ONG denuncia uso de crianças-soldado dos 2 lados da trincheira em Mianmar
Noel Caballero.
Bangcoc, 26 ago (EFE).- O uso de crianças-soldado persiste dos dois lados das trincheiras nos conflitos entre o exército de Mianmar (a antiga Birmânia) e várias das guerrilhas étnicas do país, segundo uma organização de direitos infantis.
A Child Soldiers International acusa as autoridades birmanesas de continuar com o recrutamento “ilegal” de menores em suas fileiras e documentou a violação do Exército para a Independência Kachin (KIA) ao alistar menores de 18 anos.
A organização também responsabiliza seis grupos armados das etnias karen, kareni, shan e wa de utilizar crianças-soldado em suas milícias.
“É impossível conhecer um número (exato) de crianças recrutadas como soldadas pelo exército, em parte porque estão em áreas em conflito pouco acessíveis”, disse Charu Lata Hogg, diretora de assuntos políticos da organização, com sede central em Londres.
Segundo Hogg, em 2015 a ONG recebeu relatórios do desdobramento de crianças-soldado pelas autoridades birmanesas na primeira linha de batalha nos estados de Shan e Kachín.
Apesar de o governo civil que substituiu à junta militar em 2011 ter prometido terminar com a prática e ter liberado do serviço 646 menores desde 2012, um relatório da ONU assinalou que 357 menores foram recrutados pelas forças armadas em 2014.
“Buscamos o fim do recrutamento (de menores) e o uso de pessoas com menos de 18 anos nos confrontos, seja pelas forças armadas – conhecidas como Tatmadaw Kyi – ou por grupos não filiados. Isto também inclui meninos e meninas que trabalham como cozinheiros, mensageiros, espiões ou com propósito sexual”, declarou Hogg.
Em junho de 2011, a guerrilha KIA e as autoridades militares retomaram as hostilidades, rompendo um cessar-fogo selado 17 anos antes.
Em seu relatório, intitulado: “Um perigoso refúgio: o contínuo recrutamento de crianças pelo KIA”, publicado em junho deste ano, a Child Soldiers International documentou o alistamento “voluntário e forçado” de menores pelo grupo rebelde kachin.
O estudo, que entrevistou crianças-soldado e membros do KIA, conclui que há mais de mil menores nas fileiras do grupo armado, apesar de “não haver evidências” de seu desdobramento na frente de batalha.
A precariedade econômica, junto das limitadas oportunidades de emprego e de acesso à educação, empurram muitos menores nas zonas de conflito a pedirem voluntariamente sua adesão nas fileiras militares ou guerrilheiras como opção de futuro, apontou.
Outros se alistam motivados por sentimentos nacionalistas ou de lealdade ao movimento revolucionário, ou respondendo ao sistema estabelecido pelo KIA para as comunidades kachin: “um recruta por família”.
A Child Soldiers International pediu a todas as partes que se comprometam mais para “prevenir” o recrutamento de menores e para permitir acesso às áreas onde operam membros das Nações Unidas para “observar e verificar” os relatórios.
Há um ano e meio, o governo de Mianmar iniciou uma rodada de conversas para buscar um acordo de paz em nível nacional com uma dezena de grupos étnicos armados, mas entre eles não está o KIA.
A ONG acredita que, além de negociar a paz, são necessárias outras ações para acabar com o problema dos crianças-soldado, como medidas sociais e econômicas que ataquem as raízes do recrutamento, a reforma do setor de defesa, o fortalecimento dos mecanismo de supervisão e a punição dos responsáveis.
“O recrutamento e a utilização (militar) de crianças deveriam ser considerados violações dos acordos de cessar-fogo”, sentenciou Hogg. EFE
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