Ativismo resiste à destruição ambiental em busca de políticas que priorizem a vida, e não o lucro
Deixei a família e fui à Avenida Paulista me juntar a pessoas que, como eu, estão exaustas de uma cidade sufocada pela fumaça amarela, assolada por enchentes e secas, suja e com calçadas esburacadas
Poderia ser um domingo qualquer, daqueles em que famílias, parentes e amigos se reúnem em torno de uma mesa, trocando conversas triviais e risos, que nem sempre surgem com facilidade. Palavras, muitas vezes carregadas de significados dúbios, poderiam render tramas dignas de séries, com direito a empurrões, socos, carteiradas, boletins de ocorrência e até alguns sopapos — mas, felizmente, sem cadeiradas. Um cenário ainda leve, se comparado aos despautérios que os quatro candidatos à prefeitura da maior cidade da América Latina têm apresentado nas redes de TV em horário nobre. Com que direito ousam se apresentar como representantes dos cidadãos de São Paulo, incluindo a mim, com atitudes, falas e ações tão inaceitáveis para quem pretende gerir a maior cidade do país? Alguém pode explicar esse desrespeito ao público?
Por que os noticiários continuam alavancando candidaturas e redes sociais de pessoas emocionalmente desequilibradas e agressivas ao reproduzir cenas e declarações que, em muitos casos, deveriam ser explicadas em delegacias ou hospitais psiquiátricos? Onde estão os debates destacados nas manchetes sobre os problemas que realmente nos afligem no dia a dia? Como pretendem melhorar o transporte público, que é ineficiente e não atende adequadamente os trabalhadores? O que planejam para a alfabetização das crianças nas escolas municipais, muitas das quais chegam a idades avançadas sem saber ler ou escrever? E o que farão em relação ao crime organizado, que tomou posse da região da Cracolândia e dela tira lucros descaradamente, à luz do dia?
Tratar os dependentes químicos é uma obrigação do poder público e está relacionado à governança, mas desmantelar o crime organizado é uma urgência inadiável. Propostas de acolhimento “de braços abertos”, sem metas concretas e eficazes, carecem de sentido. É preciso mais do que discursos vazios; são necessárias ações reais, que enfrentem de maneira firme tanto a questão da saúde pública quanto o controle do crime que se enraíza na cidade. Querem meu voto? Então, expliquem como pretendem abordar algumas das questões que realmente importam, pelo menos para mim, e que muito esclareceriam sobre os planos de governo de cada um para a cidade onde moro, levo minha vida e pago meus impostos.
Deixei a família e fui à Avenida Paulista, juntar-me aos ativistas que, como eu, estão exaustos da thanatopolis paulistana — uma cidade sufocada pela fumaça amarela, assolada por enchentes e secas, suja, com calçadas esburacadas, onde cidadãos, tanto das áreas centrais quanto periféricas, buscam abrigo do sol escaldante em sombras improvisadas proporcionadas por postes públicos ou painéis publicitários. A degradação social causada pela gestão deficiente dos serviços públicos e o descaso com a saúde da população tornam o cenário semelhante à distopia de Blade Runner 2049, em que a vida é consumida pela lógica da morte e da exploração, seja pela poluição das metrópoles ou pela destruição dos direitos básicos.
A supressão das poucas áreas verdes nos espaços públicos, autorizada por técnicos municipais com justificativas incompreensíveis para quem sofre as consequências devastadoras das mudanças climáticas, evidencia a exploração dos recursos e a desvalorização da vida humana, nos conduzindo a essa cidade da morte, onde a esperança se perde em meio às cinzas. Diante desse cenário desolador, o ativismo se apresenta como a última trincheira de resistência contra essa lógica destrutiva, lutando por um futuro em que a vida, e não o lucro, seja a verdadeira prioridade. Com o tema “Esse calor não é normal: marcha pela justiça climática”, o Fórum Popular da Natureza Coalização pelo Clima conclamou grupos da sociedade civil à mobilização em torno de reivindicações diversas que visam ampliar o debate e a busca de soluções ambientais para um país em crise climática.
O ativismo ambiental no Brasil tem se intensificado na busca por soluções para a crise climática e a ausência de um modelo de transição energética adequado. As recentes manifestações em diversas cidades do país reforçaram essa demanda, evidenciando a urgência de políticas climáticas eficazes para a descarbonização do Brasil e a importância de eleger líderes políticos comprometidos com a sustentabilidade. A crítica ao agronegócio predatório, com suas práticas de queimadas e desmatamento, destacou a urgência de mudanças no setor, que continua a envenenar terras e rios em nome do lucro. Além disso, os movimentos sociais exigem a investigação e punição de responsáveis por incêndios criminosos, e a proteção dos direitos dos povos indígenas e quilombolas, com a demarcação de suas terras, denunciando o genocídio de lideranças e lutando contra o marco temporal. A defesa dos territórios tradicionais é vista como central não só para essas populações, mas para toda a sociedade, no caminho para a justiça socioambiental.
O ativismo também clama por mais investimentos em órgãos de defesa ambiental, como o Ibama e o ICMBio, e por um modelo de transição energética que inclua a reorganização de programas como o Plano Safra e medidas para proteger trabalhadores em áreas poluídas, visando um futuro sustentável. Suas propostas geraram Cartas de Compromisso do Futuro Climático e que encontram-se disponíveis em redes sociais. stavam presentes centrais sindicais, associações civis como Coletivo Corredor Ecológico Urbano do Butantã, Fórum Verde Permanente, Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), CUT, ativistas indígenas (Guerreira Indígena do povo Paiter Suruí dentre outros), @coalizaopeloclimasp @novaraposonao @redeambientalbutanta8 @rede_nosso_parque @forumpopulardanatureza @propinheiros @cerradoinfinito e “estreantes pretendentes” a cargos públicos eletivos que se colocavam como defensores de causas ambientais.
Essa realidade ambientalmente distópica, mencionada na coluna anterior, é resultado da ausência de um plano concreto para a transição energética no país nas três esferas de poder e, em especial, do governo federal. Como será o Brasil daqui a dez anos? De que maneira a matriz energética, alinhada com a política econômica, poderá contribuir para enfrentar as demais questões brasileiras? As políticas ambientais do Brasil frequentemente respondem a pressões pontuais, como crises econômicas, desastres climáticos ou exigências internacionais, sem a criação de um modelo robusto e unificado para garantir um futuro energético sustentável e descarbonizado. A fragmentação e a falta de um direcionamento claro dificultam a implementação de soluções estruturais, perpetuando uma abordagem improvisada e reativa, em que o acaso define o ritmo das decisões e políticas adotadas. Chega de reuniões sem resultados. Chega de discursos vazios que, sem definição de objetivos relacionados ao processo de transição energética, sem metas, investimentos e parcerias, levam a um futuro incerto.
Assim como os replicantes de Blade Runner, frequentemente vistos como “implicantes” nas narrativas institucionais, os ativistas que lutam por justiça social também enfrentam repressão, sendo tratados como obstáculos à ordem estabelecida. Em algumas redes sociais, observou-se que a polícia militar, seguindo protocolos do Estado, adotou, ao final, práticas desnecessárias e truculentas contra os manifestantes, em nome da manutenção da ordem pública para dissipar o evento. Tanto na ficção quanto na realidade, aqueles que desafiam o status quo — ou, no jargão de mercado, “business as usual” — são considerados incômodos. No entanto, é justamente essa resistência que mantém viva a esperança de um futuro diferente, enfrentando a lógica da exploração e da destruição.
*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.
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