Afinal, quem levou a taça com o adiamento do PL 2630?
Defensores do projeto precisaram reconhecer que ele não estava maduro; caminho para a não votação foi árduo, desgastante e com muitas reviravoltas
O que começa mal, quase sempre, termina mal. O PL 2630 foi enfiado goela abaixo com a justificativa de que era para ontem. Aprovaram a urgência, dispensando, assim, os debates nas comissões da Câmara. Quem ousou dizer que o texto ainda não estava pronto para ser votado foi chamado de antidemocrático, já que agindo dessa forma poderia estar compactuando com a desinformação. O Google mostrou sua indignação por meio de carta assinada pelo seu presidente, Fábio Coelho. O texto reconhece a importância da iniciativa do Legislativo para que ocorram debates a respeito do tema, mas não da forma como o PL foi proposto: “Reconhecemos a importância de debater soluções para esse problema, mas nos preocupa que o Congresso esteja fazendo isso sem considerar as consequências negativas e indesejadas que o projeto de lei pode trazer”.
Coelho mexeu em verdadeiro cacho de marimbondo. Alexandre de Moraes não gostou da mensagem e partiu para o revide. Determinou que o Google e mais três grandes empresas do setor retirassem do ar as publicações que haviam feito contra o PL 2630, sob pena de pesada multa por hora de descumprimento. Jogo pesado. O que o Judiciário determina deve ser cumprido. O Google talvez até tivesse razão ao dizer que o projeto ainda não estava pronto. Precisaria ser mais bem discutido. Da mesma forma, alegou que a imposição estabelecida na proposta não contribuiria para combater a desinformação. “Ao contrário, oferecerá a agentes mal-intencionados um ‘guia’ sobre como contornar as proteções dos nossos sistemas, trazendo prejuízos para a qualidade e segurança dos nossos resultados de busca.”
Pelo sim, pelo não, foi exatamente o que aconteceu. Os defensores do PL 2630 precisaram reconhecer que ele não estava maduro. O caminho para a não votação do projeto foi árduo, desgastante e com muitas reviravoltas. Há muito não se via uma luta tão intensa entre os deputados da situação e da oposição. O governo jogou todas as fichas para aprovar o PL das Fake News, também denominado pela oposição como PL da Censura. Não deu. Nos últimos dias, o placar começou a mudar de lado. A pressão governista, apoiada por boa parte da imprensa e do Judiciário, não foi suficiente para fazer frente à mobilização popular, especialmente pelas redes sociais. Os deputados que estavam favoráveis à aprovação repensaram o voto e passaram a dar entrevistas revelando seu novo posicionamento. Na noite de terça-feira, dia da votação, as pesquisas informais indicavam que não passaria. Por isso, ao perceber a derrota iminente, o deputado Orlando Silva, responsável pela relatoria, solicitou ao presidente da Câmara, Arthur Lira, que retirasse o projeto de pauta. Comentou o relator que serão incluídas 90 sugestões de emendas ao projeto. Ou seja, a proposta estava longe de ser tomada como definitiva. Na verdade, há muito parlamentar que ainda não conhece bem o texto.
Esse adiamento foi uma vitória para a oposição. O possível resultado da votação demonstrou a fragilidade da sustentação política do governo. Não que seja uma vitória definitiva, pois Lula e seus apoiadores não vão desistir assim tão facilmente. Em todo caso, agora ficou mais difícil para os governistas. Haja verba para suas excelências levarem para as suas bases. Só se fala em bilhões. Embora esse seja um argumento poderosíssimo, os deputados sabem que os eleitores estão de olho no que acontece nos corredores da Casa Legislativa. Se a mudança do voto do parlamentar não for muito bem explicada, poderá sofrer prejuízos nas próximas eleições. E como disse o então deputado Gastone Righi a Michel Temer em uma conversa que presenciei: não há nada pior para um político que perder as eleições e ter de ficar quatro anos sem mandato.
Talvez essa votação não aconteça nos próximos dias, nem nas próximas semanas, e, quem sabe, nem nos próximos meses. Até lá o parlamento fará o que é uma de suas principais funções, conversar e negociar. Só esperamos que o tom desses diálogos seja sempre republicano, pois esse projeto poderá afetar diretamente a vida de todos os brasileiros. Uns dizem que as pessoas serão protegidas da desinformação, outros que perderão sua liberdade de se expressar. Por mais relevante que seja, entretanto, temos temas muito mais prioritários para o nosso país. Essa mobilização deveria ocorrer para aprovar as reformas política, tributária, administrativa, entre outras. Esses temas, sim, fariam o Brasil caminhar. O resto, como dizia Millôr Fernandes, é armazém de secos e molhados. Siga pelo Instagram: @polito.
*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.
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