Regulação da imprensa e das mídias sociais não passa de desculpa para censurar
Justificativa usada para quem defende a medida é a de proteger as pessoas dos ataques que por ventura venham a sofrer, mas argumentos são infundados
Quando Lula fala em regular as mídias, ninguém deveria se surpreender. Ele já vem defendendo essa ideia estranha desde a época da campanha eleitoral. Quem se assusta agora com essa possibilidade ou não ouviu os discursos do então candidato petista, ou acompanhou, mas achou que ele não estava falando sério. Não posso dizer que não me irrito com as atitudes de certos jornais, revistas e emissoras de rádio e televisão. O ativismo político, as mentiras e as distorções das notícias de alguns desses tradicionais meios de comunicação já me fizeram cancelar assinaturas e deixar de acompanhar vários programas jornalísticos. O mesmo ocorre com os canais que se dedicam ao noticiário pela internet. O que mais incomoda nesses veículos é o sensacionalismo com o qual divulgam as notícias.
Basta uma rápida olhada em algumas chamadas publicadas no Youtube para constatar esse fato. Se alguém levar em conta essas informações, possivelmente irá concluir que o Brasil está revirado de cabeça para baixo. Aqui estão quatro exemplos encontrados em uma pesquisa de menos de cinco minutos: “A casa caiu para Lula. Por essa os petistas não esperavam”. “Acaba de ser revelada a estarrecedora verdade por trás do discurso de Moraes”. “Péssimas notícias para Lula. Caiu como uma bomba”. “Brasília tremendo. Bolsonaro parte pra cima”.
Uau! Para, para tudo. Fala a verdade, você não ficou curioso para saber o que havia em cada uma dessas notícias chamadas com tanto estardalhaço? Depois de ver essas manchetes, você, eu e o mundo somos instigados a assistir a esses vídeos imediatamente. Ninguém resiste a títulos tão bombásticos. Só que depois de acompanhar atentamente as notícias anunciadas com tanto alarde o sentimento passa a ser de revolta e decepção com quem as divulgou. Quase sempre, o vídeo começa com pedidos de inscrição, acionamento do sininho e compartilhamento. Alguns também pedem contribuição para que possam continuar desenvolvendo o trabalho com qualidade e eficiência. Não são poucos ainda aqueles que aproveitam para vender alguns produtos.
Essa parte introdutória pode levar de dois a três minutos. Em seguida, o apresentador continua criando expectativa. Pede, por exemplo, para ficar até o final do vídeo porque a bomba será revelada com todos os detalhes. Fazer o quê? Vamos ver que notícia sensacional é essa. Depois de um tempão, a história começa a mudar. As certezas passam a ser tratadas no condicional. Se acontecer isso. Se, por acaso, o ministro tomar essa decisão. Se o presidente não resistir à pressão. Ou seja, não havia nenhuma bomba e nenhum fato excepcional. Era tudo especulação e sensacionalismo. Uma enganação.
Assim como a maioria, eu também, de vez em quando, caio nessas armadilhas, mas só uma vez. Nunca dou uma segunda chance para quem usa desses artifícios para conseguir engajamentos em seus canais. Assim que percebo o expediente falacioso, imediatamente cancelo a minha inscrição. Deixo de seguir e nunca mais assisto aos vídeos nesse canal. Assim como ocorre com a mídia tradicional, os canais de notícias da internet também sobrevivem da sua credibilidade. Durante muitos anos trabalham para construir uma reputação respeitável. Enquanto forem confiáveis, manterão a fidelidade da sua audiência. Bastará, todavia, um simples deslize, uma mentira, uma informação distorcida, uma omissão intencional, para que tudo vá por terra.
Por isso sou contra a regulação da mídia. Considero essa tentativa de colocar limites nas informações divulgadas uma desculpa esfarrapada para censurar. Não precisa. O próprio mercado consumidor se incumbirá dessa tarefa. Se o veículo for sério e informar os fatos como eles efetivamente ocorreram, e deixar claro quando se trata de opinião, irão manter e até ampliar a audiência. Se, ao contrário, forem incompetentes, levianos, incoerentes, perderão os leitores, os ouvintes e os telespectadores.
A justificativa usada para quem defende a regulação é a de proteger as pessoas dos ataques que por ventura venham a sofrer. Esses argumentos são infundados. Além do direito de resposta, há mecanismos suficientes para proteger quem se sentir prejudicado. Se o jornalista ou o comentarista mentir dizendo que uma pessoa cometeu crime, ela poderá recorrer à justiça e processar o agressor por calúnia. Da mesma forma, quem se sentir difamado ou injuriado poderá se defender processando quem o atacou pelos crimes de injúria e difamação. Portanto, nesses casos específicos já existe amparo na legislação. Não há, assim, motivos para restringir a livre manifestação do pensamento. Prefiro ficar irritado e ter o trabalho de fazer a minha própria seleção do que vale ou não a pena ler ou assistir que ser tutelado por uma lei que com a desculpa de proteger, na verdade, quer mesmo é censurar. Siga pelo Instagram: @polito
*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.
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