Oposição coleta assinaturas por PEC que barra militar da ativa em cargo civil
Proposta, de autoria da deputada federal Perpétua Almeida (PCdoB-AC), ganhou força após Exército decidir não punir o general Eduardo Pazuello por participar de ato pró-Bolsonaro
A decisão do Exército de não punir o general Eduardo Pazuello após sua participação em um ato político ao lado do presidente Jair Bolsonaro não gerou repercussão apenas entre oficiais das Forças Armadas. Nos últimos dias, parlamentares passaram a discutir a necessidade de alterar a Constituição a fim de impedir que militares da ativa ocupem cargos civis. Uma das iniciativas é a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) de autoria da deputada federal Perpétua Almeida (PCdoB-AC), que acrescenta ao artigo 37 da Carta Magna o inciso XXIII, segundo o qual “o militar da ativa somente poderá exercer cargos de natureza civil na Administração Pública, nos três níveis da Federação, desde que atendidos os seguintes requisitos: se contar menos de dez anos de serviço, deverá afastar-se da atividade; se contar mais de dez anos de serviço passará automaticamente, no ato da posse, para a inatividade”.
“As FFAA, e suas altas e dignificantes funções de defesa permanente da Pátria, não devem ser submetidas a interesses partidários, mas também não podem se desviar de sua função constitucional para participar da gestão de políticas de governos, estes, por definição democrática, transitórios. A história do Brasil e a própria Constituição nos trazem a certeza de que a presença de militares da ativa, servindo a governos e participando da luta política partidária, pode contaminar a tropa com a politização e a partidarização do seu corpo, fenômeno nefasto para a democracia”, diz um trecho da proposta. “É imperativo, pois, emendar o texto da Constituição para ampliar seu alcance democrático e republicano, em relação ao necessário distanciamento dos corpos militares das funções de governo. Aprimora-se, dessa forma, o modelo constitucional de isenção e apartidarismo das FFAA, bem como a natureza civil da ocupação política do Estado, mediante eleições livres, universais e periódicas”, acrescenta o texto.
“Sempre acreditei que instituições de Estados não são de governo ou de partidos políticos. Neste caso, quando a gente tem um presidente com o comportamento de Bolsonaro, que não é muito afeito a regras, que já mostrou em toda a sua história de vida política que hierarquia, disciplina e respeito à Constituição não são regras que gosta de cumprir, é preciso botar um freio nisso e deixar a Constituição mais clara acerca desta separação [entre Forças Armadas e governo]. Quando Bolsonaro fala em ‘meu Exército’ e ‘minhas Forças Armadas’, ele deixa a sociedade em dúvida sobre o verdadeiro papel do Exército, da Marinha e da Aeronáutica”, disse Perpétua em entrevista à Jovem Pan.
Para apresentar a PEC, são necessárias as assinaturas de, no mínimo, 171 deputados. Até o momento, 94 já endossaram a proposta – segundo relata a parlamentar, 20 apenas neste último feriado. A lista congrega integrantes de diversos partidos, como PCdoB, PT, PSOL, PDT, DEM, MDB, PSD, PL e PSL. Entre os signatários do texto estão Rodrigo Maia (DEM-RJ), ex-presidente da Câmara dos Deputados, e o atual vice-presidente da Casa, Marcelo Ramos (PL-AM). “Mandei recado para 200 parlamentares que tenho contato, pedi o apoio deles. Vários me retornaram dizendo que assinariam nesta semana. É um assunto que está quente na política. Percebo que muitos parlamentares estão preocupados em encontrar uma saída para não deixar as Forças Armadas vulneráveis aos comportamentos de presidentes”, afirma a autora da proposta.
A deputada do PCdoB evita estimar em quanto tempo conseguirá reunir as assinaturas necessárias para apresentar a PEC. À reportagem, ela explicou que o sistema híbrido adotado pela Câmara em razão da pandemia do novo coronavírus dificulta a interlocução com os parlamentares. “Esse sistema híbrido torna muito difícil a coleta de assinaturas. Para dar um exemplo, a reforma política, que é um assunto que está na mente dos deputados e senadores, ninguém consegue as 171 assinaturas. Tanto é verdade que está circulando a possibilidade de se criar um ‘emendão’, juntando todas as propostas sobre a reforma política, para facilitar a coleta e a eventual tramitação. Com o funcionamento normal, eu já teria essas assinaturas todas. Acredito que alcançarei este número à medida em que for encontrando pessoalmente com os colegas, mas não posso precisar ainda”, ponderou.
Segundo apurou a Jovem Pan, a proposta que barra os militares da ativa em cargos civis foi abordada na reunião de líderes que ocorreu nesta segunda-feira, 7. De acordo com relatos, o presidente da Câmara, Arthur Lira, foi “receptivo” à iniciativa e afirmou que o assunto está “na ordem do dia”. Apesar da discussão, ainda embrionária, o vice-presidente da Casa, Marcelo Ramos, avalia que a PEC não deve, ao menos por ora, prosperar. “Eu assinei a PEC, concordo com a proposta, porque não há lógica em o militar ser eleito para um cargo ou ocupar um posto no Executivo e não estar na reserva, mas não vejo, hoje, ambiente para ela prosperar. Há muitos militares dentro do governo, que tem uma maioria confortável dentro da Câmara. Não consigo ver uma PEC sendo aprovada se o governo trabalha contra”, disse.
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