Preocupado com a queda de árvores? Prevenção é a solução
Tempestades e ventanias não podem ser tratadas pelo poder público como fenômenos naturais atípicos; em tempos de mudanças climáticas, culpar a natureza é um despropósito
Desde a promulgação do Estatuto da Cidades, as questões ambientais devem orientar a estruturação, o ordenamento territorial urbano dos municípios brasileiros e a conformação dos sistemas ambientais urbanos. Das hortas urbanas aos parques, os componentes vegetais integram o sistema de espaços livres públicos, colaborando na constituição de uma verdadeira infraestrutura verde das cidades. A arborização do sistema viário surge como um subsistema capaz de conectar fragmentos verdes (praças, jardins, parques) espalhados pelos bairros por meio de corredores, formando alamedas sombreadas, sempre muito bem-vindas, quando as temperaturas tórridas instalam-se em nossas terras.
Prevenir riscos de morte e perdas materiais provocados por quedas de árvores nas regiões urbanas dependem da gestão e manutenção preventiva da vegetação plantada nos espaços públicos. As mudanças climáticas vêm causando alterações no regime e volume das chuvas em todo o planeta. Tempestades, ventanias e quedas de árvores não podem ser tratadas pelo poder público municipal como fenômenos naturais atípicos. Em tempos de mudanças climáticas, culpar a natureza é um despropósito.
Órgão públicos comumente delegam aos departamentos de zeladoria urbana, que, pela natureza institucional, tratam os exemplares arbóreos existentes numa calçada ou numa praça como um problema relacionado à limpeza urbana, quando o adequado seria o manejo considerando a situação fitossanitária e as condições locais do entorno, analisando-se, portanto, as necessidades de cada indivíduo, evitando acidentes e perda do elemento. São elementos vivos e como tal devem ser tratados.
Com cerca de 85% da população brasileira residente em cidades e eventos climáticos que colocam em risco a população, faz-se necessário planejar a arborização, não apenas em unidades de conservação, parques naturais e reservas, mas também ampliar a gestão da arborização aos demais espaços públicos como parques, praças e sistemas viários, incluindo nela as calçadas, os estacionamentos, as novas áreas de fruição públicas (cidade de São Paulo) e as áreas residuais previstas pelo Manual de Desenho Urbano e Obras Viárias (aqui, de novo, a capital paulista) como ferramenta para filtrar, manter o solo permeável e abrigar a fauna silvestre. Corredores viários são considerados em alguns países uma das categorias que compõem as florestas urbanas e integram a infraestrutura verde da região, categoria cuja importância para a prestação de serviços ambientais assemelha-se às outras infraestruturas urbanas, como sistema de abastecimento de água e coleta de esgotos, complexo viário entre outros.
Responsáveis pelos serviços de serviços de plantio e manutenção, prefeituras alardeiam a carência de recursos orçamentários para a execução dos trabalhos, deixando transparecer a distância conceitual entre o trabalho de limpeza de folhas, poda ou remoção de galhos e a realização de um sistema de gestão da arborização municipal. A título de esclarecimento, apesar da criação e uso intenso de vários apps para a prestação de serviços diversos de compras, alimentação, educação e diversão utilizados pela população por meio de smartfones, órgãos municipais ainda solicitam a seus técnicos e colaboradores o preenchimento de fichas impressas em papel. Posteriormente são colocadas numa planilha simples em Excel e, depois de prontas, descansam na CPU de algum servidor, bem distantes da população. O princípio de eficiência na gestão da coisa pública e eventual eficácia no atendimento às necessidades do cidadão são postergadas para as calendas.
Cilene Mainente, gestora dos cursos da computação da Universidade Municipal de São Caetano do Sul, comenta que o desenvolvimento de um sistema integrado de gestão para automatizar tarefas, atividades diárias e integrar informações fragmentadas em diversos departamentos aumenta a produtividade das equipes, melhora a eficiência e a gestão pública à distância. Além disso, permite facilitar a tomada de decisão dos gestores quanto a podas, substituição, monitoramento fitossanitário, cadastramento, registro de ocorrências garantindo a preservação e uma vida saudável do elemento vegetal. A instalação de uma pequena placa contendo um QR Code em árvores pode facilitar o acesso às informações cadastrais como a geolocalização, dados fitossanitários, o histórico de manutenções passado e futuro, o trabalho realizado pelas empresas prestadoras dos serviços de poda. Por outro lado, isso aumenta a gestão colaborativa, ao possibilitar, em tempo real, a interação com o cidadão. Munido de smartfone e app, ele informa o departamento gestor deste banco de dados sobre eventuais danos causados por rompimento e quedas de fiação aérea, quebra de galhos e demais sinistros.
Planejar a gestão da manutenção das árvores, integrando-as aos demais ecossistemas, pressupõe uma abordagem sistêmica e intersetorial, além de qualificar novas formas de gestão e governança colaborativos, participativos e que viabilizem a interação entre os distintos agentes públicos, empresas e sociedade civil. A coordenação das ações, programas e planos realizada pelo poder público poderá gerar benefícios à população e ao ambiente urbano. Como porteiro do reino dos céus e pescador de almas, São Pedro já tem muito trabalho. Regular o clima para evitar queda de árvores não deveria estar entre suas atribuições. Os extremos climáticos e suas consequências são de responsabilidade humana, ou seja, construímos com nossa cegueira ambiental, cobiça e complacência de governos a camada de gases que encobre a atmosfera terrestre, aquece o planeta e altera o regime e o volume de chuvas.
*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.
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