Os heróis do ebola

  • Por Agencia EFE
  • 01/09/2014 06h22
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Elvira Palomo.

Washington, 30 ago (EFE).- O atual surto de ebola matou cinco pesquisadores que trabalhavam na análise genética da cepa do vírus atual para um estudo, publicado recentemente pela revista “Science”, mas que eles não chegaram a ver divulgado.

Desafiando a virulência e a rápida expansão do vírus do ebola que atinge a África Ocidental, cientistas, enfermeiras e médicos continuaram trabalhando para ajudar a combater este surto sem precedentes que se estende por Guiné, Libéria, Nigéria e Serra Leoa.

O preço foi muito alto também para os trabalhadores da área da saúde, já que a falta de equipamento suficiente ou seu uso inadequado, a escassez de profissionais para a magnitude da epidemia e a exposição prolongada aos pacientes causaram um forte impacto entre eles, com 240 infectados e 120 mortos.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), já passam de três mil os casos de ebola confirmados, e mais de 1.500 pessoas morreram, mas o órgão calcula que na realidade existam entre duas e quatro vezes mais contaminações do que isso.

O ebola matou renomados médios em Serra Leoa e na Libéria, “privando estes países não só do atendimento médico com experiência e dedicação, mas também de heróis nacionais”, lamentou esta semana a agência sanitária das Nações Unidas.

Entre esses heróis estão cinco dos co-autores do estudo intitulado “Vigilância genômica esclarece a origem do vírus do ebola e a transmissão durante o surto de 2014”, que junto com pesquisadores da Universidade de Harvard analisaram geneticamente 99 amostras do vírus, o que permitiu detectar suas mutações.

Os cinco cientistas eram experientes médicos do hospital Kenema Government Hospital (KGH) em Serra Leoa, onde foi detectado o primeiro caso neste país e onde a maioria das amostras foi recolhida.

Entre eles está Sheik Humarr Khan, um prestigiado virólogo que foi diretor do programa nacional de combate à febre de Lassa – um tipo de doença hemorrágica aguda com sintomas semelhantes ao ebola – para o Ministério da Saúde de Serra Leoa.

Khan, que também trabalhou para o Centro Africano na Excelência Genômica de Doenças Infecciosas (ACEGID) na Nigéria, tratou dezenas de pacientes antes de contrair o vírus.

No ACEGID anunciaram “com grande tristeza e profundo pesar o falecimento de um médico excepcional, um homem humilde e um amigo leal”, escreveu Kenneth Onye, diretor de projeto, no site do centro.

Já a médica Onikepe Folarin destacou que Khan, também colaborador da Iniciativa Africana de Herança Humana e Saúde, “demonstrou coragem” em uma situação em que outros de seus colegas se afastaram.

Entre as vítimas está Mbalu Fonnie, uma enfermeira que há mais de 30 anos tratava febre de Lassa, especializada em casos de mulheres grávidas e que contraiu a doença enquanto cuidava de uma de suas colegas de trabalho que esperava um filho.

Robert Garry, outro dos co-autores do estudo e virólogo na Universidade Tulane em Nova Orleans (Louisiana, EUA), lembrou em declarações à “Science” alguns de seus colegs, como “a tia Mbalu, uma figura maternal para toda a equipe”.

Outro enfermeiro com mais de dez anos de experiência cuidando deste tipo de pacientes, Alex Moigboi, descrito por Garry como uma pessoa “sempre sorridente”, com grande senso do humor e que gostava encorajar a todo o mundo, também se infectou cuidando da mesma enfermeira.

A mesma sorte infelizmente teve também a enfermeira Alice Kovoma, “uma pessoa maravilhosa, muito dedicada e profissional com grande devoção para seus pacientes e seus colegas de trabalho”, assegurou Garry.

Também morreu Mohammed Fullah, um técnico de laboratório que ajudou no estudo e que perdeu vários familiares por causa do ebola e que suspeita-se ter sido contaminado por algum deles.

Entre os participantes deste estudo está Sidiki Saffa, um técnico de laboratório que recolheu amostras de sangue e as processou e que morreu de um derrame cerebral sem relação com o ebola.

“Esta é uma extraordinária batalha que ainda temos pela frente. Já perdemos vários amigos e colegas, como nosso bom amigo e colega o doutor Humarr Khan, co-autor principal”, lamentou Pardis Sabeti, da Universidade de Harvard, também membro da equipe da pesquisa.

Os autores cederam os dados do estudo porque “todos estamos nesta luta juntos” e consideram que “a transparência e a parceria são a forma com a qual esperamos honrar o legado de Humarr” e do resto da equipe.

Mas para muitas sua morte não é o final: “Seu trabalho sentará as bases para um tratamento do ebola. Seu trabalho é imortal”, podia se ler em uma das mensagens de pêsames publicadas na internet. EFE

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