Acredite: o Rio Pinheiros pode se tornar um exemplo de revitalização e preservação ambiental

Soluções tecnológicas e sociais como a criação de corredores verdes e zonas úmidas ao longo das margens podem proporciona, por exemplo, habitats para diversas espécies de plantas e animais

  • Por Helena Degreas
  • 25/07/2023 18h32 - Atualizado em 27/07/2023 17h21
WILLIAN MOREIRA/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO - 08/06/2023 Vista de movimentação no Rio Pinheiros em São Paulo (SP) Movimentação no Rio Pinheiros, em São Paulo

E não é que as capivaras do Rio Pinheiros trouxeram à tona a necessidade de se repensar o impacto das novas estruturas construídas na restauração dos ecossistemas naturais e na promoção da biodiversidade como instrumentos para a reduzir as consequências desastrosas da crise climática? Como equilibrar as propostas de intervenção, digamos, convencionais, adotadas pelos órgãos públicos para o tratamento de rios que atravessam cidades? Para além dos serviços de limpeza e desassoreamento, obras de contenção de processos erosivos e urbanização, megacidades como São Paulo apresentam agendas urbanas e ambientais que incorporam abordagens ecossistêmicas com soluções tecnológicas associadas, advindas de projetos de arquitetura paisagística mais arrojados para garantir a preservação do meio ambiente e o bem-estar não apenas dos moradores locais, mas também de toda a população do planeta. Esta é a dimensão exata que deveria permear a discussão dos futuros projetos urbanos que envolvem as questões relacionadas aos recursos hídricos urbanos. Só de gabiões (muros de pedra preenchidos) e retirada de sedimentos do fundo do rio se faz um bom projeto de arquitetura paisagística.

Recentemente, fui surpreendida por um diálogo que ocorreu numa rede social, em que duas pessoas discutiam a necessidade de atualizar o nome do Rio Pinheiros para Canal Pinheiros de uma vez por todas. “Afinal”, reiterava a pessoa favorável à alteração do nome, “nem Pinheiros, nem meandros, nem várzeas e nem água corrente de rio tem lá! Até a água mudou de rumo. Como é que eu vou explicar esta coisa pro meu neto”? E continua: “Dizem que a tal água parada está quase despoluída. Qual o quê? Só acredito se algum político for lá beber um copão, sem gelo, de preferência!”. Na mesma semana, já exaurida das notícias alarmantes sobre práticas ambientais nocivas que permeiam os noticiários, promovidas por empresas, cidadãos comuns e instituições públicas, li a coluna “Às Margens do Rio Pinheiros”, escrita pelos colegas Paulo Pellegrino e Maria de Assunção Ribeiro Franco, ambos arquitetos paisagistas, professores e pesquisadores da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo. Eles apontam, de forma cristalina, diretrizes para a intervenção sustentável em áreas fluviais urbanas, mundo afora. Abordando a importância da preservação das margens do Rio Pinheiros e de suas características naturais, como curvas, áreas úmidas e vegetação ciliar, os autores ressaltam que a renaturalização de rios e córregos em áreas urbanas traz benefícios significativos para a biodiversidade. Ao criar corredores verdes e zonas úmidas ao longo das margens, proporcionam-se habitats para diversas espécies de plantas e animais, possibilitando a recuperação e expansão de suas populações. A remoção de estruturas artificiais, como muros de contenção, restaura os ecossistemas ribeirinhos, filtrando a água, controlando enchentes e servindo como berçário para espécies aquáticas. Por fim, destacam com razão a falta que as paisagens verdejantes do rio fazem para as pessoas, especialmente as mais antigas, que apreciavam sua beleza e desfrutavam das atividades no rio.

Soluções tecnológicas e sociais contemporâneas, que incluam a adoção dos conceitos de infraestrutura verde, energias renováveis e sistemas de drenagem sustentável, e, principalmente, envolvam a participação popular como uma ferramenta poderosa para a realização de intervenções que atendam às expectativas apontadas por diversos grupos sociais, são a chave para o sucesso de qualquer ação urbana de grande porte em cidades densamente construídas e habitadas. A criação de áreas verdes, zonas permeáveis e várzeas úmidas ao longo das duas margens, que acompanham seus 25 km de extensão, possibilitaria o plantio para que esses locais atuem como sumidouros de carbono, contribuindo para mitigar as emissões de gases de efeito estufa. A vegetação ao longo das margens também promove serviços ambientais importantíssimos, desde a redução dos gases de efeito estufa, ao ser responsável pelo armazenamento de carbono, até a conservação do solo e a regulação do ciclo da água

O “Cheonggyecheon Stream Restoration”, em Seul, Coreia do Sul, é um exemplo bacana de equilíbrio entre o crescimento e adensamento da cidade e a preservação ambiental. Ao recuperar um rio anteriormente canalizado sob vias expressas, a cidade criou um corredor ecológico encantador com múltiplos usos e funções oferecendo oportunidades recreativas valiosas, especialmente em áreas densamente povoadas com carência de espaços públicos qualificados. A “restauração ecológica” englobou a criação de áreas verdes nas margens, fornecendo habitat para a fauna e melhorando a qualidade do ar regional. As mudanças hidrológicas possibilitaram a reintrodução de espécies de peixes e trouxeram melhorias ao ecossistema aquático de forma geral. O projeto é um exemplo inspirador de como a renaturalização pode trazer benefícios ambientais e sociais ao harmonizar o desenvolvimento urbano com a preservação da natureza, contribuindo para a saúde e bem-estar da comunidade local. O Rio Pinheiros, a exemplo de inúmeros outros espalhados em território brasileiro, pode se tornar um exemplo de revitalização e preservação ambiental ao adotar planos e projetos sustentáveis em toda a sua extensão e margens. Em vez de muros ininterruptos, podemos ter um rio cercado de áreas verdes, espaços de lazer e um ecossistema rico em diversidade. A busca por soluções ecológicas é essencial para promover um ambiente sustentável, que respeite a natureza e proporcione uma melhor qualidade de vida para todos.

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*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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