Ruanda culpa colonização europeia por ódio étnico que causou o genocídio

  • Por Agencia EFE
  • 07/04/2014 15h04

Javier Marín.

Nairóbi, 7 abr (EFE).- O presidente de Ruanda, Paul Kagame, culpou nesta segunda-feira a colonização europeia pelo ódio étnico que desencadeou o episódio mais trágico da história deste pequeno país africano: o extermínio de 800 mil pessoas, um genocídio que completa hoje 20 anos.

O massacre de tutsis e hutus moderados nas mãos de hutus extremistas começou em 7 de abril de 1994 e acabou cem dias depois com um saldo de mortos equivalente então a 30% da população ruandesa.

A origem desta barbárie, segundo Kagame, remonta à colonização de franceses e belgas e à missão da Igreja Católica que os acompanhou e que instauraram, segundo sua opinião, uma organização política responsável pelo ódio étnico que culminou no genocídio.

“O legado mais devastador do controle europeu em Ruanda foi a transformação das distinções sociais. Fomos classificados de acordo com um marco inventado em outro lugar”, declarou Kagame perante milhares de cidadãos e líderes internacionais no ato de lembrança do 20º aniversário do genocídio, realizado no Amahoro Stadium de Kigali e retransmitido por um site oficial ruandês.

“Os fatos são incontestáveis”, e “nenhum país é tão poderoso para mudá-los, mesmo acreditando que é”, disse o presidente em referência à França, que cancelou na última hora sua participação nos atos depois que Kagame a acusou de ter desempenhado “um papel direto na preparação do genocídio”.

Seu discurso, pronunciado em um local que refugiou 12 mil pessoas durante o massacre de 1994, foi referendado pelo presidente de Uganda, Yoweri Museveni, que assegurou que tutsis e hutus tinham uma relação “simbiótica” antes da colonização.

“Ruanda foi uma de suas vítimas”, os europeus só trouxeram “massacres, saques e doenças”, afirmou o presidente de Uganda, que no último mês de fevereiro modificou sua legislação para poder condenar à prisão perpétua os homossexuais e proibir as minissaias.

No entanto, acima de acusações e reprovações, estavam a emoção e a lembrança das vítimas, os desejos de paz e as lições aprendidas, sentimentos que todos resumiram em duas palavras: “nunca mais”.

“Quando virem pessoas em risco e vítimas de atrocidades, não esperem instruções de longe”, advertiu a seus enviados o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, consciente do fracasso desta organização durante o genocídio.

“Muitos membros da ONU mostraram uma coragem extraordinária, mas poderíamos ter feito muito mais. Deveríamos ter feito muito mais”, admitiu Ban.

A presidente da comissão da União Africana, Nkosazana Dlamini Zuma, apontou o caminho para evitar uma tragédia similar tomando a diversidade como “força” principal do continente e não como motivo de exclusão.

No grande ato também estiveram presentes, entre outros líderes internacionais, o presidente do Quênia, Uhuru Kennyatta; o ex-primeiro-ministro britânico, Tony Blair; e o ex-presidente sul-africano, Thabo Mbeki, além de ministro que representaram vários países.

Os atos do dia começaram no início da manhã com o acendimento da Chama do Luto Nacional no Centro de Lembrança do Genocídio de Kigali, um fogo que permanecerá aceso durante os próximos cem dias, os mesmos que durou a massacre.

Para acendê-la foi utilizado outro fogo simbólico, a “chama da lembrança”, uma tocha que hoje terminou um percurso “de paz” iniciado no último dia 7 de janeiro e que foi levada por 30 povoados transportando uma mensagem de coesão.

No meio da tarde, depois da homenagem oficial realizada no estádio, uma marcha partiu da sede do Parlamento ruandês com destino a esse mesmo recinto esportivo para realizar uma vigília com canções e projeções sobre um dos episódios mais assustadores da história.

O conflito explodiu no dia 6 de abril de 1994 com o assassinato do presidente ruandês da etnia hutu Juvenal Habyarimana, embora existam indícios claros de que a situação estava se deteriorando há meses.

No dia seguinte, dez capacetes azuis belgas que protegiam a primeira-ministra ruandesa Agathe Uwilingiyimana foram assassinados junto com a dirigente, o que levou Bruxelas a ordenar a retirada de seu contingente.

O massacre que se seguiu terminaria com a vida 800 mil pessoas em pouco mais de três meses, muitas delas assassinadas a golpes de facões por milícias civis. EFE

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