Turquia quer criar zona segura na Síria, mas sem enviar tropas terrestres

  • Por Agencia EFE
  • 27/07/2015 17h00

Ilya U. Topper.

Istambul, 27 jul (EFE).- A Turquia decidiu criar uma “área de segurança” no noroeste da Síria, agora dominada pelo grupo jihadista Estado Islâmico (EI), mas sem enviar tropas terrestres, afirmou o primeiro-ministro turco, Ahmet Davutoglu.

Esta área se estenderia ao longo da fronteira turca ao norte de Aleppo, unicamente no espaço que agora está sob o controle do EI, entre as cidades de Azaz e Yarabulus, e seria feita em estreita cooperação com os Estados Unidos, conforme anteciparam à Agência Efe fontes do governo turco, que pediram anonimato.

“Nosso objetivo é que não queremos ver o EI em nossa fronteira. Queremos substitui-lo pela oposição moderada”, afirmou Davutoglu, mas não explicou as medidas que serão tomadas.

“Se nós não enviamos tropas no terreno – e não enviaremos – é óbvio que é preciso proteger os elementos que colaboram lá conosco”, detalhou Davutoglu.

Segundo essas fontes governamentais, aviões turcos, além de americanos, ofereceriam proteção aérea para as forças da oposição síria moderada para que expulsem os jihadistas.

Também teriam um papel ativo os milicianos sírios treinados e equipados nos últimos meses na Turquia por instrutores americanos para lutar contra o Estado Islâmico.

Mas seu número é muito reduzido por enquanto, já que apenas 54 combatentes completaram o programa, assinalaram as fontes citadas.

A grande pergunta é qual dos muitos grupos armados da Síria poderia substituir o EI como força dominante nesta região, merecendo a proteção de Turquia e Estados Unidos.

Davutoglu mencionou o “Exército Livre da Síria (ELS) e outros grupos moderados”, mas as siglas do ELS, inicialmente comprometidas com uma visão laica e democrática, existem, praticamente, apenas no papel.

As fontes governamentais turcas consultadas pela Efe só excluíram, de forma taxativa, uma parceria com a Frente al Nusra, o grupo sírio ligado à Al Qaeda, por considerá-la uma organização terrorista.

Mas em relação à Ahrar al Sham, uma poderosa milícia salafista presente na região de Aleppo, cujos dirigentes vêm, em parte, da Al Qaeda, as fontes se limitaram a indicar que o grupo não figura na lista de organizações terroristas das Nações Unidas e, por isso, não pode ser descartada plenamente.

“Para a Turquia, a Ahrar al Sham, uma organização próxima da Irmandade Muçulmana, é sem dúvida a opção preferida, mas os EUA não podem aceitar essa milícia”, declarou à Efe Hefiz Abdulrahman, um analista sírio atualmente refugiado na Alemanha e cofundador da organização de direitos humanos curda Maf.

Em sua opinião, a Ahrar al Sham, apesar de se apresentar como alternativa para protagonizar a luta contra o regime sírio e o EI, “não tem um plano nacional para a Síria, mantém uma estrutura de hierarquia religiosa e segue a ideologia do califado: não é tão distinta da Frente al Nusra, nem do Estado Islâmico”.

O grupo que assumir o controle da faixa de segurança projetada por Ancara e Washington também deverá garantir a segurança da população civil, já que a Turquia prevê transformar esta área em local de refúgio para os deslocados sírios.

Inclusive, o governo turco sugere que os refugiados que atualmente estão na Turquia, cerca de 1,7 milhões de pessoas, retornem a essa faixa, mas, em nenhum caso, forçará isso, de acordo com as fontes.

O desafio, segundo essas fontes, é encontrar um grupo “comprometido com uma Síria unida, pacífica e, na medida do possível, democrática” e suficientemente forte para vencer o EI e manter a segurança do território, uma combinação que parece difícil.

Por outro lado, o governo turco não prevê que as forças aéreas do regime sírio e suas defesas antiaéreas vão intervir contra os caças turcos e americanos nesta região.

“A coalizão antijihadista efetuou voos inclusive sobre Idlib e Hama e, pelo que se sabe, não perdeu nenhum avião”, lembraram as fontes ao nomear duas grandes cidades do regime sírio.

Também reconheceram a complexidade da ofensiva militar simultânea de Ancara contra a guerrilha do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), que tem ligações muito próximas com as milícias curdas da Síria, as Unidades de Proteção do Povo Curdo (YPG), que recebem atualmente apoio dos EUA contra o Estado Islâmico.

Segundo Hefiz Abdulrahman, a campanha turca contra o EI não vem de um repentino desejo de se desfazer da milícia jihadista após dois anos compartilhando longos trechos de fronteira, mas da necessidade de conter a expansão curda na Síria rumo ao oeste.

Em meados de junho, as YPG conseguiram conquistar o terreno que separa seu reduto no nordeste sírio com o enclave de Kobani. Ancara teme que seu próximo avanço conecte esse território com o terceiro “cantão” curdo, o de Afrin, ao norte de Aleppo, criando assim um Curdistão sírio ao longo de quase toda a fronteira sul da Turquia.

A única maneira de prevenir este desenvolvimento é se antecipar a isso expulsando o EI da região e a deixando nas mãos de uma milícia que conte com o apoio de Turquia e Estados Unidos, concluiu o analista. EFE

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