Conselho da República é solução de Bolsonaro como day-after do histórico 7 de setembro
Presidente planeja investir na força do acordo com Centrão para aprovar reformas, mudança eleitoral e enquadrar opositores no STF
Embalado e respaldado pela impressionante mobilização popular de 7 de setembro, nas ruas de Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro e outras grandes cidades, Jair Bolsonaro apontou a tão esperada solução, dentro das quatro linhas da Constituição Federal, para colocar um freio na guerra institucional entre os poderes. O presidente vai convocar o Conselho da República e usar a pressão popular sobre sua base aliada para conseguir do Congresso Nacional, provavelmente através de decretos-legislativos, medidas que restabeleçam o equilíbrio nas relações entre o Executivo, o Legislativo, o Judiciário, os Militares e aquele que se definiu, acima de tudo e de todos, o suposto poder encarnado pelos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal. As reuniões do CdR (15 membros) são convocadas pelo titular do Palácio do Planalto. Detalhe: o presidente do STF não compõe o Conselho.
O Conselho da República é um instrumento previsto na Lei 8.041, sancionada em 5 de julho de 1990 pelo então presidente Fernando Collor de Mello. Trata-se de um órgão superior de consulta do Presidente da República. Tem a competência para pronunciar-se sobre: “I – intervenção federal, estado de defesa e estado de sítio; II – as questões relevantes para a estabilidade das instituições democráticas”. Presidido pelo Presidente da República (perdão pela redundância legal), o CdR também composto por outros 14 membros: o Vice-Presidente da República, o presidente da Câmara dos Deputados, o presidente do Senado Federal, os líderes da maioria e da minoria na Câmara dos Deputados e no Senado (todos designados na forma regimental), o Ministro da Justiça e mais 6 cidadãos brasileiros natos, com mais de 35 (trinta e cinco) anos de idade, todos com mandato de três anos, vedada a recondução. Nesse último grupo, dois são nomeados pelo Presidente da República, dois eleitos pelo Senado Federal e dois eleitos pela Câmara dos Deputados.
Na prática, o que Bolsonaro planeja é utilizar os instrumentos de poder previstos pela apreciação do Conselho da República a partir da recomposição que fez de sua base aliada, com o (muito criticado) acordo pragmático com o famoso “Centrão”. O assunto vai gerar extrema polêmica, já que Bolsonaro tem o presidente da Câmara, Arthur Lira, como aliado. Porém, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, joga claramente contra ele. Assim, o CdR terá imensa dificuldade de atingir consensos acerca de decretos-legislativos, ou outras medidas legais e legislativas sobre reformas ou mudanças estruturais. O 7 de setembro de 2021 representou muito mais que a maior festa cívica e patriótica do Brasil. Será um ponto de inflexão para reformas e mudanças estruturais inadiáveis para o país. Mobilizadíssima nas redes sociais da internet, a classe média saiu às ruas para defender os princípios de liberdade, legalidade e legitimidade. Por isso, a pressão popular nas ruas acende, intensamente, a luz amarela de advertência para aqueles que não estão jogando dentro das quatro linhas da Constituição. A missão imediata e quase impossível do povo brasileiro é pressionar quem tem o dever legal e a capacidade real de combater, neutralizar e vencer a tirania do crime institucionalizado – a real ditadura que afeta o funcionamento das instituições brasileiras.
Bolsonaro jogou duro no discurso. Pela manhã, na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, advertiu que usará a fotografia das manifestações deste 7 de Setembro para mostrar aos chefes dos demais Poderes “para onde nós todos devemos ir”. De tarde, na Avenida Paulista tomada por cidadãos em 14 quarteirões, Bolsonaro elevou o tom na estratosfera: “Nós queremos uma eleição limpa, democrática, com voto auditável e com contagem pública dos votos. Não podemos ter eleições que pairem dúvidas sobre os eleitores. Não posso participar de uma farsa como essa, patrocinada pelo presidente do TSE. Hoje temos uma fotografia para mostrar para o Brasil e para o mundo”. Mas o maior alvo de Bolsonaro foi Alexandre de Moraes: “Ele tem tempo ainda para se redimir. Tem tempo ainda de arquivar seus inquéritos. Sai, Alexandre de Moraes, deixa de ser canalha. Deixe de oprimir o povo brasileiro, deixe de censurar o seu povo. Ou se enquadra ou pede para sair”.
Resumindo: opositores acirram a narrativa de impeachment do presidente, por crime de responsabilidade, em função dos discursos pesados contra ministros do STF, especialmente Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes (não por coincidência atual e futuro presidente do Tribunal Superior Eleitoral). O CdR será mais um teste para a conflituosa instabilidade institucional brasileira. Tudo, essencialmente, por causa ou em função de uma Constituição deficiente, uma classe política fisiológica e metida em corrupção sistêmica, além de uma composição do STF, extremamente política, que entrou em conflito com um Presidente da República que é sabotado desde antes assumir o mandato. A “luta” (ops, a guerra) continua, literalmente.
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