Banco Central perde o senso do ridículo; veja por quê
Reinaldo, por que você diz que o Banco Central, depois de perder a independência, perdeu também o senso de ridículo?
Vou explicar. Há coisas contra as quais a gente sente vergonha até de escrever. É como se elas nos contaminassem com a sua estupidez, com a sua burrice, com a sua jequice. Mas não podemos abrir mão de fazê-lo, sob pena de os idiotas avançarem um pouco mais. Assim é com o caso da queixa-crime movida pelo Banco Central contra o economista Alexandre Schwartsman.
Qual é, afinal, seu crime? Ele discorda das decisões do BC, da forma como é conduzida a política monetária e das escolhas feitas pela equipe econômica do governo Dilma. “Ora, Reinaldo ― poderiam dizer os leitores ―, todo mundo sabe que isso é proibido na Coreia do Norte, em Cuba e na China!” É verdade. Ocorre que a Constituição da República Federativa do Brasil assegura a liberdade de expressão em dois artigos: no 5º e no 220. Só veda o anonimato. E, como é sabido, se há coisa que Schwartsman jamais evita é assinar embaixo das ideias que defende.
Em uma das entrevistas que concedeu, o economista, que já foi diretor da instituição, afirmou que “o BC é subserviente e submete-se às decisões do Planalto”; em outra, que “faz um trabalho porco e, com isso, a incerteza aumentou”. Não é que o procurador-geral do banco, Isaac Sidney Ferreira, se zangou? Decidiu entrar com uma queixa-crime, já rejeitada pela Justiça, porque, segundo diz, houve “difamação”. É, para usar uma palavra a que recorro com frequência, estupefaciente.
Ferreira não se conformou com a decisão da Justiça, que recusou a queixa, e promete recorrer. Nesta segunda, alguns dos mais importantes economistas do país assinaram um manifesto contra a tentativa de intimidação. Pois é. Fico cá a imaginar o Fed, nos EUA, tentando processar um analista porque discordou de sua decisão. Imaginem se George W. Bush fosse incomodar a Justiça a cada vez que Paul Krugman o chamou não de incompetente, mas de idiota mesmo. É claro que Ferreira jamais se veria como procurador-geral do Fed, mas certamente se sentiria à vontade como burocrata do BC de Cuba ou da Coreia do Norte.
A ação é de tal sorte ridícula que não vai dar em nada. Mas dá conta da cabeça dessa gente, do estado geral do governo Dilma e do que lhe vai no fundo da consciência. O partido do poder, como vocês devem se lembrar, já fez uma lista negra de nove jornalistas, críticos e comunicadores ― da qual, com muita honra, faço parte ― e já recorreu à Justiça eleitoral para cassar da Internet textos de uma consultoria sobre eventuais malefícios no caso da reeleição de Dilma. Lula pediu pessoalmente, e obteve, a cabeça de quatro funcionários do Santander que enviaram a um grupo de clientes uma análise prevendo solavancos caso a governanta ganhe mais quatro anos.
No arremate, devemos nos lembrar de que o PT ainda não abriu mão de controlar os meios de comunicação. A pregação está em todos os documentos oficiais do partido. Caso eles cheguem lá, o tal Isaac Sidney Ferreira pode se candidatar ao cargo de censor. Deve ser duro não ter sido contemplado pelo destino com o senso de ridículo.
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