Redes sociais: um espaço para encontrar a verdadeira identidade na Argentina

  • Por Agencia EFE
  • 02/10/2014 10h39

Aldana Vales.

Buenos Aires, 2 out (EFE). – Tráfico de crianças, roubo de recém-nascidos e substituições de identidade constituem a face mais obscura da adoção na Argentina, um país no qual, segundo as organizações que atuam nesta área, cerca de três milhões de pessoas desconhecem suas verdadeiras origens.

Um grande número de argentinos, com idades entre 30 e 55 anos, ficou à margem das políticas de restituição de crianças apropriadas durante a última ditadura militar (1976-1983), e acham na internet e nas redes sociais um espaço para divulgar sua história e encontrar outros na mesma situação.

Mariana Rodríguez, que começou sua busca no começo deste ano, é integrante da rede Hermanas e Madres del Alma (Irmãs e mães da alma) junto a outras mulheres de Córdoba vendidas por uma parteira e adotadas de forma ilegal.

A obstetra acusada pelo grupo era Mafalda Journade, que morreu há dois anos, mas muitas das mulheres tiveram contato com ela enquanto averiguavam de forma individual.

Sabe-se que foi funcionária em uma maternidade da província de Córdoba, e que “tinha muitos contatos” com uma organização que traficava crianças há 30 anos.

Quando Mariana começou a investigar os passos que devia dar para iniciar a busca de suas origens biológicas descobriu que sua adoção tinha sido irregular.

No Facebook encontrou a página “Hijos Biológicos Buscamos Identidad (Argentina)” (Filhos biológicos buscam identidade), um grupo que realiza a mesma tarefa em nível nacional, e por esse meio contatou o grupo de Córdoba com o qual tinha uma história em comum.

Como ela, mais de 20 jovens das Hermanas e Madres del Alma buscam informação e recebem denúncias de casos similares, além de contar com três mães que se aproximaram com a intenção de encontrar seus bebês.

“Falamos, contamos nossas histórias, nos serve muito como contenção. Não temos ressentimento. Nossa busca é para o amor e a cura interior. Não queremos judicializar nem julgar ninguém”, disse Mariana à Agência Efe.

Hermanas e Madres del Alma é apenas uma das organizações que reúne estas pessoas que veem no começo de sua vida uma grande incógnita a ser resolvida.

Na Argentina também há as redes Raíz Natal e a Asociación Quiénes somos” (Associação Quem Somos) e a página do Facebook “Identidad Sustituta” (Identidade Substituida).

Muitas das pessoas que as integram têm dados nas certidões de nascimento que foram alterados, não podem rastrear sua origem e com frequência enfrentam a recusa de estabelecimentos a mostrar algum tipo de registro, motivo pelo qual também reivindicam ao Estado uma assistência na busca.

Um projeto de lei pelo Direito à Identidade apresentado recentemente no parlamento argentino por iniciativa destas organizações propõe criar o Instituto Nacional para a Busca da Identidade de Origem e Biológica das Pessoas.

“Calcula-se que cerca de três milhões de pessoas em nosso país não conhecem sua identidade de origem ou biológica. Trata-se de vítimas de um dos crimes mais abjetos: a apropriação de menores”, sustenta o texto da iniciativa.

O projeto também propõe que o banco de dados genéticos utilizado para as análises de DNA das vítimas do terrorismo do Estado seja ampliado para estas buscas de identidade que não se amparam nas mesmas políticas das crianças apropriadas na ditadura.

O trâmite demasiadamente burocrático na Argentina provoca dificuldades e gera um processo paralelo: casais buscam crianças em um âmbito irregular já que no legal a espera é bastante longa.

A lei argentina estabelece que qualquer pessoa maior de 30 anos pode se inscrever como postulante a guarda com fins de adoção, após se munir de documentos, uma carta dirigida a um juiz para explicar as razões da decisão e uma série de atas, certificados, relatórios e antecedentes, entre outros papéis. EFE

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