Por que as mulheres não votam em mulheres?

Ao contrário da maior parte das feministas, a mulher comum não considera gênero um critério relevante e não vê o mundo como uma batalha entre os sexos

  • Por Leandro Narloch
  • 30/11/2020 12h58
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Nelson Jr./ ASICS/ TSE urna Nas 94 maiores cidades, há oito apenas prefeitas

Mulheres são 52,5% dos eleitores, mas 16% dos vereadores eleitos em 2020. Apesar das cotas de número de candidatas e do fundo eleitoral, e apesar da insistência da mídia sobre o assunto, a participação feminina variou pouco em relação a eleições anteriores. Nas 94 maiores cidades, há oito prefeitas – mais que em 2016 (três) e menos que em 2008 (dez prefeitas). Feministas consideram isso uma má notícia e culpam o machismo da sociedade e a pressão do patriarcado. Mas se esquecem que as mulheres são a maior parte dos eleitores. Mesmo se houver seleção favorável aos homens dentro dos partidos, nada impede que elas criem seus partidos ou votem naqueles com presença feminina mais consistente.

Arrisco outra resposta. Ao contrário da maior parte das feministas, a mulher comum não vê o mundo pela lente das relações de poder. Não se vê como integrante do time feminino contra o time masculino. Não considera que está perdendo quando homens ganham. O mesmo vale para os homens. É preciso um bocado de paranoia para acreditar que, diante da vitória feminina, homens reclamem: “Droga, o grupo masculino perdeu, não podemos deixar isso acontecer”. Homens têm filhas, netas, sobrinhas: a maioria deles torce pelo sucesso de pessoas queridas. Também me parece que a mulher comum não considera gênero um critério relevante. Votam igualmente em homens e mulheres pesando outros critérios: honestidade, experiência, eficiência. Como as mulheres são um terço dos candidatos, e boa parte dessas são laranjas para cumprir a cota imposta pela lei, as eleitoras acabam escolhendo mais em homens. Talvez nem mesmo as feministas considerem o gênero tão relevante quanto afirmam. Num segundo turno entre Guilherme Boulos e Joice Hasselmann, será que as feministas de esquerda votariam na mulher? Por quem se sentiriam mais representadas?

E assim migramos para outra pergunta: Por que tão poucas mulheres se candidatam? Um estudo de 2019 mostrou que as mulheres inglesas se interessam menos por política que os homens. Em média, 57% dos homens se interessam, contra 30% das mulheres. O curioso é que a diferença cresce com a educação: passa de 30 pontos percentuais entre os formados em universidades. Além disso, estudos mostram que, em muitas culturas, mais homens escolhem ingressar em ambientes competitivos onde o vencedor leva tudo; as mulheres em geral têm mais aversão ao risco e tendem a preferir ambientes de recompensa fixa e segura. (A economista Marianne Bertrand resume esses estudos no texto “New Perspectives on Gender”, de 2011.) Quem se preocupa com a participação de mulheres na política precisa lidar com estas duas características da mulher real: Falta de interesse pela política e maior aversão ao risco. Afinal, como ficou provado mais uma vez, cotas por gênero criam laranjais e não estão dando resultado.

The Economist

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