Voto dos “indignados” de 2013 não bastou para Marina Silva
Manuel Pérez Bella.
Rio de Janeiro, 5 out (EFE).- Os “indignados” que protestaram com virulência em junho de 2013 em todo Brasil ficaram de fora da disputa pela presidência nas eleições deste domingo junto com Marina Silva, segundo alguns analistas, porque o pouco peso deste setor foi insuficiente para levar a ecologista ao segundo turno após muito desgaste na reta final da campanha.
A candidata do PSB pôde ser considerada um fenômeno eleitoral após a morte do então cabeça de chapa Eduardo Campos, e chegou a liderar as pesquisas de intenções de voto há pouco mais de um mês, mas terminou em um fraco terceiro lugar, com 21,14% dos votos válidos, percentual parecido aos 19,33% que recebeu há quatro anos, quando foi candidata pelo Partido Verde.
A presidente Dilma Rousseff (PT), com 41,46% dos votos, e Aécio Neves (PSDB), que teve 33,7%, disputarão a presidência no segundo turno que acontece no próximo dia 26, e se dedicarão agora a tentar atrair os eleitores de Marina.
Segundo analistas, Marina aglutinou a grande maioria dos eleitores que participaram dos protestos que sacudiram o país ano passado, mas não conseguiu fazer o mesmo nas favelas e nas regiões mais pobres do Brasil, que se mantiveram fieis a Dilma.
Sua oposição aos casamentos entre pessoas do mesmo sexo também diminuiu o apoio entre homossexuais e setores mais progressistas.
Na reta final da campanha Marina não soube ganhar os indecisos e perdeu fôlego em meio ao fogo cruzado de ataques de seus rivais, que possuem uma máquina eleitoral muito maior e mais azeitada que a do PSB.
A ecologista foi escolhida candidata em meados de agosto, após a morte de Eduardo Campos, que não havia conseguido até então decolar nas pesquisas e que não chegou a participar da campanha no horário eleitoral gratuito de rádio e televisão.
Durante a temporária liderança nas pesquisas pesou o apelo que tem entre os estudantes, que se deve ao vigor com que defende o meio ambiente, e em parte pelo apoio do eleitorado de classe média-alta, que terminou migrando para Aécio.
Estes foram exatamente os grupos que em sua maioria saíram à rua em massa em junho do ano passado em dezenas de cidades de todo Brasil, em um movimento que começou questionando o aumento da tarifa do transporte público no estado de São Paulo e se pulverizou para todo o país com as mais diferentes reivindicações.
O professor de Ciências Políticas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Manuel Sanches calcula que 80% dos cidadãos que participaram das manifestações votaram em Marina.
“Marina foi a maior beneficiada pelas manifestações, primeiro porque é a que mais soube explorar essa insatisfação desde seu início, porque percebeu a questão da precariedade dos serviços sociais”, explicou Sanches à Agência Efe.
Mas o peso relativo dos “indignados” foi pequeno, porque os que saíram às ruas são “um percentual muito pequeno” do eleitorado, avaliou Sanches.
“A população da favela não estava na manifestação, os ricos que vivem em Ipanema também não. Os que trabalham no centro das grandes cidades sim”, segundo o analista político.
Em São Paulo, por exemplo, calcula-se que cerca de um milhão e meio de pessoas participaram das manifestações, dentro de uma população que chega a quase 20 milhões na zona metropolitana da maior cidade brasileira.
O grosso do eleitorado, pobre ou de classe média-baixa, não participou maciçamente dos protestos.
O 59,7% da população brasileira, segundo dados da Pnad, faz parte de um emergente grupo que ganha até dois salários mínimos, em uma ascensão promovida pelos programas sociais desenvolvidos pelo governo Lula e seguido por Dilma Roussef.
Segundo um das últimas pesquisas do instituto Datafolha antes das eleições, 49% dos eleitores mais pobres pretendia votar na atual presidente, e apenas 21% preferiam Marina.
Nas últimas semanas Marina tentou se identificar com a população mais carente através de um discurso carregado de apelos emocionais que se aproveitavam do sofrimento que viveu durante a infância e a adolescência na miserável aldeia amazônica onde nasceu.
Esse esforço foi estéril, sua mensagem não comoveu os pobres e seu apoio desabou paulatina e constantemente.
Parte de sua queda nas pesquisas pode ser atribuída a dura campanha de desconstrução realizada por Dilma e Aécio. Ambos, com muito mais tempo de propaganda na televisão, construído pelo tamanho das coalizões que os sustentam, investiram tempo em enfraquecer a candidata.
O efeito da propaganda adversária, “infestada de calúnias”, acusou Marina, teve um grande efeito especialmente entre as classes mais baixas, eleitorado sem formação política, baixa educação e que é mais volúvel.
Segundo Sanches, “50% do eleitorado é composta de analfabetos funcionais”, o que significa que não são capazes de entender ou analisar o discurso dos candidatos, o que os torna mais suscetíveis a mudanças de opinião.
A avalanche de propaganda negativa minguou apoios à ecologista e influenciou os indecisos, que, de acordo com os resultados oficiais, optaram no primeiro turno por Aécio Neves. EFE
Comentários
Conteúdo para assinantes. Assine JP Premium.