Com reforma, CNA aponta que agro pode ter alta de 573% na carga tributária

Coordenador do núcleo econômico da entidade, Renato Conchon afirma que proposta é fundamental para viabilizar novos negócios e alavancar a economia brasileira, mas aponta pontos sensíveis na discussão

  • Por Kellen Severo
  • 06/03/2023 09h00 - Atualizado em 06/03/2023 18h32
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Franck Barske/Pixabay trator jogando fertilizante em plantação Setor agropecuário poderá ter um aumento de 573% na carga tributária se reforma passar como está

Segundo a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), o setor agropecuário poderá ter um aumento de 573% na carga tributária caso a reforma, que tem como base as Propostas de Emenda à Constituição (PECs) 45 e 110, avance no Congresso da forma que está. Confira a entrevista que realizei com o coordenador do núcleo econômico da CNA, Renato Conchon:

Que tipo de reforma tributária podemos esperar e quais são os pontos mais críticos para o agro? A reforma tributária que a gente espera é a melhor reforma tributária possível para todos os setores econômicos, incluído o agro. O agronegócio reconhece que a reforma tributária é fundamental para viabilizar novos negócios e alavancar a economia brasileira. O agronegócio reconhece e apoia a reforma tributária, desde que ela contemple as especificidades do setores e o agronegócio é um deles. A gente não pode esquecer que outros setores econômicos sofrem assim como nós impactos diversos. O setor de serviços vem dizendo de forma recorrente que vai haver deslocamento de carga tributária e é verdade. O setor agropecuário e o de serviços tendem a ser penalizados com deslocamento de carga tributária, isso significa um aumento dela, o que inviabilizará algumas cadeias agropecuárias e alguns setores econômicos. Essa é a nossa principal preocupação. O deputado Pedro Lupion já disse que a FPA está para colaborar, nós da CNA também, assim como outras entidades do agro, no sentido de viabilizar uma reforma tributária sem que haja prejuízo. Esse é o objetivo que a gente vem trabalhando.

Quais são os pontos que gostaríamos de adotar? Hoje são, no mínimo, seis pontos primordiais para o apoio e acreditamos que tecnicamente é possível adentrar [na proposta], porque são pontos comuns entre os setores econômicos, não é só do agro. Por exemplo, a manutenção da carga tributária global e setorial. A gente sabe que diante de uma reforma estrutural, vai haver certo deslocamento de carga, mas é nosso objetivo que o aumento da carga tributária não inviabilize de forma nenhuma a cadeia. Outro ponto que trazemos sobre as PECs 45 e 110 é a questão da alíquota única. A gente reconhece que no modelo de simplificação seria o ideal, mas não dá para tributar um litro de leite com a mesma alíquota de um smartphone, porque a nossa população, sobretudo os mais carentes, tendem a pagar mais e isso vai ter reflexo na cesta básica. Segundo um estudo da CNA, a cesta básica pode ficar 22,7% mais cara com uma alíquota única e isso vai se repetir na taxa de juros, que já está alta, já vimos discussões sobre isso. Nosso estudo apresenta que a inflação tende a subir até 1 ponto percentual em 12 meses e 1,8 ponto percentual no período acima de 12 meses.

Ou seja, uma alíquota única, do ponto de vista de simplificação, a gente acredita que vai simplificar. Mas não é factível, não é viável em um país com tantas diferenças setoriais. A gente não consegue nem unificar um imposto de alíquota única dentro do agro, quem dirá se discutir com setor de serviço, indústria, comércio e o setor de transporte. A gente está na contramão do mundo. Os países que utilizam o IVA – que o modelo tributário está propondo – se utilizam de alíquotas diferenciadas, sobretudo países que tenham produção agrícola relevante.

A proposta de uma alíquota única onera o agro? Onera a sociedade brasileira e vai aumentar o custo de vida dos brasileiros. A ideia de tributação do IVA é que quem paga a conta seja o consumidor final, ou seja, o brasileiro vai pagar a conta. Mas nós do agro temos algumas preocupações. Por exemplo, o produtor de commodity, ele não é formador de preços, ele é tomador de preço. O produtor de soja do Mato Grosso ou do Paraná ou do Rio Grande do Sul não vende pelo preço que quer e sim pelo preço da Bolsa de Chicago. Ou seja, não é porque aumentou a tributação que ele necessariamente vai repassar esse aumento para o vendedor. Existe risco para o consumidor e existe risco para o produtor rural, sobretudo para o produtor de commodity. Por isso que uma reforma tributária vai fazer um rearranjo nos preços relativos à economia e vai acabar inviabilizando algumas cadeias, algumas atividades econômicas, essa é a principal preocupação.

Simplificar tributos significa retirar isenções e benefícios fiscais do agro? Exatamente, e não só do setor agropecuário, mas de outros setores econômicos que possuem benefícios. Por exemplo, a região da Zona Franca, região de desenvolvimento regional, a Sudene e a Sudam, por exemplo, perderão todos os benefícios tributários concedidos. Outro caso: o benefício tributário concedido na cesta básica vai acabar, ela vai ficar mais cara. O benefício tributário atualmente concedido sobre insumos agropecuários vai acabar. Ou seja, os insumos ficarão mais caros e produtores rurais terão elevação de custos.

Por que avançar com essa proposta? É uma proposta inicial. Acreditamos que dá para evoluir, dá para aprovar uma reforma com ajuste,s e nós, na CNA, juntamente com a FPA [Frente Parlamentar da Agropecuária], estamos dispostos a propor melhorias neste texto e acreditamos que isso poderia viabilizar a aprovação e apoio da reforma tributária. Com relação à carga tributária, estudos indicam que a do setor primário, ou seja, do produtor rural, agrícola, pecuário, extrativo, vegetal, tende a crescer 573% no setor agropecuário brasileiro. A questão é que muitas cadeias agropecuárias, a esmagadora maioria, não tem como assimilar um aumento de custo de 573%, vai inviabilizar a cadeia e gerar problema social.

Esse aumento de 573% seria devido à aprovação do imposto IVA? É um aumento de 573% da carga tributária do setor agro brasileiro. Isso vai refletir no aumento do custo de produção, inviabilizando algumas cadeias. Se a gente conseguir repassar o custo, e do ponto de vista de produção de commodities não conseguiremos, o consumidor vai pagar. A sociedade brasileira não tem condições de assimilar um aumento de custo na alimentação ou serviço básico dessa natureza.

O Estado está com “fome”, precisa arrecadar porque está gastando muito. Fazer esta reforma tributária significa o que? Essa é uma das nossas preocupações, embora os interlocutores da reforma citem que a proposta não visa o aumento da carga tributária global, nos preocupamos porque a CNA tem documentos apresentados em que acredita que as reformas estruturais são necessárias, a tributária é uma delas. Entretanto, na nossa visão, a gente acredita que tem que ter reforma administrativa e reforma política para diminuir o tamanho do Estado e depois arrecadar de acordo com a necessidade das finanças do país.

Qual das PECs é a melhor para o agro? As duas precisam de alterações. Da forma que se encontram no Congresso, as duas prejudicam o agro. Por isso, estamos propondo emendas e fazendo ajustes de melhoria nos dois textos. O Congresso vai decidir qual texto quer tocar. Nosso papel é apresentar sugestões de melhoria e estamos fazendo isso por meio do IPA [Instituto Pensar Agropecuária] para que não inviabilize as cadeias e o Congresso que decida politicamente qual vai ser aprovada.

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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