tempo, conseguir lucro da abundante fauna selvagem.
Recentemente, o diretor-geral da Autoridade dos Parques e Vida Selvagem do Zimbábue (ZPWMA), Edson Chidziya, afirmou que este ano só serão liberados 70 leões de uma população global de dois mil. O Parque Nacional de Hwange, onde Cecil morava, tinha recenseados 112 leões em 2013.
A maioria dos países da África meridional permite a caça esportiva, a única exceção é Botsuana. Há poucos dias, o país proibiu a atividade e o Zimbábue adotou severas restrições para a caça de leões, leopardos e elefantes fora dos parques naturais.
No ano passado, o Zimbábue obteve US$ 68.779.620 (R$ 243.406.175) graças à caça esportiva, conforme números oficiais, enquanto este ano espera-se que nesta temporada a arrecadação chegue a US$ 74.238.320 (R$ 262.647.752), embora acredite-se que a recente proibição de importar marfim aos Estados Unidos afete o negócio.
Theo Bronkhorst, o caçador profissional que ajudou Walter Palmer a matar Cecil, recebeu várias críticas por seu comportamento, já que tudo indica que o felino foi atraído para fora dos domínios do parque para que, tecnicamente, o abate deixasse de ser ilegal.
Somente o guia que revelou a morte do leão, Bryan Orford, se atreveu a defender Theo Bronkhorst.
“É uma boa pessoa e só fazia o que a maioria de caçadores profissionais faz no Zimbábue. Pode ser que tenha se equivocado. É humano como todos”, comentou.
No entanto, são constantes as denúncias de práticas negativas de guias e caçadores locais. Eles são acusados de organizar caçadas noturnas, atrair animais com iscas e trocar às presas de lugar após a caça para não descumprir as cotas.
“A caça é um atividade econômica que gera milhões para pessoas de quem não sabemos nada e só ouvimos falar desses milhões quando heróis como Cecil morrem”, lamentou recentemente o jornal “Sunday Mail”. EFE
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