Decisão de Toffoli não invalida todo o acordo de leniência da Odebrecht, diz presidente da ANPR

Em entrevista ao site da Jovem Pan, Ubiratan Cazetta diz que despacho do ministro é correto ‘na forma’, mas pontua que recurso que será apresentado pela entidade quer esclarecer alguns pontos do caso

  • Por Tatyane Mendes
  • 07/09/2023 18h38 - Atualizado em 07/09/2023 18h43
Carlos Moura/SCO/STF Dias Toffoli Na quarta-feira, 6, Toffoli anulou todas as provas obtidas no acordo de leniência da Odebrecht, homologado em 2017

O recurso que será apresentado pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) e pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) visa esclarecer alguns pontos da decisão do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF). Na quarta-feira, 6, o magistrado anulou todas as provas obtidas no acordo de leniência da Odebrecht, homologado em 2017, que atingiu políticos de vários partidos. A decisão não anula todos os processos em que existam provas contra a empreiteira. No entanto, os juízes responsáveis precisarão avaliar novamente cada caso em que há uso dos sistemas Drousys e Mywebday e se houve ou não algum tipo de conduta suspeita. Em entrevista exclusiva ao site da Jovem Pan, o presidente da ANPR, Ubiratan Cazetta, afirma que a entidade quer que a Corte delimite os alcances do despacho. À reportagem, ele cita como exemplo a interferência do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Internacional (DRCI) na tramitação do material vindo da polícia.

“Especificamente, o que nós queremos discutir são outros detalhes. Deixar claro que a decisão não invalida o acordo de leniência feito, porque isso não era objeto de reclamação. O que a decisão pode e vem fazendo, fez com o [ministro Ricardo] Lewandowski, é discutir a questão do efeito probatório de uma das provas trazidas pelo acordo de leniência, mas não o acordo em si, o que ficou dúbio. Queremos trazer à discussão a questão da apuração de responsabilidade do magistrado, que já foram apuradas pela Corregedoria Geral do Ministério Público Federal e já se conclui que não houve nada”, esclarece. O procurador ressalta que é importante que a decisão fique clara e delimite o que ela efetivamente pode apreciar. Ele afirma que o recurso pode mudar, em partes, a decisão, pois existem uma série de determinações que são questionadas. “Imaginar que um recurso nosso provoque uma reapreciação da decisão sobre esse ponto específico [da invalidade das provas], não vamos vender essa ilusão. Até porque a decisão é correta na forma. Ele afirma que houve um problema e a gente discorda. Mas o ministro determina que os juízes identifiquem em cada um dos processos se o problema contamina o restante das provas. Ele não anulou todos os processos, mas deu aos juízes a obrigação de checar até que ponto aquilo contamina os processos em que houve uso dos dois sistemas [Drousys e Mywebday]”, complementa.

Como a Jovem Pan mostrou, a ANPR vai ajuizar um recurso no Supremo no início da próxima semana. A ação deve ser avaliada pela Segunda Turma da Corte, composta, além de Toffoli, pelos ministros Gilmar Mendes, Edson Fachin, Nunes Marques e André Mendonça. Por meio de nota, divulgada na quarta-feira, 6, a ANPR destaca a necessidade de discutir os fatos envolvendo a Operação Lava Jato a partir de uma análise técnica, objetiva, que preserve as instituições e não se renda ao ambiente de polarização. “Não é razoável, a partir de afirmação de vícios processuais decorrentes da suspeição do juízo ou da sua incompetência, pretender-se imputar a agentes públicos, sem qualquer elemento mínimo, a prática do crime de tortura ou mesmo a intenção deliberada de causar prejuízo ao Estado brasileiro”, diz a ANPR. Na decisão de 135 páginas divulgada na quarta, Toffoli escreve que os agentes que atuaram na Lava Jato “desrespeitaram o devido processo legal, descumpriram decisões judiciais superiores, “subverteram provas” e agiram com parcialidade. “Enfim, em última análise, não distinguiram, propositadamente, inocentes de criminosos. Valeram-se, como já disse em julgamento da Segunda Turma, de uma verdadeira tortura psicológica, um pau de arara do século XXI, para obter ‘provas’ contra inocentes”, diz trecho do despacho.

“O acordo de leniência firmado pelo Ministério Público Federal com a Odebrecht resultou de negociação válida, devidamente homologada pelo próprio Supremo Tribunal Federal, com a participação de vários agentes públicos, pautados em atividade regular”, rebate a ANPR. “Não é correta a afirmação de que o acesso aos sistemas Drousys e Mywebday, mantidos pela Odebrecht para registrar o pagamento de propina, descumpriu o procedimento formal de cooperação internacional”, acrescenta a associação dos procuradores. “É necessário respeitar-se o trabalho de dezenas de membros do Ministério Público Federal que atuaram no acordo de leniência firmado com a empresa Odebrecht, magistrados de diversas instâncias, policiais federais, agentes públicos da CGU e Receita Federal, dentre outros que agiram no estrito exercício de suas atribuições funcionais, com resultados financeiros concretos, revertidos aos cofres públicos”, segue a ANPR.

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