Vale e BHP Billiton cogitaram evacuar área de tragédia em 2012

  • Por Estadão Conteúdo
  • 22/06/2016 10h50
Resplendor (MG) - Imagem aérea mostra a a lama no Rio Doce, na cidade Resplendor ( Fred Loureiro/ Secom ES) Fred Loureiro / Secom ES Rio Doce após desastre da Samarco

Três anos antes da queda da barragem da Samarco, que deixou 18 mortos e 1 desaparecido, em Mariana-MG, as duas acionistas da mineradora, Vale e BHP Billiton, cogitaram retirar os moradores do distrito de Bento Rodrigues, destruído na tragédia. A Polícia Federal suspeita até que a mineradora tenha cogitado comprar a área.

A possibilidade de saída dos habitantes do distrito consta em um trecho do diálogo entre o diretor de Operações da Samarco, Kleber Terra, e o gerente-geral de projetos da empresa, Germano Silva Lopes, em um sistema interno de comunicação da companhia. O material foi obtido por delegados da Polícia Federal com aval da Justiça e através de buscas e apreensões nas plantas na cidade mineira e em Anchieta (ES). Os trechos constam do relatório final da PF sobre o desastre, ao qual a reportagem teve acesso.

Em 15 de agosto de 2012, Terra diz para Germano que “os acionistas querem retirar a turma de Bento de qualquer jeito”, concluindo, “vamos ter de fazer um estudo de caso bem feito. Inclusive com simulação de rompimento das estruturas atuais. Pra ver qual o real dano…”.

Em seguida, Germano diz que a operação em Fundão estava normal, “acho que a turma está superestimando os danos com as estruturas atuais”. À época, a represa já apresentava problemas com drenagem, conforme mostram os relatórios de consultores contratados. Como a reportagem mostrou, na passada terça-feira (21), os problemas chegaram a ser monitorados, incluindo trincas, havendo troca de mensagens a respeito com o ex-diretor-presidente da Samarco, Ricardo Vescovi.

Nas conversações, Germano argumenta que um estudo sobre “ruptura hipotética será necessário para subsidiar as análises/projetos ambientais”, “já conversei com o Marco Aurélio Borges (gerente de Meio Ambiente) sobre o assunto e, na minha opinião, não deveríamos incluir os estudos de ruptura hipotética na documentação que subsidiará o licenciamento ambiental. A menos que sejamos obrigados por força de lei”. Naquela altura, a empresa se preparava para a revalidação da licença de operação das estruturas que, conforme a Secretaria de Estado de Meio Ambiente informou, venceu em 22 de setembro de 2012. 

A revalidação do documento ocorreu em 29 de outubro de 2013. A Polícia Federal não detalha, no relatório final, se os documentos de ruptura foram incluídos. A reportagem também não conseguiu confirmar a informação com o governo de Minas Gerais.

A Polícia Federal suspeita ainda que a Samarco tenha cogitado comprar a área de Bento Rodrigues. Em um trecho das conversas capturadas, Vescovi diz à diretora de Geotecnia, Daviely Rodrigues, que não considera possível a “compra de todo o concentrado para manter a Samarco operando”, avaliando ser “mais fácil e rápido construir uma nova barragem do que isso acontecer. Acho que isso piora as coisas, mas não creio que haja uma classificação de prioridade pior do que a que estimamos.” Para os delegados, “concentrado” seria o próprio vilarejo vizinho. 

Vale

Acionadas, BHP Billiton e Samarco não se posicionaram sobre as investigações da PF. A Vale afirmou, em nota, que “não teve conhecimento de discussões dessa natureza no Conselho da Samarco” e que “se os acionistas soubessem de qualquer risco, certamente teriam tomado as providências necessárias para salvaguardar a integridade daquelas pessoas.”

O advogado de Vescovi, Paulo Freitas Ribeiro, disse à reportagem que “as mensagens questionadas foram pinçadas de conversas travadas, há0 anos atrás, e inseridas no relatório policial de maneira absolutamente descontextualizada e parcial”, enfatizando que, “portanto, em verdade, não conferem qualquer respaldo às conclusões delineadas.”

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