Bolsonaro se revolta, faz discurso inflamado e bate de frente com o STF

Em evento no Palácio do Planalto, presidente da República subiu o tom contra ministros do Supremo, em discurso voltado aos seus seguidores mais fieis

  • Por Reinaldo Polito
  • 09/06/2022 08h00
ANTONIO MOLINA/FOTOARENA/ESTADÃO CONTEÚDO - 07/10/2021 O presidente Jair Bolsonaro falando em microfone com uma bandeira do Brasil ao fundo Na terça-feira, 7, Bolsonaro também reagiu à decisão do STF que manteve a cassação do deputado estadual Fernando Francischini (União Brasil-PR)

O presidente Jair Bolsonaro (PL) participou na terça-feira, 7, da cerimônia “Brasil pela vida e pela Família” e rasgou o verbo. Seu tom indignado e irônico surpreendeu. Não que tenha sido uma atitude inédita do mandatário do país. Ao contrário, o chefe do executivo já esbravejou e subiu nas tamancas em diversas oportunidades. Todos nos lembramos do seu discurso inflamado naquele marcante 7 de setembro na Avenida Paulista. Suas palavras foram tão irascíveis que parecia ser o estopim para um rompimento institucional no país. A mediação do ex-presidente Michel Temer (MDB) para pôr panos quentes no estremecimento do capitão com Alexandre de Moraes foi providencial. Embora não tenha servido para o ministro deixar o desafeto em paz, foi suficiente para acalmar os ânimos.

É senso comum que o presidente não engole sapo. Pelo menos verbalmente se rebela quando se sente atacado ou desconsiderado. Dessa vez, todavia, sua revolta foi demonstrada não apenas pela veemência da voz e pela expressão da fisionomia, mas principalmente pelo teor da mensagem. Bolsonaro citou nominalmente os ministros Luis Roberto Barroso, Edson Fachin e Alexandre de Moraes. Mencionou acontecimentos que julgou inaceitáveis protagonizados por eles.

Criticou, por exemplo, o comportamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que, por iniciativa do ministro Barroso, convidou as Forças Armadas para participar de uma comissão de transparência eleitoral. Ressaltou o fato de os militares terem descoberto centenas de vulnerabilidades no processo de votação e apresentado nove sugestões. De forma irônica disse: “Eles não gostaram”. E repetiu a frase do ministro Fachin: “Eleições é coisa para forças desarmadas”.

Nesse momento da sua fala questiona de maneira bastante veemente: “Convidaram para quê? Ora bolas! Para fazer papel do quê? Eu sou o chefe das Forças Armadas. Nós não vamos fazer o papel de idiotas!”. Em outro trecho indaga: “Queriam a participação das Forças Armadas como uma moldura de uma fotografia? Para dar ar de credibilidade?”

O presidente ressalta que não é um desabafo, mas sim um alerta à nação brasileira. E, para demonstrar que tem consciência de que muitas pessoas não gostam quando ele estabelece confronto com os outros poderes, faz referência aos conselhos que tem recebido de quase todos os seus ministros: “Fique quieto. Fique na tua. Calma”. Após estabelecer várias premissas, chegou finalmente ao ponto que desejava – conclamou o público a cerrar fileira com ele: “Ou nós nos indignamos e acordamos para o que está acontecendo, ou marcharemos no caminho da Venezuela”. Em outra parte do discurso vociferou: “Eu não vou viver como um rato. Tem de haver uma reação”.

Bolsonaro aproveita seus pronunciamentos para colocar vários assuntos dentro do mesmo pacote. Seja lá qual for o tema, a segurança das urnas estará sempre no meio da mensagem. Dessa vez o mote era a condenação do deputado estadual Fernando Francischini, que daria para ser tratado em cinco minutos. No entanto, arengou por vinte e cinco minutos. Alegou que “não existe tipificação penal para fake News”. E, como faz de maneira recorrente, aproveitou para mexer com a imprensa: “Se tiver, que se feche a imprensa”, destacando dois veículos, Folha e Globo.

Afinal, o que o experiente político deseja com essa demonstração de revolta? Temos de lembrar de que ele perambula por essa praia há mais de 30 anos. Com certeza seu discurso não foi proferido por acaso. Mesmo não se valendo de anotações, suas palavras, sem dúvida, foram criteriosamente planejadas. Ainda que essa fase seja chamada apenas de pré-campanha, na verdade os postulantes à cadeira presidencial já estão atrás dos seus eleitores. Pela lei eleitoral Bolsonaro não pode pedir voto nesse período, mas todas as suas ações buscam esse objetivo. Esse pronunciamento contundente agrada aos seguidores mais alinhados com suas propostas. Dessa forma, garante assim essa fatia do eleitorado que permitirá sua chegada ao segundo turno.

E os votos daqueles que estão indecisos, ou pensam em votar em outro candidato? O presidente dá a entender que pretende dar um passo de cada vez. Nesse instante em que a situação do país está se normalizando depois da pandemia, precisa consolidar a parcela do seu eleitorado mais fiel. Nos próximos meses, a continuar com as boas notícias da economia, o humor dos eleitores poderá ser bastante favorável ao governo. Só para citar alguns indicadores: redução do desemprego, crescimento do PIB, pagamento do Auxílio Brasil, diminuição dos impostos sobre combustíveis, o que poderá controlar a inflação, água chegando aos estados do Norte e Nordeste, ferrovias e rodovias concluídas.

Esses serão os argumentos para obter êxito nas eleições. Se a estratégia será ou não bem-sucedida, saberemos nos próximos meses. O importante agora é entender o que leva Bolsonaro a bater de frente com os ministros do STF, sendo que muitos analistas afirmam que assim só se afastará da população que desejaria ver um presidente mais moderado e equilibrado. O resultado só saberemos com a abertura das urnas. E pelo discurso inflamado do presidente, talvez nem depois de elas serem abertas. Siga pelo Instagram: @polito

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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