Yellen versus Lagarde: o debate pelo aumento dos juros nos EUA
Alfonso Fernández.
Washington, 21 jun (EFE).- Embora apenas poucas ruas separem as sedes do Federal Reserve (Fed, banco central americano) e do Fundo Monetário Internacional (FMI) em Washington, a visão sobre o curso adequado do ajuste monetário nos Estados Unidos confrontou suas duas chefes: Janet Yellen e Christine Lagarde, respectivamente.
“Acreditamos que um aumento das taxas de juros seria mais apropriado em 2016”, comentou Lagarde no último dia 4 de junho em entrevista coletiva em Washington, onde foi apresentado o relatório anual do FMI sobre a economia americana.
Além disso, ela ressaltou que embora o FMI ainda considere que “os fundamentos (nos EUA) para uma expansão contínua estejam presentes, a taxa de inflação não está progredindo em um ritmo que garantiria, sem riscos, um aumento nos juros nos próximos meses”.
O comentário de Lagarde surpreendeu a todos pela contundência, já que habitualmente a instituição que dirige se esquiva do confronto, especialmente ao avaliar as decisões do todo-poderoso banco central americano.
Fontes do FMI destacaram, além disso, o “impacto” sobre os mercados internacionais deste aumento dos juros nos EUA, o primeiro em quase uma década, ao advertir que alimentaria a volatilidade financeira global.
Por sua vez e poucos dias antes, Yellen, em discurso no estado de Rhode Island, tinha indicado que “considerava apropriado em algum momento deste ano dar o passo inicial de elevar as taxas de juros de referência e começar o processo de normalização da política monetária nos EUA”.
O Fed manteve as taxas de juros “em níveis excepcionalmente baixos”, entre 0% e 0,25%, desde o final de 2008, como parte do programa de estímulo monetário para ajudar a economia a superar a crise após a explosão da bolha financeira e imobiliária, uma política aplaudida pelo FMI.
Nos últimos meses, no entanto, agitou-se o debate sobre a data apropriada para o início do encarecimento do preço do dinheiro nos EUA, e o recente cruzamento de declarações entre Yellen e Lagarde, que em ambos os casos são as primeiras mulheres à frente de suas respectivas instituições, foi o ponto máximo.
Yellen, em sua entrevista coletiva na última quarta-feira, após a reunião do Comitê Federal de Mercado Aberto do Fed sobre política monetária – na qual foi decidida a permanência das taxas de juros em seu nível atual -, respondeu às perguntas sobre a recomendação do FMI.
“Às vezes se presta muita atenção no momento concreto do primeiro aumento. O que deveria importar aos mercados é a trajetória completa das decisões”, afirmou com delicadeza a presidente do Fed, que evitou criticar diretamente a instituição financeira internacional.
De fato, Yellen tentou estender pontes com relação ao FMI, ao comentar que as duas instituições estão “de acordo que as decisões (de política monetária) deveriam ser avaliadas dependendo dos dados”.
No entanto, ela ressaltou que, em relação ao contágio internacional, o Fed “não pode prometer que não haverá volatilidade quando decidir subir as taxas”.
“O que podemos fazer é comunicar claramente nossas políticas para evitar mal entendidos desnecessários que possam criar volatilidade no mercado e potenciais efeitos nos mercados emergentes. Estive tentando fazer o melhor possível para cumprir essa promessa”, salientou Yellen.
Os analistas financeiros não esconderam seu assombro por este inesperado cruzamento de palavras entre as chefes do Fed e do FMI.
Neste sentido, Mohamed A. El-Erian, o ex-diretor-executivo da gerente de fundos Pimco, qualificou de “incomum” a declaração do FMI, já que a instituição tinha precisamente feito do momento da primeira alta de juros nos EUA “uma preocupação central”.
“Deste modo, (o Fundo) contribuiu involuntariamente para aumentar a volatilidade nos mercados”, ressaltou El-Erian em entrevista à emissora “CNBC” ao analisar as palavras de Lagarde.
Apesar da disparidade de opiniões entre duas das mulheres mais poderosas do mundo, o curso parece claro, e os analistas consideram como data mais provável para este primeiro aumento dos juros nos EUA a reunião de meados de setembro do banco central americano.
Ou, em outras palavras, a ocasião em que Yellen imporá sua vontade sobre a de Lagarde. EFE
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