Há uma demanda represada por investimentos em infraestrutura, mas municípios precisam se capacitar

É necessário que administrações públicas aprofundem parcerias com o setor privado e busquem know-how para gerir futuros contratos de concessão no longo prazo

  • Por Fernando Vernalha
  • 06/12/2020 08h00
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Divulgação/Prefeitura de São Paulo Serviços públicos locais, como a coleta de lixo, deveriam ser aperfeiçoados; parceria com setor privado é uma das soluções

A necessidade por investimentos em infraestrutura não é uma realidade apenas da União e dos estados. Debilitados pela crise fiscal, as administrações municipais precisam encontrar alternativas para viabilizar investimentos na recuperação e ampliação de sua infraestrutura e no aperfeiçoamento dos serviços públicos locais. Há uma agenda represada de investimentos em operações de manejo de resíduos sólidos, esgotamento sanitário, gestão do parque de iluminação pública, infraestrutura social, como escolas e hospitais públicos etc. Para destravá-los, estas administrações precisam recorrer a parcerias com o setor privado. Programas bem estruturados de concessões e parcerias público-privadas serão fundamentais para viabilizar estes investimentos em bens e serviços municipais.

Um dos principais gargalos que impede o desenvolvimento desta agenda é a falta de bons projetos. A maioria dos municípios não conta com quadros capacitados para a elaboração deste estudos e projetos de longo prazo, sempre bastante complexos. Problemas orçamentários dificultam também a contratação de consultorias externas para isso. Para tentar resolver essa escassez, estruturadores institucionais, como o BNDES e, principalmente, a Caixa vêm funcionando como fábricas de projetos. Seus principais consumidores são os municípios, que têm se beneficiado dos projetos de boa qualidade fornecidos. O programa é monitorado também pelo PPI, Programa de Parcerias e Investimentos do governo federal, que ampliou nos últimos anos sua atuação também para apoiar os programas subnacionais.

O problema é que a fórmula da fábrica de projetos, embora seja uma solução relevante para contribuir com a geração de projetos bem estruturados, não é suficiente para destravar os negócios represados no âmbito municipal. Em primeiro lugar, pela insuficiência de escala. A capacidade dos estruturadores institucionais para a produção de projetos se mostra tímida em face da dimensão da demanda. Há milhares de municípios e uma pluralidade de setores que necessitam de investimentos urgentes. É uma demanda imensa por projetos, inviável de ser atendida em toda a sua extensão por esses poucos braços de estruturação do governo federal. Em segundo lugar, porque a iniciativa do governo federal está limitada ao fornecimento de projetos aos municípios, não se propondo a resolver uma outra deficiência não menos problemática destas administrações: a sua incapacidade de gerir os futuros contratos de concessão e parcerias público-privadas no longo prazo.

Os projetos gestados hoje originarão contratos que necessitarão ser geridos amanhã. Um aspecto relevante para o desenvolvimento de programas de longo prazo é a capacidade institucional e técnica dos governos em regular, fiscalizar e gerir a prestação do serviço objeto dos contratos de concessão e parcerias público-privadas. Para isso é necessário contar com estruturas administrativas adequadas, como órgãos de gestão e agências reguladoras. A imensa maioria dos municípios não os tem, não estando devidamente aparelhada para desempenhar essas atribuições. De nada adiantará entregar projetos bem estruturados aos municípios, se lhes falta capacidade de bem gerir as concessões. Por isso, ainda que se reconheça a relevância da atuação dos estruturadores institucionais e de suas fábricas de projetos, precisamos de alternativas para ganhar escala na produção, assim como para preparar os municípios para o desempenho das demais atribuições inerentes à fiscalização, regulação e gestão das concessões. Melhor do que fornecer projetos aos municípios, é ensinar-lhes como fazer. E mais do que fazer projetos, os municípios precisam capacitar-se para gerir os futuros contratos.

Para esse fim, uma alternativa que deveria ser levada em consideração pelo governo federal é a criação de um programa de qualidade para as concessões e parcerias público-privadas municipais, com a divulgação de boas práticas, de regras de boa governança, de modelos de documentos padronizados, com vistas a orientar os municípios não apenas a estruturar os projetos como a gerir os seus contratos no longo prazo. Aqueles municípios que se mantivessem aderentes a estas regras, devidamente monitorados pelo governo federal, receberiam um selo de qualidade. Este selo sinalizaria ao mercado a credibilidade institucional daquela administração para a estruturação e gestão destes negócios, induzindo à atração de melhores participantes aos chamamentos públicos e licitações. Gera-se com isso um círculo virtuoso, em que bons projetos e uma boa institucionalidade do poder público acabam por atrair bons investidores, originando projetos e empreendimentos de qualidade, o que atrai bons investidores, e assim por adiante.

A agenda municipal de concessões e parcerias com o setor privado é, enfim, urgente. E a iniciativa da Caixa e de outros estruturadores institucionais em fazer os projetos para os municípios é bastante relevante. Mas ela não será o bastante para viabilizar o destravamento desta agenda. Isso só será possível com a disponibilização de outras vias de estruturação – como, por exemplo, os chamados procedimentos de manifestação de interesse, por meio do qual se autorizam empresas privadas a produzirem os projetos para os municípios – e da transferência de tecnologia e know-how para capacitá-los a gerir os futuros contratos. Sem isso, os municípios terão muita dificuldade de viabilizar esses investimentos.

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