População civil sofre na Palestina e vê cessar-fogo com ceticismo

  • Por Agencia EFE
  • 15/07/2014 15h04

Javier Martín.

Gaza, 15 jul (EFE).- Poucos minutos depois de o sol despontar, Nadia ++Handi++ ++Shawa++, uma mulher de 73 anos, moradora do campo de refugiados palestino de Al ++Shaty++, em Gaza, recebeu um aviso de sua vizinha: “saia da casa, os israelenses vão disparar”.

Apressada, colocou o lenço na cabeça, foi para o pátio junto de seu marido proteger seu bem mais valioso: dois cavalos que pastavam entre árvores derrubadas, lixo e móveis abandonados.

Apenas 15 minutos depois, uma forte explosão, e um míssil israelense partiu em dois um edifício de concreto em que viviam quatro famílias, a maioria idosos, mulheres e crianças.

“Por que disparam aqui? Os do Hamas estão bem escondidos sob o solo, só os civis estão acima?”, questionou a mulher, em um árabe quebrado pela excitação e pela falta de dentes.

“Sm, o dono do edifício é um funcionário do Hamas”, confirmou Rashid, um jovem de nem 20 anos. “Mas por uma pessoa todo o bairro tem que sofrer? Nós não fizemos nada, e é uma desgraça temos com viver aqui, nestas condições”, desabafou enquanto caminhava pelo edifício.

Mas não é há nada de especial neste prédio em relação a outros neste miserável campo de refugiados palestinos na beira da praia norte de Gaza. Ter eletricidade é um luxo, o lixo se acumula nas esquinas, as crianças caminham descalças e o esgoto corre sem controle pelas ruas.

“Há muitos outros edifícios destruídos aqui. Não deixaram de disparar nenhuma noite”, contou Amre, um homem que critica a imprensa, que “perverte a realidade”.

O ataque foi um dos últimos que a aviação israelense lançou sobre a Cidade de Gaza antes de aceitar a proposta de cessar-fogo dada pelo Egito, e interromper por uma semana os bombardeios contínuos e intensos sobre a Faixa.

Uma ofensiva que em termos políticos parece ter ficado novamente pelas tabelas, na qual o sofrimento foi infligido a uma população já castigada e condenada à pobreza pela prolongado cerco militar israelense, pela inoperância do Hamas, pelo radicalismo das milícias e pelos interesses estratégicos do Egito.

Em oito dias de bombardeios foram mais de 1.200 incursões e milhares de toneladas de chumbo, segundo dados do exército israelense, e mesmo assim a aviação não atingiu nenhum dos líderes das milícias, nem do Hamas nem de outros grupos radicais envolvidos no disparo de foguetes, como a “Jihad Islâmica”.

Fontes militares garantem ter destruído dezenas de plataformas de lançamento e silos de foguetes, além de túneis e o que definiram como centros de comando em casas particulares, algo impossível de comprovar no terreno, já que estão no que os moradores da Faixa chamam “a outra Gaza, a do subsolo”.

Visíveis são os quase 250 edifícios que as bombas israelenses destruíram, um mar de escombros que expõe a intimidade das famílias, e sepulta e espalha milhares de sonhos quebrados.

“Isto já se transformou em um costume. Igual o Ramadã e a festa da peregrinação todos os anos, aqui em Gaza a cada ano e meio temos uma guerra”, explicou Samer, um funcionário da polícia que hoje encarnava o ceticismo e a resignação com que a população acolheu o eventual cessação das hostilidades.

“Amanhã, caso se confirme que a calma voltou, que não haverá mais bombardeios, colocaremos o uniforme, iremos ao escritório e a vida continua, até daqui a um ano, ou talvez uns meses”, falou um resignado Samer..

Jovem, brincalhão, a solução para ele é clara: “vivemos em uma prisão, a culpa é de Israel, mas também do Egito, que nos mantém fechados. Vivemos em uma prisão. Não temos nem sequer a opção de fugir da guerra”.

“A solução é muito simples. O fim do bloqueio, as pessoas poderem entrar e sair, que haja mercadorias, trabalho, atividade, que voltemos a ter direitos”, resumiu.

Mas diz não saber como consegui-la: “a comunidade internacional nos ajuda, mas não é suficiente. É como se todos quisessem que isto continue assim”, diz. EFE

jm/cd

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