Queda de braço entre governo e curdos marca fim da campanha na Turquia

  • Por Agencia EFE
  • 06/06/2015 15h23

Ancara, 6 jun (EFE).- A última etapa da campanha eleitoral na Turquia foi concluída neste sábado em um clima tenso, mas em paz, apesar do registro isolado de alguns incidentes, uma espécie de prévia para o pleito de amanhã, no qual se enfrentam os quatro principais partidos do país.

Quase todos os atos violentos, como o atentado perpetrado ontem em Diyarbakir, foram dirigidos contra o esquerdista e pró-curdo Partido Democrático do Povo (HDP), que desponta como o maior adversário do governante Justiça e Desenvolvimento (AKP), mesmo sendo o menor de seus rivais.

Apesar de 20 partidos terem apresentado candidatos aos 54 milhões de eleitores curdos, só quatro têm chances de entrar no parlamento. Além do HDP e o AKP, estão na disputa os sociais-democratas do Partido Republicano do Povo (CHP) – principal legenda da oposição – e os direitistas do Ação Nacionalista (MHP).

A importância do HDP é mostrada nas pesquisas, que apontam que deve superar 10% dos votos. O tamanho reduzido – almeja pouco mais de 50 cadeiras em um plenário de 550 – não impediu o grupo de protagonizar a campanha eleitoral, especialmente como vítima dos surtos de violência.

Centenas de pessoas lembravam hoje das três vítimas do mais recente e sangrento episódio, o atentado da sexta-feira, perpetrado com duas bombas em um grande comício do HDP, na cidade de Diyarbakir, reduto do movimento curdo.

O HDP se diz ameaçado pelo presidente do país, Recep Tayyip Erdogan, a quem acusou hoje de criar um clima de agressividade contra o partido em seus discursos, incitando o ataque.

“Ele nos transformou em um alvo e nos lançou em frente a uma matilha de lobos. Se é o presidente de todo um país, deve se desculpar com o povo de Diyarbakir”, afirmou o líder do HDP, Selahattin Demirtas.

Erdogan respondeu acusando o rival de ser culpado da violência política que deixou dezenas de mortos entre ativistas curdos e grupos radicais islamitas em outubro do ano passado.

Trata-se das eleições mais críticas em 13 anos, já que, pela primeira vez desde a chegada do AKP ao poder em 2002, não é certo que o partido manterá sua cômoda maioria absoluta.

Tudo depende dos resultados do HDP, que estreia como partido político nas urnas: se atingir 10% dos votos, os curdos roubarão dezenas de cadeiras tradicionalmente conquistadas pelo AKP.

Por isso, o partido foi o alvo mais frequente das críticas do primeiro-ministro, Ahmet Davutoglu, mas também de Erdogan, ativamente envolvido na campanha eleitoral com a realização de comícios diários, apesar de a lei turca estabelecer a neutralidade política do presidente.

“O incidente em Diyarbakir ontem não era contra um partido específico, mas foi um ato de provocação para ofuscar as eleições”, disse hoje Erdogan.

Enquanto isso, em Istambul, a Polícia lançou uma operação contra supostos colaboradores do Partido de Trabalhadores do Curdistão (PKK), a guerrilha curda, que terminou com 17 presos, entre eles alguns voluntários do HDP que atuariam amanhã como observadores do partido nas eleições.

A ação policial provocou reações nas redes sociais. Alguns denunciavam que o governo tenta impedir os membros do HDP de supervisionar o processo eleitoral.

A oposição expressou sua preocupação com possíveis manipulações eleitorais. Uma iniciativa cidadã, a Oy ve Ötesi, disponibilizará mais de 50 mil voluntários neutros para vigiar as urnas, além dos observadores dos partidos, delegados do parlamento Europeu e da Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa (OSCE).

A delegação da OSCE destacou na quinta-feira os “autênticos desafios” da Turquia para garantir a segurança das eleições, lembrando que em maio duas bombas explodiram em escritórios eleitorais do HDP, causando vários feridos.

Além disso, um grupo de nacionalistas tentou linchar os simpatizantes do HDP reunidos em um comício realizado em Erzurum, no nordeste da Turquia, e queimou um micro-ônibus do partido, infligindo graves queimaduras ao motorista.

O MHP, normalmente o adversário mais violento do movimento curdo, se desvinculou dessas agressões, enquanto representantes do HDP responsabilizam o governo, acusando-o de tentar provocar uma vingança por parte dos ativistas.

Um ato revanchista danificaria a imagem do HDP entre os setores turcos que começaram a simpatizar com o partido, que pode representar um obstáculo nas ambições de Erdogan de ampliar seu poder como presidente, através de uma reforma constitucional. EFE

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