Lula fala o que sente ou só joga para a torcida?
É evidente que ele sabe que os empresários não são meros sanguessugas ou que país não pode gastar mais do que arrecada; seu objetivo talvez seja o de agradar a quem perdeu a boquinha e aos seguidores fanatizados
Já na época em que atuava no sindicalismo, Lula transitava pelo emaranhado dos problemas liso como quiabo. Com aquele jeito propositalmente simplório, cometendo deslizes gramaticais elementares, sem entender de nenhum tema com profundidade, nunca se apertou. Quando era confrontado, usava a comunicação para se esgueirar daqui e dali e se defendia do jeito que dava. Foi sobrevivendo, aprendendo e se aperfeiçoando. Hoje, consegue tratar de qualquer assunto em condições de defender as teses que lhe sejam convenientes. Fala de economia, educação e saúde sem nenhum constrangimento ou embaraço. Se o assunto for complexo demais, ou não interessar às causas que defende, usa a retórica para se livrar da saia justa.
Seus recursos prediletos são a ironia, o sarcasmo e a emoção. Brinca uma vez. Se o interlocutor insistir, brinca a segunda, e assim até que desistam de pressioná-lo. Se o tema for tão grave que não admita o uso do humor, parte para a fala mais contundente. Pega um tema associado ao que está sendo tratado e faz peroração veemente, mencionando os pobres e os menos favorecidos. Quando alguém se dá conta de que o assunto discutido era outro, a conversa já terminou. Por isso, essa defesa estapafúrdia que faz dos trabalhadores por serem explorados pelos empresários não convence. Ele já administrou o país por duas vezes. Ficou nos bastidores do governo Dilma dando as cartas. Sua estrada é longa.
É evidente que ele sabe que os empresários não ficaram ricos só porque os empregados trabalharam por eles. Da mesma forma, tem consciência de que, se o país gastar mais do que arrecada, estará caminhando para um abismo. Não é diferente quando critica a existência do Banco Central independente. Ele já aprendeu muito bem o que é certo e o que é errado. Lança mão, todavia, de um discurso populista. Sua intenção não aparece no valor de face. No fundo, seu objetivo talvez seja o de agradar aos sindicalistas, que perderam a boquinha, e aos seguidores fanatizados, que precisam desse discurso destrambelhado como o ar que respiram.
Se não bastasse essa demagogia interna, resolveu estender também os braços para os companheiros dos países vizinhos. Essa história de produzir uma moeda única com a Argentina é das iniciativas mais sem sentido que poderiam ser idealizadas. Mesmo sabendo que as possibilidades dessa criação sejam remotíssimas, faz o seu network internacional com “los hermanos”, recebe os aplausos que tão bem fazem ao seu ego e posa de grande estadista. Se esses arroubos ficarem só no discurso, incomodam o senso comum, mas não atrapalham tanto o bem-estar e o equilíbrio do país. A não ser, evidentemente, pelo fato de perder tempo precioso que poderia ser aproveitado para investir em nosso desenvolvimento. Além, claro, de afugentar possíveis investidores, que agora já ficam com um pé atrás antes de colocar sua preciosa graninha em terras tupiniquins.
Se, todavia, o líder petista “bateu a cabeça”, e suas palavras são fruto de seus sentimentos verdadeiros, aí, só mesmo torcendo como fez seu ex-apoiador Henrique Meirelles: “Ele [Lula] começou a sinalizar uma direção à Dilma. Estou pessimista, não tenho dúvida. Só posso dizer uma coisa a todos vocês: boa sorte”. Imagine só! Depender que a conjugação dos astros nos livre desses devaneios presidenciais. O que mais preocupa nessa história toda é que especialistas e boa parte da imprensa, que navegam no mesmo barco nessas águas turbulentas, ficam quietinhos, como se nada estivesse acontecendo. Acorda, turma! Tomara que quando o vendaval surgir no horizonte não seja tarde demais.
Coincidentemente, temos notícias arrasadoras que ocupam as principais manchetes jornalísticas. Não se parou ainda de falar nas invasões antidemocráticas do dia 8 de janeiro e suas consequências. Parece não haver outro assunto no país. Daqui a pouco, porém, essa matéria estará no rodapé da imprensa, e, se nenhum fato rumoroso ocorrer, a fumaça se dissipará e os olhos das pessoas estarão concentrados nos resultados da gestão do novo governo. As vendas têm prazo de validade. Alguém precisa alertar Lula de que essas premissas que defende já estão vencidas há décadas. Que sua época de sindicalista passou. Que a campanha terminou e ele tomou posse. Portanto, pode descer do palanque e começar a governar. Só não vê quem tem a visão turva, ou finge ter miopia. Siga pelo Instagram: @polito.
*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.
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