Varejo explode, mas outros serviços seguem contidos: O que isso significa?

Crescimento de 5,5% em relação a julho de 2019 é uma grata surpresa; aparentemente, junto com a flexibilização da quarentena, veio um ímpeto consumidor que realmente pulou aos olhos

  • Por Fernanda Consorte
  • 15/09/2020 07h00
CESAR CONVENTI/FOTOARENA/ESTADÃO CONTEÚDO Vendas do comércio varejista nacional cresceram 5,2% em relação a junho deste ano

Na última semana, a pesquisa do IBGE sobre vendas no varejo referente a julho mostrou uma explosão de crescimento: 5,5% em relação a julho do ano anterior, já passando o nível pré-Covid-19. Uma grata surpresa, diante da paralisia que vimos ao longo do segundo trimestre. Aparentemente, junto com a flexibilização da quarentena, veio um ímpeto consumidor que realmente pulou aos olhos. Já o indicador de serviços, calculado também pelo IBGE, mostrou crescimento mais tímido no mês, se mostra bem aquém do nível pré-Covid-19 e ainda aponta queda de 12% em relação ao ano passado. A primeira pergunta que me veio à cabeça foi: mas venda no varejo não é um serviço? Sim, é.

Na metodologia das contas nacionais, serviços correspondem a 70% do PIB, e comércio, um subgrupo de serviços, representa 18,5% de serviços (ou somente 13% do PIB total). Vendas no varejo representam uma parte importante do PIB brasileiro, mas não é tudo. Olhando a pesquisa de serviços, quase todos os tipos ainda estão em um patamar tímido. É verdade que estão em rota de recuperação, mas de forma mais contida do que vimos no resultado das vendas no varejo. A exceção se dá em “outros serviços” — onde suponho que esteja comércio varejista nesta pesquisa.

O resumo disso tudo fica no indicador calculado pelo BCB, o IBC-Br, que serve como uma prévia mensal do PIB: houve melhoria econômica no terceiro trimestre de 2020, contudo, não estamos nem perto no nível de atividade econômica que estávamos em fevereiro, por exemplo, quando a pandemia atingiu o Brasil. O desempenho das vendas varejistas, por ora, não é um retrato da economia brasileira. Acredito que esse movimento, na verdade, está muito mais ligado ao plano de incentivo fiscal do governo, o auxílio emergencial, do que a uma melhoria estrutural da economia. Me baseio nisso porque os dados de emprego seguem mostrando um cenário pouco atrativo para consumo, e sempre disse em meus artigos que amparo fiscal funciona, é dinheiro “na veia” da economia.

O auxílio fiscal deve ser dado em situações extremas, como a que vivemos, mas a continuidade dele desnecessariamente pode gerar distorções importantes na sociedade, inclusive impactando na produtividade. Uma maneira bonita de falar que uma parte da população pode preferir ficar em casa “gastando” o auxílio governamental, a trabalhar e produzir. Fica então o alerta vindo desse dado de vendas varejistas: o quanto é sustentado por uma melhora estrutural ou o quanto está inflado por impulsos pontuais? Vejam, quero deixar bem claro que, assim como qualquer cidadão brasileiro, torço imensamente pelo meu país, inclusive pensando no futuro dos meus dois filhos pequenos. Só acho que cabe a reflexão antes de sair comemorando (ou gastando) por aí.

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