A política nos tempos de Covid-19: Até quando ficaremos confinados em casa?

Se é para fechar empresas, impedir trabalhadores de exercerem suas atividades, o debate é inevitável: quem é que vai pagar por isso?

  • Por José Maria Trindade
  • 17/03/2021 12h00 - Atualizado em 17/03/2021 14h14
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Giuseppe Lami/EFE - 15/03/2020 Quase todo o mundo está confinado há um ano

“Até quando acredita o senhor que podemos ficar neste ir e vir do car****?”, perguntou, em tom estúpido, o capitão do navio ao dono da empresa de navegação, Florentino Ariza. A resposta foi imediata: “Toda a vida”. Esta era uma frase maturada através de longos 53 anos, 7 meses e 11 dias, sem contar as respectivas noites. Dias de insônia em busca de recuperar o destino de um amor contrariado. Florentino Ariza reencontrou a amada Fermina Daza, num dos relatos de amor entre octogenários mais intensos da literatura. É a história do livro “Amor nos Tempos do Cólera”, de Gabriel García Márquez. O pano de fundo, a epidemia do cólera, o vibrião que assustou o mundo e fez países mudarem hábitos de higiene e postura. Haverá amores contrariados hoje, nos confinamentos obrigatórios nestes tempos da Covid-19, mas se existem casos de entendimentos românticos, e existem, sobram os casos de vidas dificultadas e interrompidas em virtude do nada romântico confinamento que tem agora o nome novo de “lockdown”.  Os tempos da Covid 19 estão longos demais.

O questionamento do capitão (do navio) faz sentido, todos precisamos de horizonte. Dizem os guardas de prisões que os presos ficam impacientes no início por não saberem quanto tempo estarão trancafiados. Depois da sentença final, há um natural relaxamento. É quando o condenado recebe o horizonte e se programa para cumprir a pena inevitável. O que vivemos hoje incomoda exatamente por falta do horizonte. O confinamento não tem prazo. Muitos defenderam a paralisação das vidas há um ano. Se todos estivessem presos em casa, não há dados para balizar como estaríamos agora. Faltam indicações certas para definir se a quarentena funciona e até onde vai a resposta do isolamento em vidas salvas. Na história da humanidade, não tem nada parecido. A própria Bíblia mostra que em caso de uma tragédia assim, os infectados é que são isolados. O momento é grave, o número de mortes assusta e esconde tragédias pessoais severas, mas partir para o fechamento é no mínimo duvidoso. Isolamento é transitivo, precisa de um complemento, a resposta que não chega: “Até quando?”. 

As histórias sobre o isolamento atual mostram tragédias pessoais pelas mortes e perdas de emprego e rendimentos.  Um vendedor ambulante chega a mim por meio de relato gravado dizendo que, se não sair, os filhos morrem. A fome grita. Segundo ele, na sua casa o relógio não pula a marca de 12 horas: “Não sai de 11 horas para 1 hora”. O ponteiro ao meio-dia significa fome e hora de colocar a comida na mesa. Quem é que vai pagar por isso? A Constituição garante o direito de ir e vir. A iniciativa privada ganhou também um capítulo sobre o direito de livre iniciativa. O isolamento obrigatório desobedece a regra. No caso de requisitar imóveis privados, o governo pode. Desde que pague a indenização em valores de mercado. Se o Estado decreta a interrupção do funcionamento de uma empresa, pela lógica, terá que pagar pelo faturamento interrompido. No caso de autônomos, a situação fica ainda mais grave. Trata-se de recursos alimentícios, ou seja, impossíveis de serem interrompidos ou mesmo retidos judicialmente. O que falta agora nesta disputa entre os que determinam o fechamento e os que querem trabalhar é a resposta: “Quem é que vai pagar por isso”.

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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