Respeito ao ‘direito à desconexão’ dos trabalhadores contribui para a satisfação e produtividade
Apesar de ainda não ser formalmente definido por lei, o direito à desconexão se apoia em fundamentos doutrinários e jurisprudenciais no contexto jurídico brasileiro
O cenário das relações de trabalho está em constante transformação, moldado pelos avanços tecnológicos, o que influencia significativamente as abordagens adotadas para a realização das atividades profissionais e tem um grande impacto na vida da sociedade. As tecnologias ligadas à comunicação são evidentes aliadas na realização da maior parte dos trabalhos, contudo, a instantaneidade dessa comunicação constante dificulta a demarcação clara entre as esferas profissional e pessoal. As crescentes complexidades em distinguir esses contextos, resultam em prejuízo ao direito à desconexão dos trabalhadores. Apesar de ainda não ser formalmente definido por lei, o direito à desconexão se apoia em fundamentos doutrinários e jurisprudenciais no contexto jurídico brasileiro. Sua essência está centrada no direito ao “não trabalho” ou ao descanso e pode ser inserido no contexto das garantias fundamentais relacionadas à saúde e ao lazer, é uma decorrência direta do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, como previsto na Constituição Federal de 1988.
Paralelamente, em consonância com os princípios ESG (Ambiental, Social e Governança), o aspecto social abrange a responsabilidade das empresas perante a comunidade, destacando a conexão entre o meio ambiente do trabalho, o “S” do ESG (Social) e o direito à desconexão e demandam que as empresas estabeleçam políticas e práticas que promovam uma cultura de respeito aos limites entre trabalho e vida pessoal. Isso inclui políticas claras de horário de trabalho, períodos de descanso e férias regulares, bem como a conscientização dos gestores e colegas sobre a importância do respeito ao direito à desconexão. O descumprimento dessas práticas, muitas vezes reconhecido pelo Poder Judiciário como violação de direitos, acarreta penalizações individuais e coletivas. A responsabilidade corporativa vai além do atendimento mínimo das normas trabalhistas, abrangendo aspectos como direitos trabalhistas, igualdade de oportunidades, saúde e segurança ocupacional.
Atualmente, a antiquada ideia de que o tempo à disposição do empregador se restringe ao sobreaviso, onde o empregado espera em casa por uma convocação urgente, já é coisa do passado. A jurisprudência atual reconhece que a subordinação ao empregador transcende o mero aguardo, sendo manifesta através de câmeras, sistemas de logon e logoff, computadores, relatórios, além de chamadas por celulares, rádios ou mensagens. Este entendimento é solidificado pela Súmula 482 do TST. Vale destacar que o direito à desconexão não implica em uma proibição total de comunicação ou trabalho remoto fora do horário padrão de expediente. Na realidade, a legislação já aborda a regulamentação desses contatos. A Lei nº 14.442/2022, por exemplo, abre espaço para acordos individuais entre empregado e empregador, estabelecendo horários e meios de comunicação, desde que respeitados os períodos de descanso legalmente estabelecidos. Isso sinaliza que há espaço para flexibilidade em circunstâncias específicas.
O desafio reside no excesso e na ausência de limites claros e tangíveis. Com o acesso constante à internet, smartphones e demais ferramentas digitais, muitos profissionais enfrentam a crescente pressão de estarem disponíveis e responderem mensagens profissionais fora do expediente tradicional. Esse cenário turva a linha entre trabalho e vida pessoal, resultando em estresse, exaustão e impactos negativos na saúde mental, a exemplo da Síndrome de Burnout, reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como uma doença intrinsecamente relacionada ao trabalho.
Em um contexto mais amplo, proteger o tempo livre de qualidade do trabalhador visa assegurar um ambiente de trabalho saudável que atenda aos padrões nacionais e internacionais. O cumprimento dessas práticas não é apenas uma obrigação ética, mas uma forma de manter um ambiente de trabalho equilibrado que contribua para a satisfação e produtividade dos trabalhadores. Nesse contexto, a importância de um ambiente de trabalho saudável ganha destaque como um alicerce fundamental para o bem-estar individual e coletivo. A busca por equilíbrio entre as responsabilidades profissionais e a esfera pessoal não é apenas uma aspiração; é uma necessidade que, quando atendida, reverbera positivamente na qualidade de vida, na saúde mental, no desfrute do lazer e na construção de relações familiares e sociais sólidas.
*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.
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