Cardozo acha “golpe” depor Dilma, mas quer depor Nardes
Volto ao caso do TCU, que manteve o julgamento das contas da presidente Dilma para esta quarta-feira.
Então ficamos assim. O PT e o governo chamam “golpe” uma mobilização da sociedade em favor do impeachment da presidente, que se dá nos limites da Constituição e das leis. E o que fez ela? Bem, seu governo fraudou a contabilidade pública porque a candidata Dilma não podia assumir os descalabros da presidente Dilma.
Para tentar obter um segundo mandato, ela teve de optar pelo mais descarado estelionato, que não se resumiu a fazer promessas ao léu. Não! Ela anunciou, de forma deliberada, o que sabia que não poderia entregar em razão do rombo das contas públicas, rombo este que era parte da própria equação fraudulenta.
Muito bem! Em razão dessas e de outras falhas, o que inclui o cleptocracia que se apoderou da Petrobras e sabe-se lá do que mais, milhões foram às ruas pedir o que os decentes costumam cobrar em casos assim: a saída do mandatário. O PT e o governo, a começar do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, acusam, então, o golpismo.
Ora, esse mesmo Cardozo veio a público nesta segunda para, vejam que coisa!, estranhar a reação indignada de vários setores da sociedade à ação do governo contra o TCU. Segundo o ministro, o Planalto querer tirar Augusto Nardes da relatoria é apenas o exercício de um direito. E, com a retórica dos santarrões indignados, ele exclama: “É inacreditável que alguém pense que o exercício do direito é uma afronta!”.
Opa! Vejam quem fala! O sujeito que chama “golpe” a aplicação da Constituição e da Lei 1.079 agora vem falar em “exercício do direito”?! Pois é… Nós sabemos o que fez Dilma, não é? O Brasil sabe. Sabe, e 70% dos brasileiros a querem fora do palácio. Mas que diabos, afinal de contas, segundo o governo, fez Augusto Nardes, o relator das contas do governo no TCU, para abandonar o posto, conforme quer o Planalto?
Com a sua incrível capacidade de se indignar com a democracia, disse Cardozo: “A oposição chegou a dizer que está marcando homem a homem os ministros do TCU. Parece que transformou um julgamento técnico numa disputa de campeonato. E é uma disputa mesmo”.
É uma fala politicamente delinquente. Em primeiro lugar, nos marcos da democracia e do debate público, a oposição pode e deve fazer a marcação homem a homem que quiser. O que é inaceitável é que veículos de comunicação financiados por estatais ataquem ministros do Supremo, nomes da oposição, a imprensa independente e o próprio TCU. Entrem na Internet agora e vocês encontrarão logotipos de empresas públicas, controladas pelo governo federal, atacando, entre outros, o Tribunal de Constas da União. Logotipos atacando? Sim, as páginas que eles patrocinam. Aquilo é dinheiro público. Essa é a democracia desavergonhada de Cardozo?
Ora, Cardozo!!! Como esquecer que quatro ministros do TCU passaram a ser alvos de denúncias sistemáticas justamente nestes dias que antecedem o julgamento? Eis o ministro da Justiça! Um de seus papéis seria atuar para jogar água fria na fervura. Mas essa gente perdeu a capacidade de governar faz tempo.
No Senado, foi a vez de outro patriota do PT se manifestar. O líder do partido na Casa, Humberto Costa (PE), também defendeu o impedimento de Nardes: “Ele deveria se declarar suspeito. Em dissonância com a própria legislação que rege a magistratura, ele assumiu um papel político nesse processo. Ele declarou antecipadamente o seu voto, inclusive pela imprensa. Fez ações políticas junto a diversos segmentos no sentido de pressionar a Casa para se alinhar ao parecer que vai apresentar e que ele já disse que é pela rejeição das contas”.
É uma falácia daquelas de que só os petistas são capazes. Que o relatório de Nardes era contrário ao governo, isso estava dado pela própria natureza do processo. Só por isso o governo foi instado pelo tribunal a dar explicações — que, como sabemos, não convenceram ninguém até porque o argumento central do Planalto, apresentado pela Advocacia-Geral da União, foi só a admissão de culpa, mas tentando justificar que outros governos cometeram crimes antes deste.
A senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), com o despudor de quem foi flagrada nas malhas do petrolão e só não é investigada no escândalo principal por vicissitudes processuais, chamou o ministro de golpista: “É uma postura, no meu entender, golpista, somando-se aos esforços de grupos e partidos que militam pelo afastamento da presidenta da República, inconformados com sua vitória legítima nas últimas eleições”. E prosseguiu: “Só há um lugar na história para o ex-deputado Augusto Nardes: ao lado de golpistas que conspiram contra a democracia. Menos, ex-deputado Nardes, menos entrevistas e mais responsabilidade”. É a isso que Gleisi chama “responsabilidade”.
Aliás, à medida que o tempo passou, as coisas só pioraram para o Planalto. O próprio governo atuou para adiar o julgamento. Chegou a ter alguns votos no TCU. Hoje, corre o risco de perder por nove a zero. Até porque o ministro que decidir votar em favor de Dilma se tornará, vamos ser claros, imediatamente suspeito de atuar contra a independência do tribunal. E isso só acontece, ou aconteceria, porque os sábios do PT resolveram pôr uma canga no tribunal.
Não há reforma ministerial que consiga dar conta de tanta arrogância e de tanta estupidez.
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