Violência e disputa diplomática marcam ambiente prévio à chegada papal
Javier Martin.
Jerusalém, 21 mai (EFE).- Atos de vandalismo de radicais judeus contra igrejas e propriedades palestinas e rumores sobre um eventual pacto entre Vaticano e Israel para ceder o Cenáculo, em disputa há duas décadas, marcam o ambiente prévio à primeira viagem do papa Francisco à Terra Santa.
A visita é marcada, além disso, pela luta protocolar entre palestinos e israelenses. O fato lotou de compromissos políticos uma viagem de apenas três dias por três estados diferentes, e gerou certo incômodo, sobretudo, entre a diplomacia eclesiástica.
O pontífice realizará uma missa no domingo na cidade cisjordaniana de Belém e, à tarde, irá a Tel Aviv (a 70 quilômetros), em Israel, para poder entrar em Jerusalém Oriental – região reivindicada pelos palestinos como capital de seu futuro estado -, apesar de apenas oito quilômetros separam a Praça da Natividade de a Igreja do Santo Sepulcro, na Cidade Antiga.
Lá, Francisco seguirá os passos de paz e concórdia que Paulo VI deixou em 1964. Ele foi o primeiro pontífice a viajar à Terra Santa desde que, no século IV, Santa Helena, mãe do imperador Constantino, estabeleceu a rota da paixão de Jesus Cristo.
Da mesma forma que o “papa peregrino”, Francisco se reunirá com o patriarca da Igreja Ortodoxa Grega, Bartolomeu I, em um encontro ecumênico que o Vaticano classifica como marco de sua viagem.
“A peregrinação do papa tem muitos aspectos. O povo espera uma declaração política, que fale do conflito, mas esse não é o objetivo principal. Seu elo é celebrar o aniversário e avançar na unidade”, explica à Agência Efe o padre Jamal Daibes, reitor do seminário latino.
Essas tensões ainda hoje são visíveis no templo que abriga o túmulo de Jesus, que ambas correntes dividem sob um rigoroso sistema de turnos e em companhia de uma família muçulmana, que faz séculos foi nomeada para evitar disputas que chegavam à violência física.
Padre Jamal e muitos outros religiosos que vivem na Terra Santa consideram que esta aproximação é, inclusive, muito mais necessária agora, à luz das pressões e da violência dos radicais judeus, em sua maioria colonos ultranacionalistas, que acham que Jerusalém deve ser exclusivamente judia.
Alguns destes grupos intensificaram, nas últimas semanas, sua campanha de assédio e provocação, com pinturas racistas em igrejas e mesquitas que levaram o Patriarca Latino, Fouad Twal, a advertir que “envenenam o ambiente prévio” à chegada do pontífice.
Uma atmosfera de turbulência que também foi envenenada pelo rumor espalhado por alguns veículos de comunicação locais de que existe um pacto secreto entre o governo israelense e a Santa Sé sobre a propriedade do disputado Cenáculo.
O local em que Santa Helena identificou como sendo o da “Última Ceia” está sobre uma sala na qual os judeus situam o túmulo do mítico Rei David. O local era usado para orações até que em 1967 quando entraram na Cidade Antiga e fizeram o controle do denominado “Muro das Lamentações”.
Guardado pelos franciscanos há décadas, mais de uma centena de ultra-ortodoxos se manifestaram na semana passada na sua porta para chorar por um acordo que as autoridades israelenses apressaram em negar, e protestar pela missa fechada que, como seus antecessores, Francisco realizará em seu interior.
“Estamos preocupados com o futuro do país porque são radicais cuja força reside na impunidade. Não tememos pela segurança do papa, mas sim por Jerusalém”, explica o padre Jamal.
O temor se une ao medo que o Patriarcado Latino tem a que Francisco caminhe por uma Cidade Antiga “fantasma” em Jerusalém, com as ruas vazias e os fiéis bloqueados extramuros, devido ao toque de recolher que acreditam que o exército israelense decretará.
“Jerusalém é uma cidade cada vez menos acessível para os cristãos”, denúncia, por sua vez, Hindi al-Jury, advogada e ex- ministra palestina.
“Pedimos ao papa que reze para que Jerusalém seja a cidade da paz, uma cidade inclusiva e não só judia, e que encoraje à igreja a trabalhar contra a injustiça” e em favor do diálogo inter-religioso, acrescenta.
Transmitir um apelo de conciliação no meio da violência radical e as chamadas de alguns políticos israelenses à anexação frente ao diálogo com os palestinos, e à exigência que estes reconheçam a natureza judia do Estado de Israel, algo ao que, inclusive, os judeus laicos se opõem: são esses, segundo a Igreja, os outros pilares da primeira viagem do pontífice à Terra Santa, a aonde chegará acompanhado de um rabino e um muçulmano argentinos.
“Como homem de religião, o papa se preocupa com os seres humanos. Ele vai fazer, como sempre, uma grande defesa de todos os que sofrem, incluindo os palestinos”, conclui o antigo Patriarca Latino, Michel Sabbah. EFE
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