Putin quer chegar até Kiev, a Jerusalém russa, afirma comentarista político

  • Por Agencia EFE
  • 19/04/2014 15h44
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Ignacio Ortega.

Moscou, 19 abr (EFE).- O presidente da Rússia, Vladimir Putin, está convencido de que o Ocidente é frágil e por isso está disposto a levar suas tropas até Kiev, a “Jerusalém russa”, afirmou neste sábado o prestigiado comentarista político russo Yevgeny Kiselyov à Agência Efe.

“Putin quer entrar para a história como o líder que promoveu o renascimento do império russo por meio da recuperação de territórios como a Crimeia e o leste da Ucrânia. Por isso, lembrou a todos que Kiev é a mãe de todas as cidades russas”, declarou.

Jornalista mais famoso da Rússia quando Putin chegou ao poder em 2000, Kiselyov emigrou a Kiev após vários desencontros com o Kremlin.

Para ele, as negociações de Genebra “são uma desculpa para justificar a entrada das tropas russas na Ucrânia”, e Putin fará todo o possível para que as negociações não cheguem a um bom termo ao impor condições inaceitáveis para sua aplicação, fracasso do qual culpará exclusivamente o Ocidente.

“Seguidamente, os serviços secretos russos instigarão uma escalada da violência no leste da Ucrânia”, afirmou.

Da mesma forma que ocorreu na Ossétia do Sul em 2008, a Rússia vai enviar forças de pacificação e, a partir daí, ficará com o controle de todas as regiões do sul e do leste da Ucrânia até criar um corredor que ligue o território russo à região separatista de Transnístria, na Moldávia.

“Se o Ocidente não reagir, então as tropas chegarão até Kiev, a Jerusalém russa. Tudo depende dos líderes ocidentais. Putin tenta mostrar ao mundo com todas as suas forças que o Ocidente é frágil. Sequer levou a sério as sanções”, afirmou.

O comentarista reconhece que tanto as autoridades como o exército ucranianos não podem oferecer resistência à Rússia, que exerce há semanas uma grande “pressão psicológica” sobre Kiev, com dezenas de milhares de soldados e tanques na fronteira.

“O Ocidente deve tomar decisões urgentes. Deve fornecer à Ucrânia armamento e instrutores militares, e enviar forças de paz ou observadores. Não só está em jogo a integridade da Ucrânia. Quem vencer esta batalha marcará a política global”, declarou.

Kiselyov está convencido de que os principais instigadores do levante popular e do movimento separatista nas regiões do leste da Ucrânia cuja maioria da população é de origem russa, em particular a de Donetsk, são os serviços secretos russos.

“Os grupos de sabotagem que ocuparam os edifícios oficiais foram enviados por Moscou. Na realidade, os separatistas que hasteiam bandeiras russas são uma minoria, embora muito agressiva. Os protestos são produto da guerra informativa lançada por Moscou, que alegou uma suposta ameaça fascista de Kiev”, destacou.

Além disso, Kiselyov considera uma “quimera” promovida pelo Kremlin a afirmação de que há duas Ucrânias, uma ocidental, agrícola e europeísta, e outra oriental, operária e pró-russa, que não podem conviver sob um mesmo teto.

“É verdade que há diferenças religiosas, culturais e psicológicas. Mas a realidade é que, digam o que disserem, a grande maioria fala ucraniano, especialmente no campo, embora poucos sejam os que não entendem o russo. E 80% estão a favor da integridade territorial”, insistiu.

Na opinião do comentarista, a ação russa na Ucrânia é consequência de uma nova estratégia de confronto do Kremlin com o Ocidente, que resiste a aceitar a Rússia de Putin como igual entre as nações democráticas.

“Esta política é rentável, já que permitirá culpar fatores externos pelos problemas sociais e econômicos que se avizinham. E todas as previsões apontam que o crescimento econômico russo vai desacelerar, já que o modelo de desenvolvimento não funciona”, indicou.

Para começar, os recentes eventos na Crimeia – que foi anexada pela Rússia em 21 de março, depois que 97% dos eleitores de um referendo apoiaram essa opção – dispararam os índices de popularidade de Putin acima de 80%, o maior percentual em vários anos.

“Putin acredita que a guerra apaga tudo: a fuga de capitais, a queda do preço do petróleo, a recessão, a repressão política, etc”, disse.

O chefe do Kremlin afirmou que decidiu pôr fim ao “reinício” nas relações com Ocidente após o assassinato do líder líbio Muammar Kadafi em 2011, mas Kiselyov crê que tudo começou com os grandes protestos em Moscou após a fraude nas eleições parlamentares de dezembro daquele ano.

“Putin está indignado com a classe média. Melhorou suas condições de vida, lhe deu mais liberdade e esta lhe respondeu com protestos opositores. Ele considerou isso uma traição e decidiu castigá-la rompendo laços com o Ocidente”, argumentou.

Kiselyov considera que políticos como o americano Ronald Reagan e a britânica Margaret Thatcher nunca teriam permitido que o Kremlin pusesse em perigo a ordem internacional herdada após a Segunda Guerra Mundial, e lembra que o princípio do fim do império czarista começou quando a Rússia embarcou em uma guerra com o Japão (1905) e a perdeu, por isso a explosão de um conflito na Ucrânia pode custar a Putin a reeleição em 2018. EFE

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