‘Regulamentar’ mídia e redes sociais não passa de forma fofa de censurar

Preparem-se para a censura aberta, mas não a de George Orwell em ‘1984’, e sim como a de ‘Admirável mundo novo’ de Aldous Huxley – um autoritarismo com rosto corado e adornado de sorrisos radiantes

  • Por Pedro Henrique Alves*
  • 07/01/2023 10h00 - Atualizado em 07/01/2023 10h22
Sara Kurfeß/Unsplash Imagem de tela de celular com apps de redes sociais Imagem de tela de celular com apps de redes sociais; governo Lula planeja usar a Secom para monitorar postagens e atos 'antidemocráticos'

O Brasil passa, literalmente, por uma insurreição ideológica daquilo que temos de pior na esquerda contemporânea. Tentei ser um otimista para bem estrear minha coluna aqui no portal da Jovem Pan; mas não consegui, me perdoem. Caos e bancarrota é o que enxergo nos primeiros atos de Lula e seu governo, a seiva do retrógrado pensamento marxista aliado às pautas e linguagens do identitarismo contemporâneo. Peguemos um dos exemplos possíveis para ilustrar o meu argumento ‒ o mais ilustrativo deles até o instante. A mídia divulgou que o governo de Lula usará a Secom para monitorar postagens e atos “antidemocráticos” nas redes sociais. A polícia das ideias será realidade no Brasil ‒ e como eu gostaria, meus nobres, que isso fosse apenas retórica inflamada de um conservador afobado. Mas não é o caso, existirá um órgão de Estado pronto para criar e gerenciar a censura no país, é justamente isso que promete a Secom de Lula.

Lula, aliás, ‒ ao que tudo indica ‒ será o hospedeiro da praga identitarista contemporânea, um vírus progressista tão demagógico quanto dogmático, que busca, através da união de uma excelente propaganda ideológica, midiática e acadêmica, emplacar um regime totalitário com vestes infantis de uma bailarina inocente. Na propaganda desses ungidos identitaristas ‒ a tal prometida vigilância neonazista da vida privada e pública dos indivíduos prometida pela Secom ‒ se justificaria em nome da “segurança nacional”, da “igualdade”, até mesmo da “liberdade” de “todes”. As desculpas são as mais belas e eloquentes para que todos aplaudam e se sintam gratos por esse grau de tirania vendida como necessidade.

E, vejam, não podemos acusar Lula de mentiroso nesse caso, ele sempre avisou que regulamentaria a mídia e as redes sociais, “regulamentar” é uma forma fofa de afirmar que ele calará os dissidentes políticos e críticos sob a luz do sol. Sabe o que é mais cômico ‒ e trágico ‒ nisso tudo? Há três ou quatro meses, muitos dos nossos jornalistas prudentes, aqueles que tomam cafezinho de dedinho levantado e pregam religiosamente a “moderação” no trato com a esquerda, os adoradores da “terceira via”, eles diriam que tudo isso não passava de “teoria da conspiração” conservadora. Ainda que Alexandre de Moraes e suas prisões políticas, perseguições policialescas de apoiadores de Bolsonaro, já dessem o spoiler disso tudo. Teremos um ministério para perseguir críticos do governo e, com isso, promoveremos George Orwell de romancista à profeta.

Arrisco a dizer ‒ assumindo a possibilidade do vexame da história ‒ que o Brasil será uma distopia a céu aberto, viveremos trajados com essa democracia pateta vomitada todos os dias pelo establishment progressista, seremos “inclusivos” enquanto excluímos aqueles que discordam do status quo governamental ‒ e da vontade suprema do nosso sacrossanto careca togado. Permitam-me acrescentar drama em minha leitura para os próximos anos: preparem-se para a censura aberta, mas não aquela prevista por George Orwell em “1984″, será antes uma censura com face meiga e benevolente, tal como a de “Admirável mundo novo” de Aldous Huxley, isto é, um autoritarismo com rosto corado e límpido, adornado de sorrisos radiantes e olhos vívidos. Uma espécie de criança fofa que te aponta uma baioneta no peito enquanto recita alguma música humanista de Caetano Veloso; aquela censura que te impede de ser livre e ainda te faz agradecer por isso.

Lembrei-me agora de uma reportagem que assisti há tempos, nela o jornalista mostrava uma prisão modelo da Suécia ‒ salvo engano ‒, nela os presos tinham aula de música, acesso à uma esplendorosa biblioteca e celas que fariam quaisquer conjuntos habitacionais brasileiros parecerem um barraco da Cracolândia. No entanto, no final, a jornalista dizia ‒ com a voz embargada para soar mais “empática” ‒ que eles apenas não podiam sair das mediações do presídio a fim de cumprirem integralmente as suas penas. Enxergo o progressismo identitarista petista, a alma desse novo governo, como essa prisão fofa da Suécia. Nela podemos caminhar nos corredores, tocar violão, eventualmente ler algo e até jogar Uno com nossos vizinhos, só não poderemos ser realmente livres, pois a liberdade de expressão ofende a hegemonia, a livre opinião ameaça a retórica dos ungidos. A liberdade, em si mesma, é uma afronta ao nosso novo sistema “autorifofo” que depende da submissão total dos indivíduos às narrativas da intelligentsia.

O Brasil que nos espera é este: um Brasil democrático que não aceita posições diversas, um Brasil inclusivo que expulsa e isola dissidentes, um país livre que teme a liberdade de opinião alheia, que cala e encarcera jornalistas e opinadores conservadores. Em suma, uma prisão enfeitada de jardim retórico para que você se sinta bem e agradecido em viver sob essa submissão inclusiva e amorosa.

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*Pedro Henrique Alves é graduado em filosofia, especialista em estudos políticos e editor-chefe na LVM editora. Estreia hoje a sua coluna semanal no portal da Jovem Pan sobre filosofia, história e cultura.

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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