É possível ser feliz depois de perdoar uma traição? Especialista em neurociência afirma que sim

Com tantos famosos tendo casos de adultério expostos, Camila Sponton diz que convivemos diariamente com frustrações nas relações e que é preciso agir

  • Por Renata Rode
  • 12/09/2023 10h00
drobotdean/Freepik Jovem mulher fazendo gesto de silêncio enquanto abraça o marido Segundo pesquisa, falta de sexo bom e anseio por liberdade são as duas principais motivações que levam as pessoas a traírem

A traição, por si só, já é um assunto muito delicado, até porque o casamento envolve muitas questões: sonhos, desejos, expectativas, convívio familiar, que também entram nesta balança entre perdoar ou abdicar da relação. Muita gente sonha com a vida de casado imaginando passar anos ao lado da pessoa amada, constituir uma família e com um final feliz. A infidelidade costuma levar ao fim deste sonho e causar muito sofrimento. Afinal de contas, a dor de uma traição é grande, e a descoberta pode abalar profundamente o relacionamento, deixando profundas marcas emocionais. E mesmo quando o relacionamento não parecia estar indo bem, além da decepção, dor, raiva e tristeza, a vida do casal pode não voltar a ser a mesma. 

Quando o casal tem filhos, a situação se complica ainda mais. Então, é mesmo possível superar uma traição no casamento com bem-estar emocional e ausência de conflitos? Segundo a especialista em neurociência e comportamento humano, Camila Sponton, a resposta é sim. “O ponto crucial da trajetória é a decisão de perdoar e levar o relacionamento adiante. Desta forma, a gestão das emoções é um fator preponderante para superar a traição do parceiro. Trabalhando o seu emocional de maneira profunda, é possível reconstruir a confiança e fortalecer a relação quando a sua opção não for a separação“, afirma. A especialista explica como conviver em uma relação após uma traição e como a inteligência emocional influencia nesse processo de recuperação. “O primeiro aspecto é reconhecer e expressar as emoções. Após a traição, é natural sentir raiva, tristeza, desconfiança e até culpa. A gestão das emoções nos ajuda a reconhecer esses sentimentos, permitindo identificá-los de maneira assertiva e construtiva, abrindo espaço para um olhar para si mesma, afinal de contas, aceitar e acolher o que se sente essencial para o processo de superação”, diz. Além disso, Sponton revela que um dos aspectos fundamentais para melhorar a convivência após uma traição é desenvolver a autocompaixão, estabelecer limites, evitar decisões apressadas, saber separar suas próprias ações e do outro e não focar em comportamentos de vingança. 

Camila Sponton, especialista em neurociência e comportamento humano (Divulgação)

Estudos apontam que um dos principais motivos da traição se resume à prática de sexo insatisfatório ou ausência da vida sexual. Dylan Selterman, do Departamento de Ciências Psicológicas e Cerebrais da Universidade Johns Hopkins e autor de uma pesquisa publicada no periódico Archives of Sexual Behavior, analisou as experiências dos usuários do aplicativo de namoro online Ashley Madison, famoso nos Estados Unidos, e descobriu que a falta de sexo bom e o anseio por liberdade e novidade são as duas principais motivações que levam o parceiro ou parceira a trair. 

A culpa é uma âncora em qualquer área da vida, e é preciso analisar os comportamentos e condutas diante de toda e qualquer situação. Muitas mulheres se culpam pela traição do parceiro, se afundando ainda mais na dor, trazendo uma autopunição, como se parte da decisão fosse dela. “E, definitivamente, não é.  Se perguntar o que você poderia ter feito para evitar a traição ou se não colaborou para isso, não ajudará ninguém a se sentir melhor, mesmo que o objetivo seja perdoar. Para isso, é essencial se desapegar da culpa. Não há culpados, mas, sim, feridos. Quem traiu é quem deve assumir os seus erros e compreender como as suas ações machucaram o parceiro. Se culpar potencializa a dor, te tira do processo de racionalização e não traz solução para o problema, podendo causar ainda mais danos ao seu autovalor e autoestima”, diz a especialista.

Então, como sair desse cenário de maneira mais concreta e assertiva? Acolher seus sentimentos é um dos passos mais necessários e importantes. Olhar para si e “escutar” toda dor, ressentimento, medo, culpa e raiva permite clarear os caminhos, os próximos passos e permite praticar a autocompaixão. “Autocompaixão é pouco compreendida. Alguns definem como autopiedade, mas, na verdade, autocompaixão descreve uma qualidade ou postura mental e emocional. Refere-se à habilidade de se tratar com a mesma gentileza, preocupação e compreensão que você trataria um bom amigo, especialmente em momentos de sofrimento ou quando confrontado com falhas pessoais”, ensina Camila.

Estudos sugerem que a traição conjugal é relativamente comum. A taxa de infidelidade varia, dependendo dos critérios e da população estudada, mas algumas pesquisas indicam que cerca de 25% dos homens e 15% das mulheres já foram infiéis pelo menos uma vez. Obviamente, os motivos não compreendem somente a área sexual e variam de caso para caso. Alguns exemplos incluem insatisfação emocional ou sexual no relacionamento atual, busca por emoções ou aventura, falta de comprometimento, oportunidades sociais ou falta de autocontrole.

É importante ressaltar que cada situação de traição é única, e as circunstâncias podem variar amplamente. As pesquisas fornecem um panorama geral, mas é essencial compreender que cada relacionamento é único e deve ser abordado de maneira individualizada. Para a entrevistada pela coluna, é preciso exercer a autocompaixão para viabilizar o perdão e uma vida feliz após esse problema. “A autocompaixão envolve três componentes principais. O primeiro refere-se à bondade consigo mesmo: ser gentil e compreensivo em vez de ser duro, crítico e julgador. Além disso, é necessário reconhecer as experiências como parte da condição humana, afinal, erramos e reconhecemos erros o tempo todo. E a última e não menos importante fase compreende a habilidade de observar seus pensamentos e sentimentos como são, sem tentar suprimi-los ou negá-los. Ao mesmo tempo, você não se identifica excessivamente com eles”, detalha.

A colunista que lhes escreve pode dizer que aprecia quem tem esse grau de evolução (hahaha). Em alguns pontos, eu concordo com a especialista, sim, principalmente quando ela explica que é preciso sair do papel de vítima. Vivo falando para algumas amigas que é preciso curar a síndrome de gata-borralheira, sabe? “A chave é não se tratar como coitadinho ou único atingido, é preciso que se promova um reconhecimento equilibrado e amoroso de quem você é e do que está sentindo. Estudos têm mostrado que a autocompaixão está associada a uma série de benefícios psicológicos, incluindo maior bem-estar, menor ansiedade e depressão e uma abordagem mais resiliente às adversidades”, finaliza.

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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