Conjuntura política e taxa de câmbio mostram que vivemos a crise da crise

A falta de organização dos governantes diante do quadro atual não só piora o processo pandêmico, como também afeta ainda mais a percepção da conjuntura da economia

  • Por Fernanda Consorte
  • 30/03/2021 13h13
FÁTIMA MEIRA/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO Entrada do Brasil na OCDE foi alinhado com o governo Donald Trump Troca nos ministérios afeta diretamente a economia, que já está tão prejudicada por causa da pandemia

A que ponto chegamos? Após recordes de mortes diárias e colapso no sistema de saúde, nosso presidente da República resolve criar um comitê de crise do coronavírus. Se não fosse trágico, seria risível, dada a demora. Pensei em vários memes ao ler essa notícia nos veículos de mídia na semana passada, mas acho que a situação corrente não está mais para brincadeiras. Após este cenário estar claro nos preços dos ativos (vejam o patamar da taxa de câmbio, por exemplo), parece que Brasília se incomodou com a carta de banqueiros, empresários e economistas sobre a falta de coordenação com o tema da crise sanitária, que se estende à economia já fragilizada do país. O Congresso, mais especificamente a Câmara dos Deputados, acendeu uma luz amarela (que a meu ver já passou da vermelha há algum tempo) para a situação calamitosa que está nosso país. 

Em uma semana, como espectadora desse prenúncio de furdunço, percebo o Centrão ganhando mais protagonismo contra o governo. Ora, vamos deixar claro que mais do que inexplicável a demora da votação do Orçamento para 2021 (o primeiro trimestre do ano terminou e ainda não temos o orçamento fechado desse ano! Não sei para vocês, mas isso realmente me choca), o que passou no Congresso é inexequível, dada a subestimação e cortes de despesas obrigatórias por parte dos parlamentares. Assim, ou a equipe econômica de Paulo Guedes terá que contar com o próprio Congresso para reduzir o espaço das emendas de parlamentares, ou fará alguma emenda que permita furar o teto de gastos – ambas as saídas são escandalosas para o governo, sobretudo em preços de mercado, deixando o governo à mercê do Centrão.  

Ainda nessa novela, havia uma clara preocupação com o trabalho do até então ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, por parte dos empresários brasileiros. Ao que consta, o ministro estaria dificultando as relações com China e Índia, países justamente fornecedores de insumos de vacinas contra a Covid-19. O Congresso (o Centrão) se juntou a essa preocupação, causando um pedido de demissão do ministro nesta segunda-feira, 29. Mais um enfraquecimento do governo e fortalecimento do Centrão, embora há quem diga que esse movimento possa ajudar os preços, e sim, a cada anúncio desse vemos alguma melhora em indicadores de mercado. Importante lembrar que o Centrão não padece de ideologias claras e que nem sempre ajuda o interesse maior. Na verdade, o interesse maior reside em seu próprio interesse, que hoje coincidiu, mas amanhã não sabemos.  

Minha visão é que, no final, perdermos todos, sobretudo os acometidos pela pandemia, claro. A falta de organização dos governantes diante do quadro atual não só piora o processo pandêmico, como também afeta ainda mais a percepção da conjuntura da economia. Resultado? Preços de mercado em patamares pressionados. Vejam a taxa de câmbio, que sempre repito que se trata de uma medida de risco para o país: desde o início desse furdunço está mais para R$ 5,80. Pois é, vivemos a crise da crise.

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