Os “duplos refugiados” palestinos, da guerra ao esquecimento

  • Por Agencia EFE
  • 09/02/2014 11h02

Edu Marín.

Cairo, 9 fev (EFE).- Desde o início do conflito sírio em março de 2011, cerca de 6 mil palestinos residentes na Síria fugiram para o Egito buscando asilo e se depararam com uma realidade de vulnerabilidade que os leva a uma situação de “duplos refugiados”.

“No Egito me sinto de verdade um refugiado, um estrangeiro, não como na Síria, onde eu estava muito bem, inclusive melhor”, disse à Agência Efe Ahmed Gazaui, palestino de 54 anos, refugiado na Síria e agora no Egito.

Gazaui, que oculta sua verdadeira identidade com este nome fictício, chegou ao Cairo com sua mulher e seus quatro filhos em dezembro de 2012, em um voo direto vindo do Líbano, fugindo da barbárie que vive atualmente o primeiro país que o acolheu.

O resto dos palestinos deslocados residia na Síria sob a “proteção” da Agência das Nações Unidas para os Refugiados Palestinos (UNRWA), que, além disso, trabalha de maneira operacional na Jordânia, Líbano, Gaza e Cisjordânia.

No entanto, no Egito, a agência tem apenas um escritório de representação, o que restringe suas atividades para o trabalho humanitário sem conceder o estatuto de refugiado, nem dar proteção jurídica a essas pessoas, entre outras questões.

As autoridades egípcias não permitem que o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur), que trabalha de maneira operacional no país, se encarregue deles.

“Era a UNRWA que deveria se encarregar”, afirmou a diretora para Assuntos Palestinos do Ministério de Relações Exteriores egípcio, Mai Khalil, e acrescentou que o “Egito não considera refugiados os palestinos que vêm da Síria”.

No escritório da UNRWA no Cairo, sua diretora, Manal Arnus, explicou que o Egito não aceita que o Acnur acolha os palestinos porque, se fizesse, eles teriam direito de reivindicar a nacionalidade egípcia e deveriam renunciar a volta para a Palestina.

Sem a proteção das Nações Unidas, Gazaui e seus compatriotas não têm direito de trabalhar no Egito e vivem em uma situação legal que lhes impede de avançar, à espera que seja resolvido o conflito sírio.

“Meus filhos que estudam aqui têm visto de estudante, enquanto a que estuda em Damasco tem o de turista”, explicou Gazaui, que conseguiu visto graças aos estudos de seus filhos.

A ajuda humanitária que recebem vem do Programa Mundial de Alimentos (PMA), que concede cupons de 200 libras egípcias (cerca de R$ 66) ao mês a cada membro da família para gastá-los em supermercados associados.

Além disso, a UNRWA, o Crescente Vermelho e o Ministério das Relações Exteriores egípcio estudam um acordo para oferecer aos palestinos assistência sanitária gratuita, que entrará em vigor “em breve”, segundo Khalil.

A embaixada palestina também lhes oferece ajuda de tipo econômico e administrativo para a obtenção de permissões.

“Há alguns meses pudemos dar a cada família cerca de 1.500 libras (quase R$ 515) para a compra de móveis para suas casas”, disse Ahmed Moussa, cônsul político da delegação diplomática palestina no Cairo.

Moussa explicou que agora todos os refugiados palestinos procedentes da Síria estão em liberdade, depois que as autoridades egípcias libertaram recentemente os que se encontravam na prisão após terem sido detidos “por tentarem abandonar o país de forma ilegal”.

As consequências desse esquecimento obrigam os duplos refugiados a apelarem para ações desesperadas.

Além de tentar viajar à Europa cruzando clandestinamente o Mar Mediterrâneo em um barco, as outras opções para sair do Egito são ir para Líbano, onde é oferecido vistos de passagem de 48 horas, ou voltar aos horrores da guerra na Síria.

Enquanto os bombardeios e os massacres continuam, a volta para Síria é impensável para Gazaui, que disse já ter apresentado os documentos de sua família para se mudar para a França ou Áustria, embora ainda não tenha recebido resposta.

Uma nova solicitação para fugir pela terceira vez e se afastar cada vez mais de sua terra, a Palestina. EFE

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