Ainda a tese de novas eleições: um encontro certo com uma crise ainda pior
Editorial publicado pela Folha neste domingo esquentou o debate sobre a possibilidade de o país realizar novas eleições como resposta à crise política que aí está. O jornal defende que tanto a presidente Dilma Rousseff (PT) como Michel Temer (PMDB), o vice, renunciem. Então vamos ver. Já disse que sou contrário a essa tese. Volto ao tema.
Segundo o Artigo 81 da Constituição, se presidente e vice deixarem suas respectivas funções antes de dois anos do mandato em curso, realizam-se novas eleições diretas em 90 dias; se a dupla ocorrência se der nos dois anos finais, então o Congresso procede à eleição indireta. Em qualquer dos casos, cumpre-se o tempo do mandato em tela. O que temos se esgota em 31 de dezembro de 2018 — e, em outubro de tal ano, há eleições diretas, conforme o calendário.
Renúncia é ato volitivo e unilateral, como sabemos. Fui o primeiro, acho, na grande imprensa a sugerir a Dilma que renunciasse. Para o seu bem? Não! Para o do Brasil. Acho que ela cometeu crime de responsabilidade e que tem de cair.
Não vejo razão para Temer fazer a mesma coisa. Por enquanto, contra ele, não há nenhuma evidência que pare de pé. Sugerir a ambos a renúncia corresponde a igualar coisas desiguais. Ademais, não vejo como estaria aí a solução da crise política. Haveria é o seu agravamento. E de vários modos.
Em primeiro lugar, as eleições seriam feitas num período de grande descrédito da política, o que abre potencialmente a porta a aventureiros. “Ora, Reinaldo, sempre os haverá; a democracia não pode temê-los; tem de enfrentá-los.” Concordo. Mas que se o faça no tempo agendado.
Em segundo lugar, o Congresso não poderia ser cassado. Seguiria sendo o que está aí, já que as novas eleições só incluiriam presidente e vice. Ora, a chance de um Parlamento hostil a um governante “que pretende mudar tudo” é gigantesca. Não é um bom caminho para sair da crise. Insisto: a pessoa eleita o seria necessariamente contra o Poder Legislativo. É o caminho certo do desastre.
Mais: dada a legislação em vigor, o (a) presidente que se eleger agora terá o direito à reeleição. Vocês acham mesmo que é uma boa ideia escolher diretamente um presidente que tem a chance de mais um mandato? Alguma hipótese de ele procurar fazer a coisa certa, em vez de pensar na própria reeleição? Sinceramente, não vejo nenhuma.
Sim, acho que Dilma deveria renunciar, o que ela voltou a dizer que não fará, em resposta ao editorial da Folha. É uma pena para o Brasil! Não acredito que chegue ao fim do mandato. A crise só vai fazer se agravar.
Em seu editorial, a Folha lembra que o petismo segue tendo uma forte penetração na sociedade, como a sugerir que o impeachment conduziria à instabilidade. Ora, não podemos correr o risco de confundir milícias dispostas a encabrestar a democracia com forças populares. Até porque as pesquisas revelam que a esmagadora maioria da população quer mesmo é o impeachment.
O fato de o PT ter mobilizado as suas franjas e sua tropa de choque para fazer ameaças não deve ser confundido com ato corriqueiro nas democracias. O partido está a chamar de “golpe” uma saída constitucional e legal, ritualizada pelo Supremo. E essa retórica, sim, é coisa típica de golpistas.
Caso haja alguma prova contra o vice ou caso a chapa seja cassada no Tribunal Superior Eleitoral, que então se proceda ao que prevê o Artigo 81: eleições diretas ou indiretas a depender do tempo.
O que não faz sentido é correr o risco de expor o país a chicaneiros ainda piores dos que os que aí estão quando as instituições apontam a saída calma e pacífica, como apontaram em 1992, no impeachment de Collor.
De resto, à diferença do que afirmava um texto que li dia desses, se Michel Temer for presidente, ele não estará exercendo uma mandato que lhe terá sido conferido indiretamente. Cumpre não esquecer: Temer também foi eleito. Quem não foi eleito para coisa nenhuma é Lula, que, não obstante, se comporta como presidente da República.
Isso, sim, é golpe!
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