‘A fé ajuda na cura contra o câncer e nós não somos médicos insensíveis’, diz chefe da oncologia clínica do Hospital Santa Clara
Para especialista ouvido pela coluna, quem escolhe essa especialização já viveu uma história triste e quer fazer diferença na vida dos pacientes
Quem nunca esteve perto de um diagnóstico que poderia mudar sua vida e a de todos em volta, que atire a primeira pedra. Aliás, o tema de hoje foi escolhido a dedo para que, justamente, a gente “solte as pedras da mão” e tenha mais fé e empatia, tudo junto e misturado. A convite desta coluna, Jorge Abissamra Filho, chefe da oncologia clínica do Hospital Santa Clara resolveu expor o que acontece no dia a dia de quem cuida de alguém durante a batalha contra o câncer, já que existe um estereótipo de que oncologistas são ainda mais frios que os médicos de outras áreas. “Essa é uma inverdade, nós não somos mais frios, pelo contrário, os médicos que fazem oncologia são pessoas que de alguma maneira foram afetadas pela doença. Eu, por exemplo, fiz oncologia porque minha mãe teve câncer de mama. Com essa vivência sabemos o quanto é importante o apoio psicológico ao paciente e tenho colegas de profissão com históricos similares e até alguns que se especializaram depois de terem enfrentado a doença. Hoje, realmente, é preciso enxergar a área de saúde com olhos mais compreensivos, mesmo em momentos de dor”, desabafa Abissamra.
Apesar de parecer novo, o oncologista graduado em Medicina pela Universidade de Santo Amaro (UNISA), com residência em clínica médica pela Santa Casa de São Paulo (ISCMSP), já atuou em centros do Brasil e no exterior na luta contra a doença e afirma que a fé tem importância única no resultado do tratamento. “Já trabalhei em centros de referência como o MD-Anderson Cancer Center, em Houston, nos Estados Unidos e independente do local, da crença ou religião, é comprovado que ter fé ajuda na batalha contra a doença. A fé, de maneira indireta, pode representar sim uma melhora da imunidade e, consequentemente, uma melhora no estado clínico geral. É nítido que as pessoas mais religiosas conseguem enfrentar a doença de maneira menos estressante e sabemos que o estresse pode diminuir o poder do nosso sistema imunológico”, conta.
Além disso, diversas pesquisas mundiais indicam melhora de marcações quando acreditamos em algo e pensamos positivo. Ter fé libera defesas naturais do organismo e esse sentimento prepara o corpo para lidar melhor com a dor e as dificuldades. Um estudo realizado pelo psiquiatra Harold Koenig diretor do Centro de ela Universidade de Duke, na Carolina do Norte, nos Estados Unidos, comprovou que pacientes que praticam religiosidade tem 40% menos chance de sofrerem depressão durante o tratamento não apenas do câncer, como também no enfrentamento de outras doenças. No Brasil, diversas instituições, como a Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), o Instituto de Psiquiatria (IPq) da USP, por meio do Programa de Saúde, Espiritualidade e Religiosidade (Proser), e a Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), com o Núcleo de Pesquisas em Espiritualidade e Saúde (Nupes), têm investido em estudos sobre o poder da espiritualidade como auxiliar no tratamento de doenças físicas e psíquicas. Para o médico, a espiritualidade está aliada a um comportamento que também é percebido nos corredores do hospital e que faz diferença: o hábito de pensar positivamente. “Costumo dizer que a luta não é só do paciente, é nossa, de todos nós e que vamos vencer a batalha. É percebido que pacientes que pensam positivo e são espiritualizados apresentam menos intercorrências durante o tratamento porque o sistema imune acaba ficando menos afetado. Veja, quando a imunidade cai temos um quadro comum em que afloram as chamadas infecções oportunistas e isso pode agravar e atrasar todo tratamento”.
Estudos sobra a força da fé e a importância do pensamento positivo vêm se alastrando – não só na área médica. Sou prova viva de que quando você tem um desejo e acredita nele, e luta por aquilo, pensando positivamente e com foco, a chance de realização é maior, em diversos cenários da vida. “Acho que no resultado final é claro que isso acaba dando um plus, né? Os pacientes mais depressivos acabam tendo outros problemas também, como, por exemplo, a piora ainda maior da falta de apetite, o desinteresse em relação a um tratamento multidisciplinar, uma atividade física específica, sem falar nas terapias auxiliares. É claro que toda a bagagem que temos e recursos na medicina muitas vezes não são suficientes em determinados casos, mas é por isso que nos levantamos e lutamos todos os dias. Ofereço a mão na linha de frente dessa luta e vamos até o fim juntos, pensando sempre na vitória, é claro”. Talvez seja por isso que meu entrevistado tenha ficado tão receoso quando falamos sobre a ideia errada que as pessoas têm de que os oncologistas são médicos frios. “Aprendemos entre uma batalha e outra que é preciso mais do que nunca valorizar a vida e as coisas simples que deixamos passar. É preciso entender a importância do existir. Quando estamos passando por um momento de crise, durante o enfrentamento de algo tão assustador como o câncer, todo tipo de ajuda deve ser bem-vinda. Nós precisamos de todas as forças somadas e isso é fundamental”, finaliza o médico. E aí, já parou por um segundo hoje e respirou fundo apenas agradecendo a vida? Faça isso agora, por um minutinho apenas, e sinta o poder da gratidão pulsando em seus poros, tocando sua alma.
*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.
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