Quando uma ministra diz que política não é para mulheres

  • Por Agencia EFE
  • 22/07/2014 10h24

Marta Miera.

Rabat, 22 jul (EFE).- Os debates políticos não são para as mulheres. A frase é de ninguém menos que a ministra da Mulher no Marrocos, Bassima Hakaui, que mais uma vez voltou a gerar controvérsia, com seus comentários, nas redes sociais.

No último 8 de julho, o presidente do governo, o islamita Abdelilá Benkirán, apresentava o balanço do Executivo perante o Parlamento. O evento era supostamente muito aguardado, mas só alcançou 5% de audiência.

“As pessoas com educação estavam na mesquita para a reza da tarawih (oração noturna durante o Ramadã) e só as mulheres e as empregadas domésticas estavam vendo TV”, declarou a ministra em uma emissora, dando a entender que mulheres só veem programas de entretenimento.

As críticas contra Hakaui nas redes não tardaram: “Você se dá conta de que já viu de tudo quando a ministra da Mulher é uma misógina”, “As mulheres marroquinas são incultas e não têm fé…”, “Dá vergonha ter uma representante dessas”, “Bassima precisava soltar uma estupidez dessas?”, “As empregadas domésticas não são mulheres?”, foram algumas delas.

Hakaui, que pertence ao islamita Partido Justiça e Desenvolvimento (PJD) que lidera o governo, concede muito poucas entrevistas e, quando o faz, costuma semear polêmica.

Passaram-se mais de dois anos, mas muitos marroquinos não esqueceram quando a recém-nomeada ministra foi contra a proibição do casamento de meninas menores. “O legislador é sensato: a lei vai no sentido de uma adaptação à sociedade, que casa as meninas pequenas”, assegurou.

Na época, a titular também não foi categoricamente contra a lei (já extinta) que permitia a um estuprador se ver livre da prisão caso se casasse com sua vítima e sugeriu ainda “tomar medidas que acompanhem o casamento da menor com seu estuprador para que não fracasse”.

As associações defensoras dos direitos das mulheres a censuram por pertencer a um partido que se mostrou em 2003 contra a reforma do Código da Família (Mudawana) e, mais recentemente, por excluí-las da redação do projeto de lei que proteja as vítimas de violência de gênero e que consideram que não responde aos padrões internacionais.

“Já na oposição havia pontos de vista que iam de encontro aos direitos das mulheres, mas agora está obrigada a aplicar os compromissos que dita a Constituição (que diz que o Estado deve trabalhar pela concretização da paridade)”, sentencia a advogada marroquina, Jadiya Rugani.

No entanto, Rugani, membro da Coalizão de Primavera para a Dignidade, que reúne 22 associações feministas e de direitos humanos, lembra que nas poucas vezes em que defendeu os direitos das mulheres, Hakaui também encontrou muita resistência com vários ministérios, especialmente o da Justiça.

A margem de manobra da ministra ficou claramente prejudicada quando o próprio Benkirán decidiu retirar-lhe a elaboração do projeto de lei ao considerá-lo progressista demais, e criar uma comissão que ele mesmo dirige, cujo trabalho parece estar temporariamente bloqueado.

O avanço dos direitos das mulheres não parece estar entre as prioridades da agenda política do presidente do Executivo, pelo contrário.

As mulheres que trabalham fora de casa abandonaram “o papel sagrado e divino com que Deus as criou e habilitou”, destacou Benkirán em junho diante do Parlamento, e acrescentou que hoje em dia “há uma modernidade que quer anular essa dimensão e fazer da mulher homem e, do homem, mulher”.

Sem esconder suas opiniões conservadoras, Benkirán reivindicou o papel das mulheres como luzes ou “lâmpadas” nas famílias e perguntou aos parlamentares: “Não sabem que quando as mulheres saíram de suas casas, as casas se apagaram?”.

As declarações também suscitaram uma grande quantidade de ataques e de brincadeiras nas redes.

Enquanto isso, Hakaui assinou um decreto para a criação de um Observatório Nacional para melhorar a imagem da mulher nos meios de comunicação e outro para a luta contra a violência de gênero.

Para Jadiya Rugani, “é uma tentativa de tapar o sol com a peneira”. EFE

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