Os perigos de conectar-se à internet no Egito

  • Por Agencia EFE
  • 28/09/2014 10h16
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Belém Delgado.

Cairo, 28 set (EFE).- Ahmed não precisa se conectar à internet para falar com outros homossexuais egípcios para se sentir controlado pelas autoridades. “Eles já sabem tudo de mim”, afirma inquieto diante do receio de uma maior vigilância nas redes sociais.

Alguns de seus amigos já deixaram de utilizar aplicativos populares como o Grindr, que permite encontrar outros gays que buscam relacionamento em uma distância relativamente curta. Também há quem já não coloque mais suas fotos na rede para não ser reconhecido, argumenta Ahmed.

Ele admite que sempre preferiu as relações reais e que cada vez se expressa menos no Facebook e no Twitter, não por medo, mas por simples tédio.

Mas não deixa de ficar “chateado” pelos rumores que circulam sobre o uso dessas ferramentas por parte da polícia para perseguir os homossexuais conhecendo sua localização e pelas últimas detenções, como a de sete homens que apareceram em um vídeo celebrando o “primeiro casamento gay no Egito” em um navio.

“Não entendo porque (as autoridades) estão agindo assim, se quisessem já teriam detido todos”, ressalta Ahmed.

No Egito, a homossexualidade é socialmente repudiada e os tribunais a castiga vinculando a outros delitos existentes contra a moral ou a religião.

Para proteger seus usuários, o Grindr, por exemplo, aconselhou os egípcios a desativarem a opção de mostrar a localização exata e depois decidiu ocultar esse dado no Egito, Rússia, Arábia Saudita, Nigéria e outros países onde pode representar um risco para a comunidade gay.

Por sua vez, o Ministério do Interior egípcio negou recentes informações sobre a contratação de serviços de uma empresa especializada em vigiar as comunicações na internet, penetrando em programas como WhatsApp, Viber e Skype.

“Pedimos para que não sejam divulgados rumores que afetem à confiança dos cidadãos no Ministério”, assinalou em comunicado.

No entanto, seu passado negro de espionagem aos cidadãos durante o regime de Hosni Mubarak (1981-2011) não é algo que ativistas e grupos de direitos humanos possam esquecer facilmente.

O advogado Ali Atef, da Rede Árabe para a Informação dos Direitos Humanos, lembra que nos julgamentos são levadas em conta as provas conseguidas em público e não as tiradas do âmbito privado.

Mesmo assim, as autoridades usam estas últimas para seguir a pista, sobretudo, de islamitas e ativistas, focos de oposição desde a derrocada de Mohammed Mursi em 3 de julho de 2013, segundo Atef, que acrescenta que as empresas de telefonia continuam “gravando as conversas sem restrições”.

Ahmed Jir, diretor do Centro de Apoio para as Tecnologias de Informação, concorda que não existe proteção legal para os dados pessoais. Segundo ele, no fundo, o Estado quer limitar os direitos pessoais e manter seu “discurso autoritário e patriarcal” em assuntos como o sexo, a religião e a política.

Nem sequer os heterossexuais se livraram de receber uma chamada de atenção. A instituição religiosa Dar Al-Fatwa, protagonista recente de uma série de polêmicas normas, proibiu os chats entre homens e mulheres que não se conheçam por “serem frívolos e abrir a porta ao demônio”.

Embora depois um representante do grupo tenha detalhado que essa ordem “não podia ser tirada de contexto”, o assunto invadiu as redes sociais com todo tipo de brincadeiras e denúncias.

“As autoridades religiosas não querem que as pessoas de diferente sexo se conectem muito entre elas e insistem em dizer o que devemos fazer”, embora sua influência “seja muito pequena”, opinou Jir, para quem a comunicação na internet é uma atividade “normal” e representa um “grande passo para a civilização humana”. EFE

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