Entenda como a mobilidade afeta as cidades e a qualidade de vida
A cidade do automóvel lentamente vem se humanizando, colocando o ser humano em primeiro lugar, transformando-se em cidades para pessoas
Ao longo do século 20, as políticas de planejamento rodoviaristas adotadas em todo o mundo foram responsáveis pela adaptação física das cidades ao fluxo crescente de veículos motorizados. Sejam caminhões, automóveis particulares, transportes coletivos como ônibus e vans, entre outros, o fato é que a adaptação dos espaços públicos para atender à circulação do transporte motorizado foi, aos poucos, destruindo a qualidade dos ambientes públicos destinados às pessoas. Quem já não passou pela situação constrangedora de sair correndo como se estivesse participando de uma maratona para atravessar um semáforo de tempo curto para o pedestre e longo para carros? Ou ainda, fazer compras em ruas movimentadas e perceber que não há calçada suficiente para acomodar todos os cidadãos que, como você, estão andando no meio da rua? Nestas situações, costumo afirmar que o verdadeiro cidadão é… o automóvel. Para ele, são destinados espaços públicos de qualidade para descanso (estacionamento em vagas reservadas ao longo das calçadas, pagas ou não) e iluminação noturna privilegiada, enquanto o pedestre fica, geralmente, às escuras em praças públicas por exemplo.
Nos últimos anos, o conceito de mobilidade deixou de ser sinônimo de transporte motorizado. A ele foram incorporados os modos ativos, ou ainda, aqueles que permitem a mobilidade a pé e de bicicleta. Essa é uma excelente notícia para o cidadão. A cidade se preparará para receber… pessoas. Quem diria? Planos e ações alinhadas com as discussões da Agenda Urbana Internacional para a sustentabilidade de nossas cidades geraram diretrizes e metas para o planejamento das cidades, levando governos signatários da Agenda 2030 – incluindo o Brasil – a atuar neste sentido. Ao criar o Estatuto das Cidades (2001), o Ministério das Cidades (2003) promulgou a Lei 12.587/2012, que instituiu a Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU), obrigando mais de 3.000 municípios com mais de 20 mil habitantes a desenvolver projetos sobre tema. Mais recentemente, o presidente Jair Bolsonaro sancionou a Lei 14.000/20, que prorroga os prazos para 2022 e 2023 para que as prefeituras elaborem seus planos. Mais de 90% das prefeituras não cumpriram o prazo anterior, situação que impediu os repasses de verbas públicas para obras de mobilidade urbana em seus municípios.
Para além do transporte, os novos planos de mobilidade que estão sendo implantados em cidades como São Paulo, Fortaleza, Porto Alegre, Rio de Janeiro e Belo Horizonte já vem mostrando resultados positivos na vida das pessoas. O estímulo ao uso dos espaços públicos por meio da restrição e controle do acesso de automóveis em vias públicas, de maneira permanente ou temporária, é um dos resultados. Um exemplo emblemático é a abertura da avenida Paulista (Paulista Aberta) aos domingos e feriados para caminhadas e ciclismo. A implantação de áreas de descanso e parada (parklets, vagas verdes) destinada aos pedestres sobre vagas de estacionamento, pagas ou não, ao lado das calçadas é outro exemplo bem sucedido que resultou dos planos de mobilidade urbana. O aumento da malha cicloviária (ciclovias, ciclorrotas, ciclofaixas e vias compartilhadas) e a ampliação na largura das calçadas (sobre vagas de estacionamento, utilizando instrumentos de intervenção do urbanismo tático) incentivam a prática de atividades físicas por meio do ciclismo e das caminhadas, reduzindo o sedentarismo e melhorando a saúde da população.
Esses exemplos citados apontam para a contribuição dos planos de mobilidade urbana para a revitalização e valorização dos espaços públicos, favorecendo não apenas a economia e a segurança local, mas também a qualidade de vida do cidadão. A cidade do automóvel lentamente vem se humanizando, colocando o ser humano em primeiro lugar, transformando-se em cidades para pessoas.
*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.
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