Situação política na Venezuela mobiliza senadores brasileiros

  • Por Agência Senado
  • 29/07/2015 14h49
  • BlueSky
Glauciene Lara/TV Senado e TwitterMaria Machado Comitiva de senadores na Venezuela

As denúncias de violação de direitos humanos na Venezuela chamaram a atenção dos senadores brasileiros, que temeram pelo descumprimento da cláusula democrática do Mercosul pelo regime de Nicolás Maduro. Duas comitivas de senadores foram enviadas a Caracas para verificação da situação do país. A primeira delas não conseguiu cumprir seu objetivo.

Em 25 de fevereiro, foi aprovado requerimento de autoria do senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) para a criação de uma comissão externa do Senado com o objetivo “de verificar in loco a situação na Venezuela”. Na justificação do pedido (RQS 77/2015), Ferraço argumenta que a Venezuela está passando por uma grave crise social, política e econômica e, como membro do Mercosul, tem obrigação de cumprir a chamada “cláusula democrática”, prevista no Protocolo de Ushuaia, assinado pelos países do bloco em 1998.

Em 5 de maio, a requerimento do senador Romero Jucá (PMDB-RR), o Plenário aprovou um voto de censura ao governo da Venezuela, motivado pela prisão arbitrária de políticos de oposição. Jucá ressaltou a posição do Senado de defesa da democracia na América do Sul.

– Os opositores têm proteção dos países do Mercosul no que diz respeito ao exercício pleno de qualquer atividade política. Esse é um voto de repúdio pelo descumprimento da liberdade na Venezuela – declarou.

Em 7 de maio, a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) recebeu em audiência as esposas de dois líderes oposicionistas da Venezuela que se encontram presos: Mitzy Capriles Ledezma, casada com o prefeito de Caracas, Antonio Ledezma, e Lilian Tintori, esposa de Leopoldo López, prefeito de Chacao. Elas vieram ao Brasil pedir apoio para a libertação de seus maridos. Também participou da audiência a ex-deputada María Corina Machado, a mais votada nas eleições de 2010. Seu mandato cassado e ela foi impedida de concorrer às próximas eleições.

No mesmo dia, a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) ouviu o defensor do Povo da Venezuela, Tarek William Saab, que negou a prisão de lideranças políticas e sublinhou a “rigorosa democracia participativa” vigente em seu país.

“Arapuca”

Em 18 de junho, os senadores Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), Aécio Neves (PSDB-MG), José Medeiros (PPS-MT), Sérgio Petecão (PSC-AC), Ronaldo Caiado (DEM-GO) e José Agripíno (DEM-RN) foram para Caracas com o objetivo de pedir a libertação de presos políticos e a realização de eleições livres. Depois de se encontrarem com as mulheres desses políticos, os senadores saíram de ônibus rumo à prisão. O veículo foi cercado por manifestantes e os parlamentares tiveram que retornar ao Brasil sem cumprir a agenda prevista.

O presidente do Senado, Renan Calheiros, manifestou repúdio ao episódio e anunciou que cobraria uma reação altiva do governo brasileiro aos gestos de intolerância narrados pelos membros da comitiva. Para Ana Amélia (PP-RS), que apresentou moção repudiando o ocorrido, os ataques aos senadores foram, na verdade, uma agressão ao Brasil. Alvaro Dias (PSDB-PR) acusou a Venezuela de “extrapolar os limites do bom senso”.

No dia seguinte, de volta ao Plenário, Aloysio afirmou que a comitiva foi levada “para uma arapuca previamente armada”. Conforme relatou, a delegação começou a enfrentar problemas ainda no desembarque em Caracas. Depois da demora para serem liberados da aeronave, os senadores se depararam com um congestionamento “monstruoso” no deslocamento entre o aeroporto e a prisão onde Leopoldo López está há mais de um ano. A ameaça de risco físico surgiu – acrescentou Aloysio – quando manifestantes começaram a agredi-los verbalmente e a golpear o veículo que os transportava.

O senador paulista, que chamou o regime da Venezuela de ditatorial, cobrou responsabilidade do governo brasileiro pela situação de risco físico enfrentada pela comitiva. Ele informou que a oposição pedirá a expulsão da Venezuela do Mercosul por descumprimento de cláusulas democráticas previstas pelo bloco.

José Agripino avaliou que ele e os outros integrantes da comitiva foram “instrumentos de uma farsa”, Sérgio Petecão atribuiu o bloqueio de ruas e a ação de manifestantes a uma premeditação de fatos, e Cássio Cunha Lima comparou o posicionamento do Palácio do Planalto no episódio dos senadores na Venezuela com o esforço pessoal da presidente Dilma Rousseff pela libertação de um brasileiro condenado à morte na Indonésia por tráfico de drogas.

Ainda em 18 de junho, data do incidente, o Plenário do Senado aprovou a designação de uma nova comitiva para visita à Venezuela, requerida pelos senadores Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), Lindbergh Farias, Roberto Requião (PMDB-PR) e Lídice da Mata (PSB-BA). Lindbergh criticou a atuação da primeira comitiva. Ele argumentou que a Venezuela vive um momento delicado e disse que os senadores tiveram um “papel incendiário” ao fazer aliança prioritária com “os setores golpistas e mais extremados daquele país”. Convidou, no entanto, os senadores da oposição para participar da nova comitiva.

– Vamos conversar com todas as partes. O pior caminho para a Venezuela é o do enfrentamento, do acirramento da crise – avaliou.

Em 23 de junho, Aécio voltou a defender as razões da visita da comitiva da qual fez parte. Ele comemorou a definição da data das eleições parlamentares na Venezuela, marcadas para 6 de dezembro e atribuiu essa conquista ao conjunto de pressões do exterior, que mobilizou vários países e a Organização das Nações Unidas (ONU).

Por sua vez, Ronaldo Caiado ressaltou que um dos objetivos da comitiva era fiscalizar o cumprimento da cláusula democrática no âmbito do Mercosul.

– Todos esses fatos que a Anistia Internacional informa, isso aí não é cláusula de democracia. Quer dizer, tudo isso é acessório, é secundário: 43 mortos, 878 feridos, 3.351 presos? – indagou.

Segunda comitiva

Lindbergh Farias, Vanessa Grazziotin, Roberto Requião e Telmário Mota (PDT-RR) formaram a comitiva que, em 25 de junho, encontrou-se na Venezuela com grupos de apoio e de oposição ao governo de Nicolás Maduro. Os senadores se reuniram com o Comitê de Familiares das Vítimas das Guarimbas – barricadas montadas durante os protestos de 2014 -, com esposas de presos políticos e visitaram a Assembleia Nacional. Na ocasião, o presidente do Legislativo, Diosdado Cabello, afirmou haver razões para manter alguns presos políticos, mas manifestou disposição para análise de outros casos.

A comitiva também teve um encontro com o governador de Miranda, Henrique Caprilles, candidato derrotado à Presidência em 2013, que defendeu a participação do Brasil no processo eleitoral da Venezuela. Na visita, a comitiva andou com tranquilidade pelas ruas de Caracas, escoltada pelo Serviço de Inteligência venezuelano. A reunião com a ministra de Relações Exteriores, Delcy Rodrigues, encerrou a agenda da comitiva.

Em entrevista coletiva à imprensa venezuelana, Requião afirmou que o fim da violência no país é um desejo comum entre as correntes políticas.

A atuação do segundo grupo de senadores em visita à Venezuela foi alvo de críticas de Ronaldo Caiado. Ele chamou a comitiva de “bolivariana e chapa branca”. Para o parlamentar, a diferença de tratamento atesta a conivência do governo brasileiro com o regime do país Vizinho.

Relato

O relatório de Requião sobre a situação da Venezuela, apresentado em 15 de julho, provocou intenso debate no Plenário do Senado. O senador do Paraná declarou não ter encontrado dificuldade de acesso ao país vizinho, diferentemente da situação enfrentada pela comitiva anterior.

Aloysio Nunes disse que restam preocupações com a Venezuela e citou entre elas casos como o da cassação da deputada María Corina Machado. Ronaldo Caiado recebeu com estranheza o depoimento de Requião sobre a normalidade naquele país, enquanto Aécio Neves disse acreditar que o debate sobre a situação na Venezuela já é um atestado de que a circunstância não é de normalidade.

Vanessa Grazziotin defendeu a segunda comissão enviada à Venezuela, da qual fez parte. Para ela, o primeiro grupo de senadores não pediu autorização ao governo e não tinha uma agenda definida, ao contrário do segundo. Telmário Mota disse que a primeira comissão já tinha uma tendência e que, por isso, não foi bem recebida. Lindbergh Farias classificou a segunda comitiva de equilibrada, já que os senadores conversaram com opositores e governistas. Os senadores também apoiaram a formação de uma nova comitiva para acompanhamento das eleições parlamentares, marcadas para dezembro.

No relatório, Requião afirma que o problema do país vizinho é a ausência de diálogo entre as forças políticas e que esse problema deve ser resolvido após as eleições parlamentares e um possível recall em 2016. Procedimento previsto na Constituição da Venezuela, o recall pode ocorrer na metade do mandado do presidente que, no caso de Nicolas Maduro, será em 2016. Para que haja o referendo sobre a revogação do mandato do dirigente, são necessárias as assinaturas de 20% dos eleitores do país.

Fomentar o diálogo

Em 16 de julho, a CRE aprovou a proposta de Aloysio Nunes que convida Henrique Capriles para audiência pública sobre a situação política de seu país e as condições em que serão realizadas as eleições legislativas na Venezuela. A data da audiência ainda não foi anunciada.

Na justificativa do requerimento, Aloysio lembra que “as duas missões parlamentares de senadores a Caracas, realizadas em junho, reforçaram a preocupação com a estabilidade política na Venezuela e a necessidade de fomentar o diálogo”. A audiência com Capriles, em sua avaliação, poderá ajudar a aprofundar o diálogo.

 

  • BlueSky

Comentários

Conteúdo para assinantes. Assine JP Premium.