Uruguaios planejam vender excremento de morcego para cultivar maconha
Marta Rodríguez Martínez.
Montevidéu, 13 nov (EFE).- O concentrado de fósforo e nitrogênio presente nos excrementos de morcego acelera a floração das plantas, uma propriedade conhecida pelos produtores de maconha e que agora um grupo uruguaio de pesquisadores estuda com o objetivo de comercializá-lo como adubo orgânico.
“Não tem nada a ver com a maconha, é fertilizante”, assegurou à Agência Efe o zoólogo Enrique González, coordenador do Programa de Pesquisa de Morcegos do Uruguai, que atualmente analisa a matéria fecal destes mamíferos, conhecida como guano, para lançá-la no mercado agrícola.
No entanto, González reconheceu que este adubo deve ter “alguma particularidade” para os produtores de maconha, que, por enquanto, lhes serviu para atrair a atenção da imprensa uruguaia em relação à sua atividade acadêmica.
Em dezembro do ano passado o Uruguai aprovou o Projeto de Lei sobre Controle e Regulação da Maconha e seus Derivados, que legalizou a produção e venda desta substância e desde agosto qualquer cidadão que deseja cultivá-la em sua casa pode comparecer a um escritório dos correios e solicitar uma licença de produtor.
Uma vez concedida, estará habilitado para cultivar livre e legalmente até seis plantas de cannabis sativa e colher até 480 gramas de maconha por ano para seu consumo pessoal.
“No início da pesquisa, pusemos na internet guano de morcego e apareceram 25 páginas, das quais 22 eram de clubes de plantadores de maconha no mundo todo”, disse o pesquisador.
“Comparado com outros adubos, ele devolve a matéria orgânica à planta e a absorção de nutrientes é feita mais lentamente, por isso que não é preciso adubar todo dia”, explicou Nacho Merlín, gerente de um “growshop” uruguaio que vende produtos para a plantação de maconha e assessora seus cultivadores.
“Estaríamos interessados em vender um adubo produzido no Uruguai, porque o que se encontra no mercado do país são produtos importados e caros”, explicou Nacho.
Radicado no Museu de História Nacional de Montevidéu e integrado na Rede Latino-Americana para a Conservação dos Morcegos, o grupo científico que González lidera trabalha para a pesquisa e conservação desta espécie animal, tão mitificada e estigmatizada pela cultura popular.
As pessoas que lutam para a proteção de aves, baleias e cervos não sofrem “o terrível problema que enfrentamos, porque nosso animal é demonizado injustamente”, criticou.
A venda do guano servirá para financiar o grupo, explicou o estudioso, que defendeu que “se desaparecessem todos os morcegos de um dia para outro, a população de insetos explodiria de tal forma que eles nos sufocariam”.
“No Uruguai vivem 23 variedades de morcegos, tanto em cidades como em zonas rurais”, disse Nacho, que pretende estabelecer algumas diretrizes responsáveis para sua exploração.
“Se um clube de maconha vai procurar guano em uma colônia, não vai voltar um ano mais tarde para ver se foi afetada pela extração, mas voltará quando ele acabar, para comprar mais”, advertiu.
A coleta deve ser executada fora do período reprodutivo, que começa em dezembro até o final de janeiro ou fevereiro, e em dias frios para que os morcegos estejam letárgicos.
Por outra parte, concretizar o aspecto legal, econômico e sanitário destes fertilizantes, antes de lançá-lo no mercado, é fundamental para este grupo de cientistas.
Assim, o uruguaio Juan Pablo Turbino, responsável da loja Yuyo Brothers, dedicada à venda de acessórios com motivos alusivos à maconha, manifestou seu interesse em comercializar este adubo, sempre e quando for convenientemente esterilizado.
O guano de morcego, ao ser armazenado em espaços úmidos e fechados, às vezes contém um fungo, cujos esporos podem causar problemas respiratórios, por isso que o grupo de González trabalha para descobrir como eliminá-lo.
Tanto Nacho como Turbino admitiram que o processo de legalização da maconha no Uruguai, impulsionado pelo presidente José Mujica como forma de luta contra o narcotráfico, gerou um aumento na demanda de insumos para sua plantação.
“As pessoas entram no mundo do cultivo com a maconha e acabam plantando em seus próprios terraços alfaces e tomates”, assegurou Nacho.
Turbino, que ainda não vende sementes em sua loja porque ainda existe “um vazio legal”, criticou que a lei do governo foi “muito mal pensada” para comercializar a maconha.
“Eu lhe vendo o guano e você faz com isto o que quiser”, lamentou González, que não quer vincular o futuro de sua produção aos imprevisíveis avanços na legalização da maconha no Uruguai. EFE
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