Será que Bolsonaro se ausenta do Brasil por medo ou por estratégia política?
Apoiadores do ex-presidente não sabem se ainda serão fiéis ao comandante ausente ou se deverão buscar nova liderança que corresponda aos seus ideais conservadores antipetistas
Bolsonaro, mesmo estando vivo, vivíssimo, com a sua longa ausência quase ressuscita a profecia mítica de priscas eras lusitanas. Em 1578, na Batalha de Alcácer-Quibir, desapareceu o rei de Portugal, D. Sebastião. Os portugueses acreditavam que o soberano voltaria para salvar Portugal. Essa crença, conhecida como “sebastianismo”, em sentido figurado, representa a esperança de uma nação que aguarda a volta de um líder desaparecido para ser o grande salvador. Assim como lá, cá também os bolsonaristas aguardam pelo retorno do “El-Rei” para retomar os rumos do país. Faz mais de um mês que Bolsonaro foi para os Estados Unidos. Ficou longe do burburinho da posse de Lula. Deve ter sido difícil para ele digerir a derrota eleitoral, pois com as manifestações de apoio que recebia em todos os cantos do país tinha certeza de que seria vitorioso.
No início, a maioria pensava que o ex-chefe do Executivo ficaria por apenas alguns dias e voltaria para ajudar a curar as feridas dos brasileiros derrotados. Ainda não voltou e, pelo que parece, “sebastianou”, pois não tem intenção de retornar tão cedo. Os bolsonaristas se sentem meio órfãos. Estão perdidos. Não sabem se ainda serão fiéis ao comandante ausente ou se deverão buscar nova liderança que corresponda aos seus ideais conservadores antipetistas.
Vai depender muito do discurso que Bolsonaro trouxer na bagagem. Precisará de uma retórica convincente para voltar a seduzir seu eleitorado. Provavelmente se colocará como vítima do sistema, perseguido por parte da imprensa, do Judiciário e de políticos oportunistas, antipatrióticos. Dirá que o país não poderá ficar subjugado ao um governo de esquerda que restringe a livre inciativa e amordaça a nação dentro de uma ideologia carcomida, ultrapassada, que não deu certo em lugar nenhum do mundo. Essas são as palavras que funcionarão como notas musicais para os ouvidos liberais/conservadores. O ex-presidente apresentará também as conquistas de seu governo. Comprovará com dados inquestionáveis que as alegações de Lula, que insiste em afirmar ter recebido um país destroçado, uma herança maldita, não passam de narrativas fantasiosas.
Para regressar ao palco, talvez esteja esperando que Lula ponha em prática algumas de suas propostas indefensáveis, como, por exemplo, acabar com o teto de gastos. Revogar as reformas Trabalhista e da Previdência, que receberam amplo apoio da população. Emprestar dinheiro do BNDES a países totalitários e alinhados ideologicamente, que sabidamente não honrarão com seus compromissos, como inúmeros deles que contraíram dívidas conosco e não quitaram suas pendências. Criar moeda única com a Argentina, um país que hoje está arrebentado, com a inflação flertando com os 100%. Incentivar a invasão de terras pelo MST, demonstrando total desrespeito pela propriedade privada. Poder-se-ia ponderar que em pouco mais de um mês Lula já preencheu várias laudas para os pronunciamentos de Bolsonaro.
Se o ex-presidente voltar com a faca nos dentes e sangue nos olhos, bastará mostrar os desacertos da administração lulista para ter a chance de cair de novo nos braços do povo. Se, entretanto, pisar em terras tupiniquins de maneira tímida, com receio de perder seus direitos políticos e até, como imaginam alguns, de ser preso por tecnicidades jurídicas que os adversários devem estar elaborando, perderá o posto de grande farol dessa luta.
Nesse caso, entraria em cena uma conduta acertada de Bolsonaro ao longo de seus quatro anos na presidência. Diferentemente de Lula, que nunca permitiu o surgimento de uma liderança na esquerda para não embaçar sua importância política, o ex-presidente criou a base para o nascimento de políticos que se destacaram no cenário nacional. São os casos, só para citar dois exemplos, do governador de São Paulo, Tarcísio Gomes de Freitas e do senador pelo estado do Rio Grande do Norte, Rogério Marinho. Esses e outros, entretanto, precisam trilhar uma longa estrada para se credenciarem a substituir Bolsonaro. Embora a situação não seja desesperadora em termos de urgência, já que temos longos quatro anos pela frente, também não é possível esperar que o futuro caia no colo.
Se o ex-chefe do Executivo tiver intenções de voltar a comandar seus eleitores, mais aqueles que começam a se mostrar descontentes com Lula, antes do final do ano, deverá estar com o bloco na rua, percorrendo novamente o país de ponta a ponta para conquistar os votos de que precisará em 2026. Para isso, haverá de existir ânimo, disposição, empenho e muita obstinação. Se faltarem esses requisitos, seria melhor pegar a varinha e pescar nos rios que banham sua querida cidade de Eldorado, no Vale do Ribeira. Quem conhece seu passado, todavia, sabe que ele não é de se entregar. Ao contrário, sempre foi determinado e lutou para conseguir o que desejava. Tudo indica que Bolsonaro só está tomando fôlego para avaliar os prós e contras, pisar de leve para constatar se a areia não é mesmo movediça, voltar e, aí sim, se transformar no grande oponente do governo Lula. Siga pelo Instagram: @polito
*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.
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